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"Exposição 'Memórias: Enfrentamento ao Racismo' é inaugurada na Galeria Massangana
A exposição "Memórias: Enfrentamento ao Racismo" foi aberta ao público na sexta-feira (5). Resultado da parceria entre o Ministério Público de Pernambuco (MPPE) e o Laboratório de Expografia do Curso de Museologia da UFPE, com o apoio da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj) por meio do Museu do Homem do Nordeste (Muhne), equipamento cultural vinculado à Diretoria de Memória, Educação, Cultura e Arte (Dimeca), a mostra mergulha na trajetória institucional do Grupo de Trabalho de Combate à Discriminação Racial (GT Racismo), o mais antigo em atuação no Brasil. Está instalada na Galeria Massangana, localizada no Campus Gilberto Freyre da Fundaj, em Casa Forte. A exposição conta com mediação cultural e ficará aberta ao público até 16 de junho, de terça a sexta, das 9h às 16h30, e aos sábados, domingos e feriados, das 13h às 16h30.
"O GT Racismo completou 20 anos de atuação no MP, desempenhando um papel importante dentro da instituição, com avanços, principalmente na conscientização do racismo estrutural e na instituição se ver nesse contexto de racismo também. E trabalhar contra isso, buscar avanços nesse sentido. A memória serve para relembrarmos todos os passos para conseguirmos evoluir, sem perder de vista que ainda temos uma grande caminhada pela frente", afirmou o Procurador-Geral de Justiça, Marcos Carvalho. A cerimônia de abertura reuniu diversas instituições, artistas e o público em geral. Moacir dos Anjos, coordenador-geral do Muhne, representou, na ocasião, o diretor da Dimeca, Túlio Velho Barreto, e recebeu um certificado de agradecimento do MPPE.
Moacir dos Anjos destacou que realizar uma exposição que celebra a luta antirracista é também reconhecer que o racismo ainda é uma violência estruturante no Brasil, ressaltando a necessidade de união das instituições para contribuir com esse processo de luta.
"É importante a Fundação e o Museu acolherem essa exposição, pois são questões que nos importam, tanto na área de pesquisa, de acervo e de exposições. O racismo e a luta antirracismo são questões que marcam o Brasil praticamente desde seu início como nação”, observou, acrescentando que a violência colonial que fundou o país é atualizada o tempo todo no Brasil contemporâneo. “Fazer uma exposição que de algum modo celebre a luta antirracista é atestar também que o racismo continua como uma violência que estrutura o Brasil, pois ele que estabelece as formas de sociabilidade desiguais e todo o processo de exclusão. É fundamental que as instituições se unam e façam projetos, mais uma vez, enquanto for necessário, para contribuir com esse processo de luta" afirmou.
A presidenta da Fundaj, a professora doutora Márcia Angela Aguiar, destaca o compromisso da Instituição com a luta antirracista e pelos direitos humanos. Durante a abertura da mostra, o artista Ronni FX realizou a performance "Dissociação", cujo vídeo estará disponível durante a exposição. Ele é um dos artistas que abordam a racialidade e estão presentes na exposição, junto com Amanda de Souza, Andressa Demski Rocha, Mavinus, Kênia Lua e Ziel Karapotó. "Acredito que a performance conseguiu atingir um dos objetivos que foi trazer o desconforto, ela traz uma dicotomia entre ser e não ser, entre a dor e a liberdade, e vai ter a vídeo-performance para que as pessoas possam ver ao longo do período da exposição", comentou Ronni FX.
EXPOSIÇÃO
A exposição apresenta uma variedade de obras, incluindo pinturas, fotografias e performances audiovisuais, além das flâmulas suspensas, que exibem frases extraídas de processos conduzidos pelo MPPE relacionados à discriminação racial. Painéis exibem falas de diferentes pensadores, como Lélia Gonzalez, Aílton Krenak e Frantz Fanon, que afirmam: “O negro não deve mais ser colocado diante deste dilema: branquear ou desaparecer, ele deve poder tomar consciência de uma nova possibilidade de existir.”
A professora de Museologia da UFPE, Elaine Müller explica que a mostra foi um trabalho conjunto com os alunos de Museologia, realizado durante dois semestres. O desafio, adianta, foi trazer numa linguagem expográfica as várias camadas e sentidos que tinham que dar à exposição. “Por um lado é institucional, tinha de trazer essa trajetória desses 20 anos do GT Racismo, com vocabulário próprio processual, legislação, situações vivenciadas por pessoas com processos que tramitam no MP, casos de racismo denunciados. Tínhamos o trabalho de Alexandro de Jesus, que aborda uma ferida colonial, e tentamos fazer esse diálogo compartilhando essa voz com artistas que foram indicações feitas pelos estudantes, em sua maioria jovens artistas, que têm trabalho potente para fazer a gente pensar na racialidade. Expograficamente, conseguir colocar tantas camadas e sentidos de forma estética é gratificante", observou a professora.
Alexandro de Jesus, ao qual a professora se refere, é curador da exposição, esteve presente e mostrou sua indignação com o fato de a luta antirracismo ainda ser necessária no país, que ainda sofre até os dias atuais. Ele assina a curadoria junto com o doutorando em antropologia, também da UFPE, Cássio Raniere, e com a própria Elaine Müller. "O objeto desta exposição desafia tanto a humanidade como nosso senso de cultura, desafia a ideia de que estarmos aqui é uma coisa boa. Desafia o fato de celebrarmos os 20 anos do GT racismo. A curadoria partiu do problema lógico que é a racialidade. O GT não responde a uma demanda própria. Ele nasce de uma pressão da sociedade para um combate mais eficaz à questão do racismo”, explicou o curador.
Foi a partir dessa análise que o grupo da curadoria decidiu utilizar termos que foram diretores. “Usamos ‘mal encontro’ para falar sobre o que ocorre com a gente desde o século XVI, que continua atual na forma de uma ferida. A racialidade é justamente essa ferida e o racismo é uma evidência mal vista, todos falam, todos discutem. Mas na hora da responsabilidade, simplesmente não se tem a quem apontar. Quando reivindicamos isso, acaba sendo algo problemático, inclusive na Justiça. Então, nossa ideia é estetizar essa experiência para chegar ao lado de fora, onde não se produz nenhum tipo de sensibilidade, não pelo menos o suficiente para que o equilíbrio mude", ressaltou.
A mostra é uma realização do Projeto Memórias, executado pela Divisão Ministerial do Memorial Institucional (DIMMINS) em parceria com a Divisão de Arquivo Histórico (DIMAQ) do MPPE. O projeto, detalhou a historiadora Ana Fabíola Correia da Costa, gerente da Divisão do Memorial Institucional, nasceu com o objetivo de promover a construção da memória institucional do Ministério Público de Pernambuco, a partir da sua atuação nas áreas criminal, cível e de cidadania. Foi idealizado em 2020 por iniciativa da Divisão Ministerial de Arquivo Histórico (DIMAQ) e da Comissão de Avaliação de Documentos (COMADOC) do MPPE, passando a ficar a cargo, no ano seguinte, da DIMMINS.
Segundo a historiadora, diante da amplitude das abordagens que podem ser feitas, optou-se por recortes temáticos, considerando as demandas sociais atuais. “O primeiro recorte escolhido foi o do enfrentamento ao racismo, por ser uma pauta recorrente na mídia e pelo destacado trabalho desenvolvido pelo GT Racismo”, completou Ana Fabíola. Convidando o público a interagir, a mostra propõe que os visitantes manuseiem arquivos criminais, oferecendo informações textuais e imagens, despertando experiências sensíveis e incentivando cada visitante a deixar sua impressão sobre o tema.