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Projeto busca compatibilizar conservação do solo e das cavernas de Mambaí (GO) com o desenvolvimento econômico local
As atividades agropecuárias importantes para nossa existência devem adotar práticas conservacionistas do solo para garantir a produtividade e evitar impactos como os processos erosivos que resultam no assoreamento de rios, secamento de nascentes e o entupimento de cavernas. De forma geral, esses impactos causam a perda de solo e seus nutrientes reduzindo a produtividade agropecuária, a produção de água e a perda da biodiversidade, tanto na superfície como nas cavernas. Boas práticas agropecuárias garantem a produção de alimentos ao mesmo tempo que contribuem com a conservação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos, como a produção de água e o sequestro de carbono para mitigar as mudanças do clima. Buscando desenvolver ações que compatibilizam a produção agropecuária com a conservação, o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação em Biodiversidade e Restauração Ecológica (ICMBio/CBC) realizou em março uma oficina para identificar locais de maior relevância na Área de Proteção Ambiental (APA) Nascentes do Rio Vermelho (GO). Nessa APA estão localizadas diversas cavernas incluindo uma com mais de 13km de extensão figurando entre as maiores do Brasil. As áreas de maior relevância identificadas pelo projeto deverão receber investimentos para melhoria do uso do solo com foco na conservação do patrimônio espeleológico (cavernas).
A oficina faz parte de um projeto que tem três escalas geográficas: nacional, regional e local. A atividade em escala regional na APA Nascentes do Rio Vermelho reuniu proprietários rurais, instituições de extensão e assistência técnica rural, pesquisadores, comunidade local e gestores dos municípios integrantes e do entorno da APA, além de servidores do ICMBio/CBC e do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (ICMBio/Cecav), que apoia o projeto por meio de um Termo de Compromisso de Compensação Espeleológica (TCCE).
“Iniciamos esse projeto pela etapa regional, com a realização do Planejamento Sistemático da Conservação (PSC) na escala da APA das Nascentes do Rio Vermelho. Essa etapa contou com a elaboração do mapa de áreas prioritárias com a participação ativa de especialistas e membros da comunidade local, por meio de oficinas participativas online e a oficina presencial na cidade de Mambaí (GO). Os resultados dessas oficinas estão sendo compilados e integrados à versão final do mapa de áreas prioritárias para a APA e o próximo passo será a elaboração de um Plano de ação para a melhoria das condições do solo com vistas à conservação do patrimônio espeleológico na unidade de conservação”, afirmou a bolsista do ICMBio/CBC, Bárbara Araújo.Segundo Bárbara, a etapa nacional já está sendo iniciada e terá como foco as regiões cársticas do Brasil central, com a realização do PSC nessa escala e elaboração do “Plano integrado de melhoria do uso do solo para conservação do patrimônio espeleológico e da sociobiodiversidade em ambientes cársticos”. Este Plano irá elencar ações e projetos para promover a conservação espeleológica associada à melhoria de práticas agrícolas, resultando em ganhos econômicos aos proprietários rurais e em ganho para a conservação do patrimônio espeleológico e da sociobiodiversidade.
Já a etapa local, será realizada a partir da continuidade das ações de restauração e pastagens ecológicas, que já estão sendo desenvolvidas na APA Nascentes do Rio Vermelho. O objetivo dessa etapa é dar ampla divulgação aos resultados, além de estimular o engajamento, capacitação e sensibilização das comunidades locais e apoio técnico às propriedades com pastagens ecológicas já implementadas.
Engajamento local é fundamental para os resultados
As Áreas de Proteção Ambiental fazem parte da categoria de unidades de conservação de uso sustentável, que possibilita conciliar a presença da comunidade local e seus interesses econômicos com a conservação da UC. De acordo com o analista ambiental do Núcleo de Gestão Integrada de Mambaí (ICMBio/Mambaí), Raoni Merisse, a principal atividade econômica da região da APA Nascentes do Rio Vermelho é a pecuária extensiva, que se for realizada sem a observância das boas práticas recomendadas, pode representar ameaça à biodiversidade, aos recursos hídricos e aos serviços ecossistêmicos como um todo, em especial àqueles relacionados à conservação dos solos e infiltração da água da chuva.
Por esse motivo, Raoni aponta que “a adesão da comunidade como um todo, em especial dos produtores rurais, às orientações técnicas dos extensionistas, às boas práticas agropecuárias, às normas ambientais e ao princípio de compatibilização entre a produção econômica e a conservação do meio ambiente são fundamentais não só para a conservação da biodiversidade, mas para os demais objetivos da unidade de conservação”.
O analista ambiental explica que atualmente a região da APA apresenta uma realidade preocupante com relação à conservação do solo. “A ocorrência de processos erosivos é disseminada em toda a região, incluindo algumas situações críticas, com voçorocas de grandes proporções, representando impacto ambiental e prejuízo econômico consideráveis, isso repercute também na conservação dos recursos hídricos e cavernas. Essa realidade está associada a diversos fatores, dentre os quais pode-se destacar o manejo inadequado das pastagens, a conversão da vegetação de áreas de preservação permanente (APP) de nascentes, veredas e beira de rio e ausência de medidas de mitigação de impacto nas intervenções em APP (pontes, estradas, acesso para o gado, etc).
De acordo com José Carlos Reino (ICMBio/Cecav), “a região é naturalmente composta por rochas e sedimentos arenosos, cuja herança geológica implica numa combinação muito susceptível a processos erosivos, caso não adotados os devidos cuidados. A remoção da vegetação e a exposição do solo em pastagens degradadas, aceleram e intensificam as erosões. Todo esse material termina indo para dentro de cavernas e leito de rios. Quando isso acontece, também ocorre a perda no volume de água disponível nesses ambientes, afetando o abastecimento humano e animal. Mesmo que seja um ano de muita chuva, se as pastagens estiverem com o solo exposto a área não exercerá sua função natural de recarga para os aquíferos e funcionará, infelizmente, apenas como fonte de sedimentos que irão entupir os mananciais hídricos. Todos saem perdendo com isso. Daí a importância da participação coletiva”.
A programação do encontro incluiu ainda questões relacionadas à saúde animal e à conservação da vida silvestre, uma palestra sobre notificação em casos de ocorrência de morcegos em propriedades rurais, realizada pela Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa), e uma oficina sobre a conservação de morcegos e o controle antirrábico, conduzida pelo professor do Departamento de Zoologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Enrico Bernard.