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Transposição irá privatizar água do São Francisco
Disponível em:
http://www.ecodebate.com.br/Principal_vis.asp?cod=5243&cat =
15/05/2007
Governo estuda privatizar a Transposição do São Francisco - Imagem do Google
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Correio da Bahia
] A execução da transposição do Rio São Francisco vai estabelecer "a primeira privatização dos grandes volumes de água no Brasil, funestamente na região onde a água deveria ser mais que nunca preservada como um bem público". A denúncia é um dos argumentos do artigo 'Na guerra da transposição não há inocentes - O sertão pede a verdade', que vem sendo divulgado pelas entidades contrárias ao projeto.
Assinado por Roberto Malvezzi, da Comissão Pastoral da Terra (CPT); Marina dos Santos, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST); e Temístocles Marcelos, da Central Única dos Trabalhadores (CUT), o texto ressalta que "conseguiram dividir o semi-árido em dois, como se os problemas e desafios fossem apenas de Ceará, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Insistem em ignorar que Bahia, Sergipe, Piauí, Alagoas, Maranhão e Norte de Minas têm os mesmos desafios".
Os três autores frisaram as preocupações mundiais acerca de uma possível escasssez de água no futuro. "Há um conflito mundial aberto sobre esses novos rumos. Há os que insistem em seu uso predador, na sua privatização, na sua mercantilização, aberta ou sutil. Há aqueles que querem um novo manejo da água, que permaneça como um bem público, fora das regras do mercado. No Brasil, esse conflito se traduz de forma cristalina na transposição do rio São Francisco. É preciso saber de que lado estamos".
Projeto a cargo do Ministério da Integração Nacional e uma das meninas dos olhos do presidente Lula, a transposição vem sendo executada lentamente, e às escondidas. A reação social, cujo momento mais marcante foi a greve de fome do bispo da cidade de Barra, dom Luiz Flávio Cappio, em 2005, é forte. Em março, 600 representantes de entidades e movimentos da sociedade civil acamparam por cinco dias em Brasília contestando o projeto. Não foram recebidos pelo governo federal, que se articula para tentar ganhar a opinião pública. Na última semana, foram liberados R$26 milhões para o Exército realizar as primeiras obras civis.
O artigo critica o envolvimento de entidades vinculadas aos trabalhadores na defesa da transposição. Os representantes da sociedade contrários à obra são consensuais ao apregoarem, como alternativa da transposição, o Atlas do Nordeste, da Agência Nacional de Águas (ANA), para a área urbana; e os projetos formulados pela entidade Articulação para o Semi-Árido, na zona rural. Se o Atlas for integralmente executado, a previsão é de um gasto de R$ 3,3 bilhões, metade do orçamento da transposição.
"Esquecem ainda que a região mais pobre de água do Brasil - embora ainda esteja num nível suficiente segundo padrões da ONU - é o sertão pernambucano. Portanto, pasmem, a região mais pobre de água do Brasil encontra-se no Vale do São Francisco. Se recusam em admitir os dados que indicam água suficiente em todos os estados para abastecer suas populações. O problema não é de água estocada, é de democratização da água existente", assinalam os signatários do artigo.
No documento da CPT/MST e CUT, os ambientalistas informam que a transposição "vai atingir, no máximo, 6% do semi-árido, e, portanto, 94% vão ficar de fora". Eles condenam os estudos de impacto ambiental do projeto e rebatem o argumento oficial de que 26 metros cúbicos não vão ter impacto algum na calha. "Em tempos normais é provável que realmente o impacto seja pequeno, porém, como o rio varia de picos de cheias para escassez assustadores - como no ano do apagão - seria necessário estudar realmente o impacto da obra na dinâmica do rio", dizem.
O documento novamente aponta argumentos de que a transposição visa mais interesses econômicos do que sociais. "Estudos da Embrapa indicam que apenas 5% dos solos do semi-árido são irrigáveis e existe água para irrigar apenas 2%. Portanto, 95% do semi-árido serão sempre semi-árido". Observam ainda que o cultivo de alimentos para a população mais pobre se baseia na agricultura de sequeiro. A irrigada é mais adotada em ramos como a fruticultura.
Um gigante ameaçado
O rio São Francisco é um gigante por natureza. Segundo informações do Ministério da Integração Nacional, o Velho Chico ou o Rio da Integração Nacional, como também é conhecido, possui uma extensão de 2,7 mil quilômetros, desde a Serra da Canastra, no município mineiro de São Roque de Minas, onde nasce, até a sua foz, entre os estados de Sergipe e Alagoas. A área total da bacia do São Francisco é de 634 mil quilômetros quadrados.
Ela é dividida em quatro trechos: o primeiro compreende o Alto São Francisco, que vai das nascentes até a cidade de Pirapora (MG), com 100.076km2, ou seja, 702km de extensão. Sua população é de 6,247 milhões de habitantes. O Médio São Francisco vai de Pirapora (MG) até Remanso (BA), com 402.53km2 numa área de 1.230km de extensão. Sua população é de 3,232 milhões de habitantes.
O Submédio São Francisco vai do município de Remanso (BA) até Paulo Afonso (BA), com 110.446km2, 440km de extensão e uma população estimada em 1,944 milhão. O Baixo São Francisco vai de Paulo Afonso (BA) até a foz, entre os estados de Sergipe e Alagoas, com 25.523km2, 214km de extensão e uma população média de 1,373 milhão
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Governo prioriza projeto
BRASÍLIA - A dedicação que o governo federal não dispensa à área de saneamento _ em que aplicou somente 0,14% da dotação liberada pelo orçamento _ está presente no projeto de transposição, que é reprovado por movimentos sociais, estudiosos e instituições como as pastorais da Igreja Católica.
A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, declarou durante a coletiva de avaliação do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que o projeto deve receber "atenção especial" do governo Lula.
Segundo o Ministério da Integração Nacional, alguns contratos e convênios da transposição encontram-se em andamento. Um deles, para o fornecimento dos conjuntos de motobombas, movimenta R$131,9 milhões. Até o último dia 4, foram empenhados pela União R$8 milhões para ações do projeto não especificadas pelo ministério. Também estão sendo agilizadas as licitações. As que selecionam as empresas que farão os projetos executivos e supervisionarão as obras estão em estágio avançado. O ministro Geddel Vieira Lima pretende fazer uma viagem na próxima semana pelo leito do Velho Chico na luta para reverter a resistência social ao projeto.
Essa movimentação do ministério na região da Bacia Hidrográfica do São Francisco é uma das críticas de Roberto Saraiva, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco. Segundo denuncia Saraiva, o governo federal está negociando isoladamente com as tribos cujas áreas serão cortadas pelos canais da transposição, colocando povos indígenas uns contra os outros. "É uma tática perversa. Estão barganhando demarcação de terras para as tribos não colocarem dificuldades contra a obra", disse.
Os movimentos e instituições contrários à transposição ameaçam fazer protestos nos canteiros das obras. Algumas etnias, como os trukás, declararam aceitar participar desses atos. Roberto Saraiva critica ainda a falta de debate técnico acerca do projeto. O eixo leste, revela, não priorizará o consumo humano, como propala o governo, pois será composto por canais. "Para consumo humano, deveriam ser utilizados dutos".
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www.ecodebate.com.br
) matérias originalmente publicadas pelo Correio da Bahia - 13/05/2007
Nota do EcoDebate
O artigo em questão (Na Guerra da Transposição não há inocentes – O sertão pede a verdade) foi publicado pelo EcoDebate no dia 08/05/2007 e está disponível in
http://www.ecodebate.com.br/Principal_vis.asp?cod=5184&cat
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Sobre o assunto
ARTIGO: Na Guerra da Transposição não há inocentes
https://www.revistaforum.com.br/artigo-na-guerra-da-transposicao-nao-ha-inocentes/