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Jornada promove visita a acervo do Cehibra e reflete recortes da fotografia
Uma verdadeira maratona percorrida pelos olhares de diversos fotógrafos e do vasto acervo da Fundação Joaquim Nabuco. Nesta quinta-feira (19), data em que celebramos o Dia Mundial da Fotografia e o Dia Nacional do Historiador, o Centro de Estudos da História Brasilira (Cehibra) promoveu sua I Jornada Fotografias e Coleções. Na data também é celebrado o aniversário do patrono da Instituição. A iniciativa reuniu diversas pesquisadoras e pesquisadores ao longo de quatro mesas de debates. As transmissões podem ser conferidas, na íntegra, no canal da Fundaj no YouTube.
Na abertura, a coordenadora do Cehibra, Albertina Malta, agradeceu à presença de todos os participantes e espectadores e destacou a relevância do recurso. "A fotografia é importante na sua expressão artística, mas especialmente na sua expressão de documento, ela é para a História uma fonte de memória", pontuou. Na primeira mesa, que discutiu o público e o privado na Belle Époque, a pesquisadora Cibele Barbosa refletiu sobre a relação entre Nabuco e a fotografia, revelando fatos e nuances do abolicionista. "O zelo que ele tinha com os álbuns era sempre um presente já pensado como história", destacou Barbosa, sobre Nabuco.
Por sua vez, a pesquisadora Rita de Cássia Araújo conduziu um passeio pelo universo de retratos da Coleção Francisco Rodrigues, do Cehibra. Ainda no início de sua fala, ela reforçou o caráter elitista do recurso entre os Séculos 19 e 20. "A fotografia era tratada como objeto de arte. Era uma peça, por exemplo, que iria compor o ambiente social da casa, exposta na sala de visita como algo digno de ser mostrado, pela construção de uma imagem, uma identidade de classe", contextualizou a pesquisadora, que revelou detalhes sobre a construção da coleção.
A segunda mesa, dedicada à fotografia sobre as paisagens nacionais produzidas pelo olhar estrangeiro, reuniu a fotógrafa Renata Victor, coordenadora do curso de Fotografia da Universidade Católica de Pernambuco, e a historiadora Fabiana Bruce, especialista em Alexandre Berzin. Renata refletiu a trajetória e características técnicas e artísticas no trabalho de Edmond Dansot. Em sua participação, ela exibiu o documentário autoral "Um olhar francês sobre o Nordeste brasileiro". O filme foi produzido a partir de coleção da Fundaj, que reúne 124 mil documentos fotográficos do francês, produzidos entre 1960 a 2010.
Por sua vez, o trabalho do letão Alexandre Berzin foi revisitado pela historiadora Fabiana Bruce, autora do livro "O álbum de Berzin" (Cepe, 2012). O acervo do letão pode ser encontrado no Cehibra e no Museu da Cidade do Recife. "Ele era obsessivo por fotografia e olhava o mundo com esse filtro de fotógrafo, de uma forma mais elaborada. Sua formação cultural, estudo e empenho o faziam preparado. Quando o momento chegava, ele 'puft' capturava", acrescentou Bruce, que o descreveu como um humanista com tendência ao construtivismo. "Ele era um observador do morador da cidade, um flâneur dos Anos 1940."
Durante a exibição das imagens da Coleção Alexandre Berzin, a fotógrafa Roberta Guimarães, que acompanhava à mesa, reagiu: "A imagem que resguarda memórias. As barcaças no Capibaribe, fisicamente, não sobrou uma. Só a fotografia para nos informar de como eram."
Mesas da tarde
Na programação vespertina, a pesquisadora da Fundaj Rosalira Oliveira, especialista em racialidade, refletiu sobre a Coleção Rucker Vieira. Em sua explanação, ela contextualizou elementos da ritualística de religiões afrodescendentes, como o candomblé, e preparou terreno para a apresentação dos demais trabalhos.
A historiadora Sylvia Couceiro, pesquisadora da Casa, promoveu um resgate dos precursores afrodescendentes na fotografia. Ela recordou a chegada da fotografia através do Rio de Janeiro. Em sua fala, Sylvia defende o retrato como uma montagem, ao invés de um espelho da realidade. Imagens de homens, mulheres e crianças negras que datam do início do Século 20 foram exibidas. Dentre as leituras semióticas das imagens, com atenção aos ângulos, vestimentas e posturas dos modelos, destaque para a o retrato do abolicionista cearense e homem liberto Sebastião Grande, da Coleção Francisco Rodrigues.
Ao fim da terceira mesa, a fotógrafa Roberta Guimarães apresentou o ensaio “Agô”, doado ao Cehibra, em 2019. A coleção promove um passeio pela diversidade religiosa dos cultos afrodescendentes. Em sua participação ela refletiu sobre a iconografia das ritualísticas africanas, vestimentas, elementos visuais e cores. “O candomblé é muito complexo. Um resultado da preservação dos cultos ancestrais aos orixás. Diversos povos foram traficados. Muitos deles inclusive rivais, que foram misturados. Imagine esses povos, com as várias culturas milenares e suas diferenças, tendo de minimizá-las para viver e sobreviver”, provocou.
Encerrando a I Jornada, a quarta mesa conduziu o passeio pela fotografia urbana. A pesquisadora Rita de Cássia retornou para comentar os retratos do Recife, produzidos por Benício Dias. Dentre os pontos observados, ela destacou o enfoque dos fotógrafos da época em registrar figuras humanas tidas como exóticas, mas, também, uma paixão especial de Benício pelo cotidiano da cidade. “Nosso desejo é que o público conheça e pesquise essas coleções.” Por sua vez, os arquitetos e pesquisadores da Fundaj Cristiano Borba e Rodrigo Cantarelli refletiram, em dois momentos, sobre coleções que dialogam com as reformas urbanísticas da capital pernambucana.
Destacando elementos da Coleção Wilson Carneiro da Cunha, como registros do Bairro de São José, área central do Recife, a mediadora Cibele Barbosa e Cristiano Borba comentaram marcos da historiografia urbanística, como a demolição da Igreja dos Martírios. “É possível deduzir que existia uma intenção nítida do fotógrafo em estabelecer essa comparação. Mas, também, de uma dedicação a fazer uma visita sistemática e o registro temporal gradativo”, observou Borba, ao inserir duas imagens lado a lado, feitas por Carneiro da Cunha de um mesmo ponto em momentos diferentes.
Rodrigo Cantarelli visitou a Coleção Ecletismos para discutir a arquitetura recifense. Autor do catálogo “Historicismos na arquitetura dos subúrbios recifenses, em que apresenta um recorte da Coleção Ecletismo” (Massangana, 2020), ele explicou a origem da coleção, refletiu sobre avanços da compreensão sobre movimentos arquitetônicos e destacou a importância das construções enquanto mapa temporal do lugar. “Essa diversidade do acervo da Fundaj é muito rica no que se convencionou chamar de Ecletismo. Hoje, com vários estúdios, a gente já divide melhor estes movimentos, entre revivalista, neoclássico, neocolonial, dentre outros.”