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Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática apresenta os resultados de quase 9 anos após desastre da Samarco/Vale/BHP em Mariana/MG
O 5º seminário promovido apresentou os resultados do Relatório Anual de 2023 demonstrando que a concentração dos rejeitos de mineração permanece estabilizada com variações nos períodos seco ou chuvoso e condições meteorológicas e oceanográficas, como frentes frias e correntes marinhas.
Vitória-ES (09/09/2024) – Entre os dias 02 e 05 de setembro foi realizado no auditório do Núcleo de Competência em Química de Petróleo (LabPetro), da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Campus Goiabeiras, o 5º Seminário Técnico-Científico de Avaliação do Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática (PMBA).O foco foi apresentar resultados acumulados até o 5º ano de monitoramento da Bacia do Rio Doce, em sua porção capixaba, bem como na região da foz do Rio Doce em Linhares-ES e toda a região costeira e marinha adjacente, impactadas pelo MLD- Material Ligado ao Desastre associados ao rompimento da Barragem de Fundão da Samarco/Vale/BHP ocorrido em 2015. O evento foi promovido de forma presencial, mas também de forma online por meio do canal Youtube e com centenas de participantes.
O seminário foi promovido pela Câmara Técnica de Conservação e Biodiversidade (CTBio), coordenada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio que integra o Comitê Interfederativo (CIF/IBAMA); e contou com a participação de órgãos ambientais federais (IBAMA, e ICMBio) estaduais (IEMA/ES e IEF/MG); municipais e atingidos, assim como representantes dos ministérios do Meio Ambiente (MMA) e da Pesca e Aquicultura (MPA), de diversas Instituições de Ensino e Pesquisa públicas e privadas, , da Fest-Federação Espírito Santense de Tecnologia e da Fundação Renova. A Câmara Técnica da Biodiversidade (CTBio) disponibilizou, na página da Flacso Brasil, o Relatório Anual 2023 (RA2023), que contempla os resultados obtidos ao longo da execução do PMBA, e que pode ser acessado por meio do link: https://drive.google.com/drive/folders/1B_MUdCfqfXH-K5xssSnb01NDr2tFMh5F
Foram apresentadas sínteses dos monitoramentos dos ambientes dulcícola, costeiro e marinho; e posteriormente a síntese integrativa dos 3 ambientes e apresentada a Matriz de Resultados acumulados até o momento. A ferramenta Tableau, ainda não disponibilizada a sociedade, foi aberta pelo professor Fabian Sá da Ufes, que a utilizou para apresentar os impactos por ambiente, grupo biológico, e outros parâmetros estudados. O público presente e online pôde ver como a ferramenta traz as informações consolidadas, e apresentadas visualmente de forma integrada e sistêmica.
De modo geral se mostrou uma estabilização do comportamento do Material Ligado ao Desastre-MLD (lama da Barragem ou rejeito de mineração e outros poluentes que estavam depositados no rio e margens). Durante a apresentação da síntese do ambiente marinho, feita pelo professor Stéfano de Almeida. No zooplâncton e fitoplâncton, por exemplo, constatou-se houve tendência de melhora dos indicadores ecológicos e maior estabilidade a partir do ano 4 do monitoramento. ”Constata-se menor diversidade e maior prevalência de táxons resistentes a contaminação no período chuvoso, especialmente na foz do rio Doce (chamado de Setor Foz). A comunidade de zooplâncton mais impactata se deu nos períodos de alta vazão do rio (período chuvoso)”, frisou Stéfano.Com relação aos peixes, verificou-se alterações populacionais e biológicas com baixa densidade de ovos, com diminuição no período chuvoso e aumento de 50% nos ovos considerados ‘não viáveis’ em todos os setores monitorados. Já nas larvas, constatou-se baixa diversidade e modificação na composição de espécies em diferentes setores e alterações morfológicas (na cabeça) e trato digestório como possíveis consequências dos reflexos do MLD no ambiente onde esses animais vivem.
Quanto às pós-larvas, o RA2023 mostrou maior diversidade e recuperação gradativa a partir do ano 3 de monitoramento na foz do Rio Doce. Em relação aos peixes estuarinos, percebeu-se uma diferença na área interna da foz do Rio Doce e diminuição da densidade, biomassa e riqueza das espécies. Como exemplo citado, o robalo-peva (Centropomus parallelus) vive uma diminuição de disponibilidade de habitat, com concentração dessa espécie em poucos canais profundos. Metais e arsênio foram constatados nos peixes em maior grau dos que observados antes da chegada do Material Ligado ao Desastre-MLD, com acúmulo de manganês e cádmio.O presidente da CTBio e analista ambiental do ICMBio, Frederico Drumond Martins, parabenizou a entrega dos resultados com a qualidade técnica esperada e informou que a CTBio irá se debruçar na análise do 5º Relatório Anual do PMBA (RA2023) para elaboração de uma Nota Técnica a ser apresentada ao CIF/IBAMA. “Importante que seja estudada uma alternativa de disponibilizar para a sociedade essas informações organizadas nessas Ferramentas de gestão da informação como o Tableau, de modo que localmente as comunidades possam se enxergar nesse processo, conferir os impactos de forma clara e acessível e fomentar apoios diversos localmente”, afirmou.
O 5º Seminário contou com a presença do presidente do CIF/IBAMA e superintendente do Ibama em MG, Sergio Augusto Domingues, que veio ao Seminário pela primeira vez e ficou muito satisfeito com o grau de qualidade técnica dos resultados apresentados. O diretor do Departamento de Gestão Compartilhada de Recursos Pesqueiros (DPES), da secretaria de Bioeconomia do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Gilberto Sales, destacou que muito se fala sobre haver uma gestão sobre os resultados mostrados pelo PMBA, e quando se pensa em gestão volta-se a atenção para os órgãos ambientais, nas diferentes esferas (federal, estaduais e municipais). “Mas temos que ver a gestão também do ponto de vista dos responsáveis pelo desastre executarem o que precisar para reparar o dano”. Em alguns momentos do evento, o debate acerca do consumo ou não do peixe novamente foi levantado, sobre o que o professor Fabian Sá da Ufes reforçou: “A instância para informar a sociedade não é o PMBA e nem a CTBio, mas a Câmara Técnica de Saúde, e instituições públicas como Anvisa por exemplo”.Uma das preocupações levantadas nos debates do 5º Seminário foi em relação aos “laboratórios acreditados”, privados, que têm substituído as universidades nas análises de alguns parâmetros. Para o professor e coordenador técnico da Equipe de Ecotoxicologia do PMBA/Fest, Adalto Bianchini, o aprendizado ao longo desse processo é imenso e desafiador.
“Os laboratórios acreditados foram uma escolha e verificou-se que eles trouxeram um certo comprometimento nos resultados, considerando os LQs-Limites de Quantificação de metais e arsênio em amostras de água, sedimento e material biológico para o quais estes laboratórios estão acreditados. visando atender normas dos órgãos de controle e não tendência dos elementos pesquisados. A academia tem um outro olhar sobre os resultados obtidos, o da ciência, da investigação máxima e da prestação de contas à sociedade. Mas essa foi uma decisão tomada (de os laboratórios acreditados fazerem análises) e precisamos olhar para essa experiência e aprender com ela”, reiterou.
Nessa próxima etapa, os resultados serão analisados pela CTBio, elaborada a Nota Tecnica e encaminhados a outras Câmaras Técnicas como a de Saúde, de Segurança Hídrica e Qualidade da Água, bem como de Gestão de Rejeitos e Segurança Ambiental, visando auxiliar em outras análises e tomadas de decisão por parte do CIF e dos órgãos públicos.Para o analista ambiental e coordenador do Centro TAMAR ICMBio, Joca Thomé, a entrega feita revela qualidade e empenho de toda uma equipe de pesquisadores extremamente qualificados e horas de trabalho de muitas pessoas. “Os órgãos ambientais também têm dedicado tempo de suas equipes para essas análises e os desafios são: a promoção de um momento inter-Câmaras Técnicas; integrar os dados de monitoramento de MG a esse banco de informações do ES. Continuamos acreditando que as universidades têm total capacidade técnica e instalada de atender a continuidade desse trabalho complexo que é a execução do PMBA. É mais que um monitoramento e sim um grande estudo de um evento sem precedentes no mundo”, frisou Joca.
A coordenadora de Programas Socioambientais da Fundação Renova, Juliana Oliveira Lima e a Diretora e Gerente de Projetos da Fest, Patricia Bouguilion sinalizaram a continuidade do monitoramento por mais 1 ano, em uma proposta que deve se formalizar em termo aditivo do Acordo de Cooperação Técnica entre as instituições nos próximos dias, visando não interromper a coleta de dados no próximo período chuvoso.Separados em grupos, os participantes puderam, nos últimos dois dias, à luz dos resultados apresentados nos dois dias anteriores, reunir proposições de ações de encaminhamentos futuros, para que o PMBA não se restrinja apenas ao monitoramento de impactos, mas que protagonize o encaminhamento de ideias e sugestões para para a CTBio e outras Câmaras Técnicas do CIF/IBAMA, no sentido de que esse conjunto gigantesco de informações se reflita em melhorias efetivas para a biodiversidade e as comunidades atingidas.
O que é o PMBA?
O Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática-PMBA é executado pela Fundação Espírito-santense de Tecnologia (Fest) por meio de um Acordo de Cooperação Tecnica com Fundação Renova, por meio das pesquisas realizadas por 37 Instituições de Ensino e Pesquisa, públicas e privadas, em que a Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) é anuente. O PMBA, como é chamado, tem como objetivo central promover o monitoramento da biodiversidade aquática da área ambiental I - porção capixaba do rio Doce e região marinha e costeira adjacente – a fim de obter resultados que venham sanar lacunas de conhecimento acerca dos possíveis impactos; bem como respaldar a tomada de decisões visando mitigar e reparar parte dos prejuízos causados pelo rompimento da barragem de Fundão (Marina, MG) na biodiversidade aquática em ambientes como rios, lagos, lagoas, praias, restingas, manguezais e mar.SAIBA MAIS - CT-BIO/CIF - é uma das 11 Câmaras Técnicas criadas para orientar, acompanhar, monitorar e fiscalizar quatro Programas, entre os 42 programas do Acordo: o PMBA-Programa de Conservação da Biodiversidade Aquática, incluindo água doce, zona costeira e estuarina e área marinha impactada; o programa de Fortalecimento das Estruturas de Triagem e Reintrodução da Fauna Silvestre-CETRAS; o PMBT-programa de Conservação da Fauna e Flora Terrestre e o Programa de Consolidação de Unidades de Conservação. Ela é composta por representantes do ICMBio (que também a coordena), IBAMA, IEF-MG, IEMA-ES, secretarias de meio ambiente nos municípios, assessores técnicos do MP e dos atingidos. Todas as 11 Câmaras Técnicas foram criadas em julho de 2016, por meio da Deliberação nº 7 do Comitê Interfederativo (CIF), este criado em abril de 2016, pelo Ministério do Meio Ambiente, por meio da Portaria 95 (07/04/2016).
Marco Temporal/Desastre – No dia 05 de novembro de 2015 aconteceu o rompimento da barragem da Samarco em Fundão, em Mariana/MG, quando aproximadamente 39,2 milhões de m³ de rejeitos de mineração saíram da área de propriedade da Samarco/Vale/BHP. O rejeito atingiu o Rio Gualaxo do Norte, percorreu seu leito e desaguou no Rio Doce. Acredita-se que 20,3 milhões de m³ de material ficaram depositados na barragem da Usina Hidrelétrica Risoleta Neves (Candonga). Outros 18,9 milhões de m³ de rejeitos seguiram o fluxo dos cursos d’água e parte chegou, na foz do Rio Doce, em Regência Augusta, Linhares-ES, chegando no mar no dia 21 de novembro de 2015. (Fonte: CT-BIO/CIF).
Texto: Sandra Tavares - Comunicação Centro TAMAR ICMBio
Fotos: Luiz Vital - FEST/UFES