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ESTUDO DA SALINIDADE DE ÁGUAS UTILIZADAS EM PEQUENA IRRIGAÇÃO NO NORDESTE, E DA SUA EVOLUÇÃO SAZONAL, DURANTE OS ANOS DE 1988 E 1989
https://www.fundaj.gov.br/images/stories/nesa/salinidade5.pdf
Tema apresentado no I Simpósio de Recursos Hídricos do Nordeste
Associação Brasileira de Recursos Hídricos - ABRH
João Suassuna - Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco
Pierre Audry - Pesquisador do ORSTOM/UFPE
25/11/1992
Pequeno açude - Fonte hídrica muito utilizada na irrigação do Semi-árido nordestino
HISTÓRICO E JUSTIFICATIVA
Em 1988, um programa de desenvolvimento regional, executado pela Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE, com apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID, chamado CASI (Conservação da Água e Sistemas de Irrigação), começou a desenvolver a pequena irrigação (entender pequena irrigação como pequenas superfícies irrigadas, na ordem de 0,5 a 1 ou 2 ha), a nível de pequeno produtor do semi-árido do Nordeste, aproveitando a diversidade dos mananciais existentes no local. Além de um inegável sucesso técnico, este programa levantou problemas relativos às limitações próprias do tema, como o aparecimento, em alguns casos, de processos de salinização, limitando a produção das culturas, principalmente fruteiras, com possível risco de degradação dos solos.
A partir de 1983, o Governo Federal, por intermédio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, firmou convênio com o BID, no sentido de dar continuidade e ampliar a primeira experiência, sob a forma de um Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico para o Nordeste - PDCT/NE. O Programa que foi concluído em 1990, atuou em cinco estados do Nordeste (Ceará, Paraíba, Pernambuco e Rio Grande do Norte), através de Universidades da região, e da Agência Nordeste do CNPq (ANE-CNPq, Recife) que ficou responsável pela supervisão técnica. O Programa constou de dois subprogramas. O primeiro, relativo à Pesquisa e o segundo, chamado GAT (Geração e Adaptação de Tecnologia), direcionado para aplicações experimentais de tecnologias, dentre as quais, a pequena irrigação, em condições reais de campo, nas propriedades de pequenos produtores da região, aproveitando toda fonte de água disponível: rios, açudes de qualquer dimensão, principalmente os pequenos, e lençóis aluviais explorados por poços.
Essa experiência confirmou a existência do risco de salinização dos solos, quando se utiliza a pequena irrigação, e destacou as limitações decorrentes para a produção das culturas, em particular a da bananeira, que foi uma das mais plantadas por motivos alimentares e econômicos. Entre os fatores responsáveis pela salinização, a qualidade da água é um dos mais importantes e dos menos remediáveis, fator ainda complicado, na medida em que a salinidade dessas águas pode apresentar variações sazonais de grande amplitude. Entretanto, ao contrário do grande número de informações existentes quanto à qualidade da água dos grandes mananciais, os dados existentes sobre a qualidade dos pequenos mananciais localizados são escassos e, mais ainda, para as suas variações sazonais.
Diante dessa situação, e para remediar esta carência, foi idealizada uma pesquisa de dois anos de amostragens periódicas das águas, efetivamente utilizadas nas propriedades do GAT, em quatro estados participantes (após desistência do Piauí), nos anos de 1988 e 1989, coordenada pelos autores da presente comunicação, que eram respectivamente na época, um, responsável pelo subprograma GAT e outro, consultor técnico no subprograma Pesquisa do PDCT.
CONDIÇÕES DE EXECUÇÃO E METODOLOGIA
Tanto a organização do trabalho, como a metodologia foram elaboradas para tentar conseguir dados e informações confiáveis e homogêneas, apesar de abranger 76 pontos de amostragens distribuídos em quatro estados do Nordeste.
A nível do campo, a responsabilidade pela execução ficou por conta das Universidades participantes (UFC, ESAM, UFPB, UFRPE), através da infra-estrutura técnico-administrativa do subprograma GAT. Foram assim coletadas amostras de água em periodicidade mensal, bem como dados e observações complementares em duas categorias: 1) dados relacionados com a evolução quantitativa e qualitativa da reserva de água: basicamente dados de chuva e de nível de água, que são os parâmetros mais simples, exprimindo os efeitos dos fatores mais evidentes dos processos de concentração e diluição dos sais; 2) observações sobre o comportamento e o rendimento das culturas, em relação com à irrigação e à qualidade da água.
As amostras foram reagrupadas em Recife, para serem analisadas, em um único laboratório, a fim de garantir uma metodologia homogênea, cuja reprodutibilidade foi avaliada ao longo da operação. As análises realizadas foram completas (tipo de irrigação, incluídos cations e ânions) para o primeiro ano de amostragens, e apenas a salinidade global (pela medida de condutividade elétrica) e pH, para o segundo ano. Os resultados foram armazenados em um pequeno banco de dados, e submetidos à análise de consistência. Ao total, foram realizadas 1239 análises de água, em que 746 foram completas, e 2% eliminadas por serem consideradas inconsistentes, devido principalmente a problemas de amostragem e/ou conservação das amostras. Esta parte do trabalho foi realizada em Recife, na Agência Regional do CNPq, e após a extinção dessa, em 1990, na Fundação Joaquim Nabuco que acolheu a equipe técnica encarregada do trabalho.
ESTADO DE ANDAMENTO E PREVISÕES
Um primeiro relatório técnico foi produzido e divulgado. Trata-se do catálogo das observações de campo e dos resultados de análise, apresentando detalhadamente a metodologia utilizada para todas as fases do trabalho, e incluindo uma apresentação gráfica da salinidade e sua evolução sazonal, para cada ponto de amostragem.
Futuramente, um pequeno livro apresentará interpretações desses resultados, principalmente baseadas na análise estatística dos níveis de salinidade das águas e da sua amplitude de variação sazonal, para as diferentes fontes de água, e em relação às condições de rochas e solos das bacias, que intervêm para fornecer os produtos encontrados em solução nas águas. Este trabalho tem duas finalidades: 1) apresentar reflexões sobre os processos naturais que determinam a diversidade de qualidade observada, e daí, propor algumas orientações para a extrapolação desses resultados, extensões futuras do presente inventário preliminar, bem como, de imediato, relacionar algumas precauções para a escolha das fontes de água para a pequena irrigação e as suas condições de aproveitamento; 2) tentar avaliar as conseqüências do uso dessas águas no que diz respeito à produção das culturas irrigadas e ao risco de degradação dos solos por salinização e sodificação, no sentido de precisar essas regras de uso e de manejo. Além disso, pretende-se trazer subsídios para projetistas, extensionistas e planejadores, auxiliando-os na implantação de futuros Programas de Desenvolvimento, onde a componente Irrigação se faça presente.
Enfim, as Universidades foram integradas, na medida em que desejaram participar no processo de interpretação. Assim, um mestrando do Laboratório de Irrigação e Salinidade da UFPB de Campina Grande, desenvolveu uma tese sob a orientação do Professor Hans R. Gheiy, sobre os problemas específicos de salinização dos solos e de reação das bacias à este tipo de situação, nas propriedades do GAT da Paraíba e do Rio Grande do Norte.
ALGUNS RESULTADOS PRELIMINARES
Ainda que parciais, alguns resultados preliminares podem ser rapidamente relacionados a seguir.
Provavelmente, o mais importante é que a maioria dessas águas, mesmo aquelas que apresentam as concentrações salinas mais elevadas, dificultando seriamente o seu uso para fins de irrigação, é do tipo cloretada sódica. Isto significa que, se os riscos de salinização forem importantes, principalmente quando não houver uma drenagem eficiente, os riscos de sodificação dos solos (que leva à degradação de dificílima e onerosa recuperação) ficam minimizados.
Considerando as várias fontes de água, chega-se à conclusão de que as águas dos lençóis aluviais bombeadas dos poços amazonas são as mais problemáticas. Apresentam variações sazonais de mineralização espetaculares e atingem níveis de salinidade elevados, ultrapassando freqüentemente 1500 microsiemens/cm de condutividade elétrica na época da estiagem, isto é, no momento em que a disponibilidade quantitativa é menor, justamente quando, tanto por motivo da alta demanda evapotranspirativa, como pela má qualidade da água, precisa-se aplicar mais água na irrigação. Em tais condições, é indispensável realizar, previamente, na implantação de qualquer projeto de irrigação, uma avaliação da qualidade da água, na época da estiagem, juntamente com testes de bombeamento.
As águas de rios variam bastante, mas, geralmente, são de boa qualidade. Os rios perenizados se destacam com águas de melhor qualidade e menor variação sazonal. É claro que, neste caso, esta qualidade reflete estritamente a do reservatório de regularização, o que leva a se ter prudência diante deste resultado, sabendo-se que os açudes podem apresentar qualidade diversificada.
A localização da tomada de água no leito de um rio é de grande importância. A alguns metros de distância da drenagem de um rio, com água de boa qualidade, um poço amazonas poderá apresentar água com nível de mineralização elevado. De maneira análoga, a mineralização de poço natural aumentará rapidamente à medida que a comunicação com o leito do rio deixar de ser suficiente. Em conseqüência, no caso de um rio permanente, sempre vale a pena instalar uma tomada de água que nunca se isole de seu leito natural.