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Peixes das nuvens são descobertos na Caatinga
Hypsolebias bonita - Foto: Diego Bento
Um projeto realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (ICMBio/Cecav) levou à descoberta de duas novas espécies de “peixes das nuvens”. Com os novos registros, o número atual de espécies do gênero Hypsolebias foi para 57. A pesquisa foi realizada por meio de análises genéticas e morfológicas e seu resultado foi publicado na revista científica Zootaxa.
Popularmente conhecidos como “peixes das nuvens”, pois no imaginário das pessoas acreditava-se que eles caiam do céu, esse peixes também são chamados de “peixes anuais”, pois são organismos que nascem, crescem, se reproduzem e morrem durante a estação chuvosa do ano. Vivem em poças temporárias formadas a partir das águas das chuvas, e são capazes de enterrar os ovos na lama para que a prole sobreviva ao período das secas.
Sobre as espécies descobertas
As espécies foram nomeadas em homenagem a Maria Bonita e a uma divindade africana. Hypsolebias bonita ocorre no Rio Grande do Norte e H. gongobira ocorre no Ceará. Os peixes, provavelmente ameaçados de extinção, foram encontrados durante expedições que também tinham como objetivo coletar material para avaliar o estado de conservação dos peixes já conhecidos e das lagoas e bacias em que eles ocorrem.
H. bonita ocorre em várias áreas cársticas no Rio Grande do Norte, sendo inclusive a única espécie de peixe sazonal registrada em cavernas (possivelmente de forma acidental, carregada durantes as chuvas torrenciais típicas da Caatinga). Enquanto a fêmea da espécie H. bonita é mais discreta, com cor clara e pequenas manchas pretas pelo corpo, o macho é colorido. Pontos azuis se espalham por todo o peixe, assim como detalhes laranja nas nadadeiras e um azul mais forte no final da cauda.
Segundo os pesquisadores, o nome faz referência tanto a Maria Bonita, que percorreu a região junto com o bando de Lampião, quanto à sua ocorrência no Parque Nacional (PARNA) da Furna Feia (RN).
"Mostramos que o que parecia ser uma única espécie, com ampla distribuição, na verdade são três, com áreas menores. Também registramos H. bonita no PARNA da Furna Feia, o que assegura a conservação de parte das ocorrências da espécie. Já H. gongobira foi registrada junto com H. longignatus no Ceará, uma espécie ameaçada de extinção que foi redescoberta durante uma obra de duplicação de uma rodovia, alertando para esse impacto sobre os peixes anuais que vivem em alagados temporários. Como eles secam completamente, as obras são feitas às vezes em áreas onde os ovos estão enterrados, comprometendo a sobrevivência de populações ou espécies”, comentou o professor do departamento de Botânica e Zoologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Sérgio Lima.
A fêmea da espécie H. gongobira, que ocorre no Ceará, é parecida com a do Rio Grande do Norte, já o macho é bem mais alaranjado e com pontinhos brancos. O nome desse peixe foi dado em alusão à uma divindade africana que teria povoado as lagoas com peixes coloridos, diz Lima.
O estudo faz parte do mestrado de Yuri Abrantes, aluno do Programa do Programa de Pós-Graduação em Sistemática e Evolução da UFRN, e contou com a participação de pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Instituto Tecnológico Vale e do ICMBio/Cecav. Parte das atividades ocorreu durante um inventário de peixes em áreas cársticas no oeste do Rio Grande do Norte, inserido no projeto Inventário anual do Patrimônio Espeleológico e coordenado pela Base Avançada do ICMBio/Cecav no RN.
“Nossas ações de conservação, até o momento, envolvem o monitoramento dos impactos ambientais que foram identificados nas localidades das espécies, que incluem a expansão urbana, atividades agropecuárias e mineração no oeste do Rio Grande do Norte. Com isso, objetivamos fortalecer propostas de ampliação ou criação de novas unidades de conservação, que protejam tanto os ecossistemas aquáticos superficiais quanto os subterrâneos, já que a espécie de peixe das nuvens H. bonita foi encontrada ocorrendo dentro de cavernas inundadas e nos lajedos calcários da Formação Jandaíra, durante o período chuvoso”, afirmou Yuri Abrantes.