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Em live do Sonora Coletiva, Romulo Froés fala sobre a pluralidade da música brasileira
A música que faz sucesso nas rádios, os cantores que marcaram época, os discos que mais ganharam destaque na imprensa. Tudo isso passa por uma decisão editorial e direcional que muitas vezes não tem relação direta com a competência musical daquele artista ou música, mas sim com uma relação industrial e mercadológica. O século passado foi marcado fortemente pelo surgimento da canção brasileira e seus desdobramentos e a definição do que caberia dentro do guarda-chuva da Música Popular Brasileira (MPB). A live do Sonora Coletiva na noite da quarta-feira (16) não foi sobre o que coube nesse espaço, mas do que ficou de fora e o que isso custou para a cena cultural do País.
A pluralidade da música brasileira foi o tema da live. O vídeo, intitulado "MPB, Nova MPB, Novíssima MPB… Afinal, do que estamos falando?", foi apresentado por Túlio Velho Barreto e contou com a participação do músico Romulo Fróes para falar sobre o assunto. A conversa ocorreu no Canal multiHlab e contou com a presença dos pesquisadores Allan Monteiro e Cristiano Borba.
"Esse conceito que foi construído por uma maioria branca, por uma maioria de homens brancos na crítica e na indústria e que perdurou e que me formou e eu repetia coisas que hoje em dia eu não repito mais. Então eu estou num momento agora que é o seguinte: a linha evolutiva não faz sentido. Nenhum mais. Ela faz sentido como tudo que o Caetano faz na vida, que é aquela lançar coisas que nem o Chico lançou o fim da canção. Mas o Chico nunca disse que a canção morreu. Mas aí o Chico Buarque é uma força tão grande que ilumina um monte de coisas e aí depois virou negócio de fim da canção. Eu acho que nesse momento agora é a linha evolutiva do Caetano pra mim que está no centro de uma nova reflexão de, cara "não tem isso". De que é assim e de tal jeito não rola", explica Rômulo Fróes.
Ele enfatiza que uma imensa parte da música brasileira foi excluída e, via de regra, sequer chegava ao estúdio. "Isso é a linha evolutiva de uma parcela muito pequena da cultura brasileira que excluiu 90% da música brasileira que não conseguia gravar, que não conseguia chegar no estúdio. Porque não tinha o poder de gravar. O funk não existiria se tivesse a indústria, pelo menos não existiria na força que ele existe. Obviamente que a Indústria sempre cooptou aqui tem um artista do forró, aqui tem um artista do funk, aqui tem um artista do pagode, isso tinha. A lógica da indústria brasileira sempre foi muito maior que isso. E, hoje, para além dos artistas poderem gravar, novos críticos podem escrever, novos blogs podem escrever", conclui.
Túlio Velho Barreto, também comentou sobre a exclusão de gêneros musicais do conceito de MPB. "O local dado ao samba. A gente está falando de uma música feita por negros e negras. O samba não está sobre esse guarda-chuva da MPB. Rigorosamente não está. A chamada MPB e os cânones da MPB incorpora Paulinho da Viola como representante. Ele tem um diálogo com esse segmento que está mais identificado com a ideia de música popular brasileira. Nem a MPB abraçava todo mundo", disse Túlio.
O pesquisador Alan Monteiro falou sobre como as mulheres passaram de intérpretes musicais a produtoras de conteúdo. E Cristiano Borba lembrou a importância dos termos dados aos conceitos e falou sobre o impacto das redes sociais para o mercado musical. "Não é bem evolução. É mais uma criação. Aí você fala em música de hashtag. Então bom, se houver uma seleção natural, uma adaptação aí, eu acho que quem vai comandar hoje termina sendo as hashtags. Então a gente vai terminar abraçando o algoritmo. Que vai se guiar de fato por hashtag ou por outros componentes aí e quem tá mais adaptado é quem vai sobreviver", destacou Borba.
Romulo Fróes
O paulista Romulo Fróes tem oito álbuns individuais, e três com o grupo Passo Torto, do qual fez parte, e participou de discos de vários artistas. Tem músicas gravadas por Elza Soares, Ná Ozetti, Juçara Marçal, Rodrigo Campos, Jards Macalé, entre outros, além de ter produzido o primeiro álbum de inéditas da consagrada cantora Elza Soares, A Mulher do Fim do Mundo. Ao lado da letrista pernambucana Alice Coutinho, é coautor da música que dá título ao álbum e se tornou uma espécie de hino de coletivos femininos. Mas também de afirmação de Elza Soares como símbolo dessas lutas e da nova fase de sua carreira. Logo depois coproduziu o álbum seguinte da cantora carioca, Deus é Mulher, e fez a direção artística do aclamado álbum Besta Fera, de Jards Macalé. Além de escrever sobre a temática da live, durante a pandemia, Romulo Fróes passou a ministrar cursos e oficinas sobre a música popular brasileira.