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Discussão sobre o conceito de cultura brasileira marca encerramento do curso "22-22-22: Modernidades, modernismos e contemporaneidade"
Últimas reflexões sobre o processo de formação do Brasil. Após três módulos e 11 encontros, chegou ao fim, nesta quinta-feira (1º), o curso “22-22-22: modernidades, modernismos e contemporaneidade”. Iniciada em setembro, a formação promovida pelo Museu do Homem do Nordeste (Muhne), por meio de sua Divisão de Estudos Museais, foi realizada na Sala Aloísio Magalhães, Campus Ulysses Pernambucano da Fundaj, no Derby. A conferência de encerramento girou em torno do tema “Ideologemas da cultura brasileira’: uma releitura do sentido da formação nacional” e foi ministrada pelo professor Lucas Amaral de Oliveira (UFBA).
A aula propôs uma análise, a partir de uma perspectiva contracolonial, sobre como a ideia de Cultura Brasileira e dos seus correlatos, como identidade nacional e brasilidade, geram uma série de mitos, classificados pelo professor como ideologemas. Com destaque para a democracia racial, a cordialidade e a mestiçagem, o professor discutiu como esses ideologemas impactaram a forma como construímos a ideia de Brasil a partir do fim do século XIX, e como isso teve repercussões cruéis, segundo Lucas, na formação nacional. O objetivo foi mostrar como o conceito de Cultura Brasileira é inexistente enquanto uma unidade agregadora de diversidade.
Doutor em Sociologia pela USP e Professor Adjunto do Departamento de Sociologia da UFBA, Lucas Amaral iniciou a aula falando sobre o privilégio de integrar um curso que faz uma releitura da nossa tradição."O título do curso sugere um certo elo de séculos que nos perseguem em busca dessa modernidade que nunca chega", elaborou o coordenador do PERIFÉRICAS - Núcleo de Estudos em Teorias Sociais, Modernidades e Colonialidades.
O docente iniciou a sua análise abordando a diferença entre os mitos de fundação e a formação nacional, discorrendo sobre o que considera um ideologema. “Esse é um conceito que eu acho bom para a gente pensar como os mitos de fundação reaparecem no processo de formação. Quando falo de formação, é como a gente se constituiu enquanto nação, enquanto povo. O que nos fez ser como a gente é hoje, em termos históricos. Os mitos reaparecem, são refundados, são reatualizados, são rotulados, a depender do momento histórico. O ideologema dá esse vínculo histórico a algo que é a-histórico. Ele adequa o mito a novas narrativas históricas. Quando eu falo de ideologema, eu estou falando dessa ideologia que se manifesta no discurso, uma certa visão de mundo que pouco a pouco se consolida no imaginário”, elaborou o professor.
Em seguida, analisou os ideologemas da democracia racial, da mestiçagem e da cordialidade, além de obras que postularam e canonizaram a ideia de nação brasileira, como Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre, O Homem Cordial, de Sérgio Buarque de Holanda e Formação do Brasil Contemporâneo, de Caio Prado Júnior. “Ao longo do nosso processo formativo, por meio de mitos fundadores, a gente inventou uma ideia de nação, uma ideia de cultura brasileira, e uma personalidade, uma identidade nacional, que é desracializada, porque ela é mestiça, porque ela é cordial, porque ela é miscível”, formulou o professor.
Por fim, o docente propôs um exercício crítico-reflexivo a partir da Antropologia e da Sociologia de como podemos pensar uma leitura contrapontual dos ideologemas analisados. "Acho que a gente tem um fetiche com a ideia de Cultura Brasileira, que arquitetou uma fraternidade romântica, que na prática é violenta, restrita e embranquecedora”, afirmou. A aula foi encerrada com uma sessão de perguntas.
A conferência compôs a programação do terceiro e último módulo do curso, intitulado, “Fronteiras da modernidade, críticas e questionamentos contemporâneos (Século XXI)”. Esta fase direcionou o olhar para o século vigente e para os desdobramentos da crítica à modernidade apresentados pelo pensamento decolonial em diálogo com a museologia. A formação, movida pelo bicentenário da Independência do Brasil (1822) e pelo centenário da Semana de Arte Moderna de São Paulo (1922), propôs recolocar questões fulcrais do processo histórico de formação nacional, edificando e atualizando a crítica com as ferramentas teóricas da contemporaneidade.