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Pesquisadores da Fundaj avaliam recadastramento do BPC proposto pelo Governo Federal
O Governo Federal anunciou medidas rigorosas para combater irregularidades no Benefício de Prestação Continuada (BPC). A medida visa identificar irregularidades e reduzir gastos com o auxílio. O Governo estima que as fraudes no programa possam chegar a 30%. Para os pesquisadores do Núcleo de Inovação Social em Políticas Públicas Sociais (NISP), um dos núcleos de pesquisa da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), é um percentual alarmante de fraudes, o que justifica a ação imediata do governo, em uma iniciativa que promete revolucionar a gestão do programa social.
O recadastramento abrangerá idosos e pessoas com deficiência de baixa renda que já recebem o benefício. Os prazos para regularização variam de acordo com o porte do município: 45 dias para cidades com até 50 mil habitantes e 90 dias para municípios de médio e grande portes. A não regularização dentro do prazo resultará na suspensão do benefício. O governo também está estudando a extensão da exigência de biometria para pais de crianças autistas inscritas no programa, ampliando ainda mais o alcance das medidas de segurança.
“Os números justificam a preocupação: houve um aumento de 198% nas despesas com o BPC no primeiro semestre de 2024 em comparação com o ano anterior, com um custo total estimado em R$ 115 bilhões para 2024. Um relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) identificou várias falhas no pagamento do BPC, recomendando o cruzamento de dados para identificar acumulações indevidas”, afirma o pesquisador da Fundaj Sérgio Kelner. “A revisão dos cadastros envolverá um esforço conjunto de ministérios, estados e prefeituras, com os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) desempenhando um papel fundamental no processo”, completa.
Desafios significativos estão sendo enfrentados com dados desatualizados e imprecisos no Cadastro Único. “Além disso, verificam-se problemas de acesso restrito e instabilidade no sistema, que dificultam a manutenção e atualização dos dados. A questão central agora é como fortalecer os mecanismos de verificação e validação de dados no CadÚnico para prevenir fraudes, assegurando a integridade das informações e, ao mesmo tempo, garantindo a segurança dos softwares e a eficiência na integração de diferentes bases de dados”, afirma a pesquisadora da Fundaj Carolina Beltrão.
Para os pesquisadores da Fundaj, é necessário cuidado na implementação das medidas, sendo crucial que o processo não penalize injustamente beneficiários legítimos que possam ter dificuldades em cumprir os novos requisitos. Para isso, afirmam, o Governo Federal deve dar suporte adequado aos CRAS nos municípios para auxiliar no processo de recadastramento, especialmente para idosos e pessoas com deficiência que possam enfrentar dificuldades.
“Esta medida pode marcar mais um ponto de virada na gestão de programas sociais no Brasil, prometendo maior eficiência e justiça na distribuição de benefícios. O sucesso da iniciativa poderá servir de modelo para outros programas sociais, contribuindo para um sistema de proteção social mais robusto e confiável no país”, acredita Kelner.
Mais desafios em programas federais
Os pesquisadores afirmam, contudo, que há vários desafios que vão além do BPC. Uma pesquisa realizada pelo NISP/Fundaj em municípios selecionados de Sergipe e Pernambuco detectou que há problemas no planejamento e na gestão do Cadastro Único, cujo foco deveria ser o de melhoramento contínuo do sistema justamente para diminuir a incidência de fraudes e esses contínuos processos de revisão.
“O Cadastro Único (CadÚnico), instrumento fundamental para a implementação de políticas sociais no Brasil, enfrenta desafios críticos que comprometem sua eficácia e precisão. Apesar de melhorias incrementais, persistem lacunas significativas na qualidade e atualização dos dados, prejudicando a capacidade do sistema de refletir adequadamente a realidade socioeconômica dinâmica da população vulnerável”, afirma Beltrão.
Para os pesquisadores da Fundaj, a obsolescência do monitoramento social e a desatualização dos cadastros constituem obstáculos primordiais. Essa defasagem temporal e conceitual resulta, de acordo com os pesquisadores, em uma representação imprecisa do perfil dos beneficiários, potencialmente levando a decisões equivocadas na alocação de recursos e na concessão de benefícios. “A restrição no acesso dos municípios à base de dados centralizada cria gargalos informacionais, exacerbando o risco de erros na gestão local dos programas sociais”, aponta Sérgio Kelner.
“O sistema de autodeclaração da renda, utilizado no Bolsa Família, apresenta vulnerabilidades intrínsecas que amplificam o risco de distorções e fraudes. A natureza genérica e pouco detalhada das declarações, combinada com a ausência de mecanismos robustos de verificação e punição para informações inverídicas, compromete a integridade dos dados coletados. Esta fragilidade é agravada por deficiências na integração com outras bases de dados governamentais, que é fundamental para a checagem de dados”, avalia Kelner.
Para os pesquisadores, a ausência de ferramentas de gestão sofisticadas e a descontinuidade de iniciativas como o Pacto de Aprimoramento do SUAS (Sistema Único de Assistência Social) comprometem a capacidade de monitoramento, avaliação e geração de dados especializados e territorializados. “Consequentemente, limita-se a habilidade dos gestores em identificar e abordar vulnerabilidades específicas que poderiam mitigar efetivamente a pobreza”, afirma Carolina Beltrão.
Para superar esses desafios estruturais e operacionais, os pesquisadores indicam que é necessária uma revisão abrangente do CadÚnico. “Esta deve incluir a atualização das variáveis considerando o perfil da população e o território, a implementação de mecanismos mais robustos de verificação de dados e o desenvolvimento de um sistema que permita atualizações mais frequentes”, enumera Kelner. “A incorporação da experiência municipal na formulação de soluções e a adoção de um cadastro domiciliar poderiam contribuir para um sistema mais preciso e eficaz. A modernização do CadÚnico não é apenas uma questão técnica, mas um imperativo ético e social para assegurar a efetividade e equidade das políticas públicas de proteção social no Brasil”, completa Beltrão.