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Engenho Massangana dimensiona herança escravocrata e representatividade na exposição “Jeff Alan: pra deixar de ser “pra inglês ver”
No Brasil, quando se quer referir a algo sem efetividade, é comum ser proferido o ditado “pra inglês ver”. Originado da Lei Feijó, que proibia e punia o tráfico negreiro, mas à época nunca saiu do papel, o sarcasmo envolta dessa expressão foi custoso à liberdade e dignidade dos povos escravizados. Inaugurada em 19 deste mês, data do aniversário de Joaquim Nabuco, o patrono da Fundação Joaquim Nabuco, a exposição “Jeff Alan: pra deixar de ser “pra inglês ver” integra a programação de reabertura do Engenho Massangana. O engenho é um equipamento cultural sob a guarda do Museu do Homem do Nordeste, da Fundação Joaquim Nabuco. A mostra em questão explicita as relações entre memória e reconhecimento da população negra.
Em um país no qual o escravagismo já prevaleceu à ideia de liberdade, a mostra dialoga, na visão dos curadores Ciema Mello, Silvia Barreto e Fernando Alvim, com os resquícios dessa herança escravocrata, ampliando a perspectiva sobre a causa abolicionista e seus desdobramentos até os dias atuais. “Grandes homens como Luís Gama e José do Patrocínio são algumas das figuras representadas nesta exposição que, assim como Joaquim Nabuco, também advogaram pela causa abolicionista”, destaca a antropóloga e chefe da Divisão do Engenho Massangana e de Estudos Museais do Museu do Homem do Nordeste, Ciema Mello.
Para além de valorizar um artista como Jeff Alan e a cultura de matriz africana, a ideia da mostra, ressalta a antropóloga, é reafirmar que, para a Fundaj, a abolição é um processo contínuo. “Liberdade pressupõe dignidade. Buscamos com essa exibição reavivar a memória daqueles que lutaram por esses ideais”, afirma. Exibidas dentro da Casa Grande do Engenho Massangana, as 12 obras retratam importantes ícones abolicionistas e da cultura afro-brasileira, como André Rebouças, Machado de Assis e Carolina de Jesus, além de alguns residentes do entorno do Engenho Massangana.
Jeff Alan, artista convidado, é daltônico e vê cores que ninguém vê, conseguindo extrair em suas pinturas retratos tão densos que se tem a impressão de que, a qualquer momento, as faces se desprenderam - vivas - da tela. “Nessa série, a cor vermelha foi saindo um pouco do meu trabalho. Mesmo sendo uma tonalidade que está dentro da minha zona de conforto, o vermelho tem muito de dor, sangue e luta. Não é essa a minha intenção para esse trabalho”, afirma Jeff. “Projeto a obra no espaço da Massangana de forma vivaz, com o desejo de um futuro presente melhor para o meu povo”.
Para além de sua vivência enquanto homem negro, Jeff Alan reforça em suas pinturas a potência do povo negro através do tempo, mesclando essas personalidades que marcaram a história nacional com configurações estéticas atuais. “Quando desenho um risquinho na sobrancelha e um loiro “pivete” nessas figuras históricas, por exemplo, sinto que é possível incorporar esses corpos no momento presente”, atesta o artista. “É um resgate à memória, não os mantendo relegados a um passado escondido”. A exposição segue aberta para visitação a partir de 19 de agosto, de terça-feira a sábado, das 9h às 16h30, e domingo das 10h às 15h. Entrada gratuita.
Serviço:
Exposição Jeff Alan: pra deixar de ser “pra inglês ver”
Engenho Massangana, Rod. PE-60, s/n - Cabo de Santo Agostinho
Abertura em 19 de agosto (sexta-feira), às 10h