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Semana Nacional dos Museus na Fundaj recebe Pai Ivo de Xambá para palestra sobre ancestralidade e religiões de matrizes africanas
A programação da Semana Nacional dos Museus na Fundaj recebeu um convidado ilustre na manhã desta quarta-feira. O Pai Ivo da Nação Xambá palestrou para alunos das escolas públicas Silva Jardim, do bairro recifense do Monteiro, e Santos Cosme e Damião, de Igarassu. A atividade foi realizada no Cinema do Museu, lotada de jovens que ouviram os ensinamentos do líder do terreiro e do Quilombo do Portão de Gelo, em Olinda. A palestra, moderada por Edna Silva, coordenadora do educativo do Museu do Homem do Nordeste, foi seguida por uma apresentação do Afoxé Ylê Xambá.
Em sua fala, Pai Ivo falou sobre a história do povo negro no Brasil, nossas ligações com o continente africano, as lutas da religiões de matriz africana e a história do Território Xambá. “Nesse último carnaval, vimos muitas escolas de samba trazendo o candomblé. Então, pra Europa ou Estados Unidos, ele está em primeiro plano quando falamos de Brasil, enquanto aqui, no nosso país, os terreiros são invadidos, queimados, as crianças são ensinadas a ter medo do candomblé. Terreiros todo dia são invadidos nesse país”, afirmou Pai Ivo.
A Nação Xambá tem suas origens localizadas na região ao norte dos Ashanti, na fronteira entre a Nigéria e Camarões, chegando ao Brasil por meio dos escravizados. Na década de 1920, o babalorixá Arthur Rosendo chegou ao Recife e iniciou as atividades da Casa Xambá no bairro de Água Fria, que foi assumido por sua filha, Maria Oyá. A repressão estatal fechou o terreiro em 1938, sendo reaberto apenas em 1950, em sua atual localidade, pela Mãe Biu, mãe de Pai Ivo. Após a morte dela, a casa passou a ser dirigida por sua irmã, Mãe Tila e o filho.
Ao falar de sua trajetória, Pai Ivo ressaltou como a história do povo negro é invisibilizada no país. “Nelson Mandela sempre falou que nenhuma criança nasce odiando, ela aprende. Sabemos que o racismo é acadêmico, porque o que estudamos esconde muitos fatos que mostram o racismo no país. Poucas pessoas sabem que um dos maiores engenheiros que tivemos no Brasil foi uma pessoa negra, André Rebouças. Poucos também sabem que um de nossos maiores advogados também foi negro, Luiz Gama, que defendeu mais de 500 causas após o fim da escravidão”, rememora o babalorixá.
Afoxé Ylê Xambá
A palestra de Ivo de Xambá foi seguida de uma apresentação no hall do Muhne do grupo Afoxé Ylê Xambá. No primeiro momento, os alunos do EREM Silva Jardim e EREM Santos Cosme e Damião escutaram a apresentação sobre o grupo, sua origem e como funciona, explicações dadas por Gledson José da Silva, sobrinho-neto de Severina Paraíso da Silva, a Mãe Biu, matriarca da Nação Xambá. Em seguida, foram convidados a participar da dança. Uma roda foi formada e os passos e a musicalidade do afoxé acompanhados pelos estudantes.
Parceria
A Fundaj e o Território Xambá realizarão, até novembro, uma série de ações em parceria, girando em torno de elementos como vestimentas, alimentação e música do terreiro, além da inauguração da exposição de arte africana, que ocupará o primeiro andar do Museu do Homem do Nordeste ao final do ano. “O negro no Brasil tem duas mortes: a física e a do esquecimento. A África tem história, sabemos que uma das maiores representações do preconceito é acadêmico. A Lei 10639 não é aplicada nas escolas porque não querem ensinar a história dos terreiros. Eu encerro com um provérbio africano muito inteligente: ‘enquanto o leão não contar sua história, a história que prevalece é a do caçador”, concluiu Pai Ivo, sob aplausos.