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Transposição ou energia, artigo de Paulo Eduardo Fernandes de Almeida
Há divergências sobre o volume de água disponível no Rio São Francisco
Estado de Minas
15/03/2005
Para ser bem-sucedido, um projeto de transposição exige que haja disponibilidade de água. O mesmo acontece para a geração de energia, sem o que o desenvolvimento econômico de uma determinada região não pode ser viabilizado. No projeto de integração do Rio São Francisco com as bacias do Nordeste Setentrional, impõe-se uma grande questão: quais seriam as necessidades para atender as demandas atuais e permitir o desenvolvimento futuro? Governos federal e estaduais e ONGs divergem sobre o volume disponível de água para a transposição. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), responsável pela outorga para o uso, a disponibilidade, atual e futura, corresponde a uma vazão média de 67 metros cúbicos por segundo, que poderia ser transposta para complementar a oferta das bacias receptoras. A retirada desse volume não prejudicaria o fornecimento das necessidades de água na Bacia do São Francisco, o que é contestado.
Do ponto de vista energético, existem grandes desafios a vencer. Na fase inicial do projeto, seria necessário elevar 93 bilhões de litros por mês, equivalentes ao volume de água de oito lagoas da Pampulha, a uma altura de 160 metros, para atingir as regiões do Ceará e do Rio Grande do Norte. Deveriam ainda ser bombeados 30 bilhões de litros por mês (três Pampulha), elevando-os a 300 metros, para atingir a Paraíba, e a 500 metros, até Pernambuco. Para tanto, seria preciso, não apenas a garantia de disponibilidade de energia elétrica, mas que seu custo pudesse ser absorvido pelos futuros usuários. Além de grande consumidor de energia, o projeto teria forte impacto na sua geração, porque todo o volume de água seria captado logo depois da barragem da Usina de Sobradinho, deixando de produzir energia nas usinas existentes abaixo dela, no Rio São Francisco: Itaparica, Xingó e Moxotó/Complexo de Paulo Afonso.
Quais seriam as conseqüências do projeto para o fornecimento de energia elétrica ao Nordeste? O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que planeja continuamente, para os cinco anos seguintes, a operação do sistema elétrico para atender o consumo de energia em cada região do Brasil, dá como acentuado o risco de 9% de déficit de energia elétrica no Nordeste, em 2009. A situação, que representa um grave alerta para a necessidade de se aumentar a capacidade de geração, torna-se muito mais grave quando sabe-se que o projeto de transposição não foi incluído no planejamento do ONS. Sua implantação aumentaria a demanda regional de energia, devido ao bombeamento de água, e diminuiria a geração, antecipando a probabilidade de apagão. A transposição do São Francisco, planejada para combater a escassez de água em algumas áreas do Nordeste Setentrional, corre sério risco de resultar em escassez de energia elétrica em todo o Nordeste ou mesmo de se tornar um projeto fadado ao fracasso, por falta de energia para sua operacionalização.
Paulo Eduardo Fernandes de Almeida, Engenheiro e consultor em estratégia e energia da CEMIG