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Coordenador-geral do Muhne faz palestra para alunos do ensino fundamental sobre o Movimento de Cultura Popular
Dentro da programação do ciclo de palestras, promovido pela Rede de Bibliotecas pela Paz foi realizada na quarta-feira (23), no Compaz Dom Helder Câmara, a palestra sobre o Movimento de Cultura Popular (MCP), proferida pelo coordenador-geral do Museu do Homem do Nordeste (Muhne), Moacir dos Anjos. A Rede de Bibliotecas pela Paz é vinculada à Prefeitura da Cidade do Recife (PCR). O Muhne é vinculado à Diretoria de Memória, Educação, Cultura e Arte (Dimeca) da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj).
A apresentação contou com a participação de mais de 30 alunos do 8º ano do Ensino Fundamental da Escola Municipal João XXIII, do bairro da Iputinga. Os estudantes receberam as boas-vindas da gerente da Rede de Bibliotecas do Compaz, Deborah Echeverria, que ressaltou, na ocasião, a importância que teve e que tem o Movimento de Cultura Popular na vida dos estudantes da Rede Pública de Ensino do Recife. Moacir dos Anjos contextualizou para os estudantes como foi criado o Movimento de Cultura Popular, em 1960. Destacou a situação de desigualdade social e analfabetismo, que vivia o Brasil, sobretudo a capital pernambucana, no final de 1959, ressaltando que quase 70% das crianças e adolescentes não sabiam ler nem escrever, no Recife e o impacto que isso tinha na vida dessas pessoas e dos adultos, que tinham menos possibilidades de emprego.
“Não existia nenhuma escola municipal. Nas eleições de 1959, foi eleito o prefeito Miguel Arraes de Alencar, que tinha entre as suas plataformas políticas, a gestão da educação e houve um movimento formado por intelectuais, jornalistas, estudantes universitários, operários, a igreja católica progressista e a sociedade civil, que se uniram com o objetivo de criar uma rede pública de ensino. Em maio de 1960, foi criado o MCP e, a partir de então, foi realizada uma parceria com a Prefeitura do Recife. De maio até dezembro do mesmo ano, foram criadas 107 escolas e em seguida mais 300", explicou.
O MCP foi um movimento inspirado no movimento social francês "Peuple et Culture", com objetivos pedagógicos e culturais, baseados em conhecimentos e práticas de vida das pessoas e suas localidades. A educação não se limitava a ensinar a ler e escrever, o método inédito que alfabetizou centenas de milhares em tempo recorde, tinha uma perspectiva maior, associada à arte, à visão crítica, ao atendimento à saúde, à cultura popular com a valorização dos festejos da região, com peças teatrais e praças, onde acontecia um pouco de tudo isso. No centro do Recife foi criada uma galeria de arte, em que várias exposições foram feitas nesse período, dentre as quais, "Meninos do Recife", do artista plástico Abelardo da Hora, que retratou em desenhos, as crianças sem escola, vivendo em pobreza extrema e sem condições de higiene.
À medida que as pessoas eram alfabetizadas, tinham mais consciência dos seus direitos, da sua cidadania. Em 1964, o golpe-civil militar impediu todos esses avanços políticos. O MCP foi extinto e suas principais lideranças presas, assim como o governador eleito Miguel Arraes. Foram 21 anos de regime militar. Para Moacir dos Anjos, "a grande herança do MCP é colocar na pauta da vida a ideia de educação como algo emancipador, que liberta e traz possibilidades". O MCP também usou as ondas do rádio, para ajudar no sistema de alfabetização de adultos. Por não haver lugar para todos os interessados, as aulas eram transmitidas por duas rádios no Recife, onde o lema era: "Combate ao analfabetismo. Faça de sua casa uma escola".
Após a palestra, os alunos foram levados para a Fundação Joaquim Nabuco, no Campus Ulisses Pernambucano, no Derby, onde se encontra a exposição Mutirão, na Galeria Vicente do Rego Monteiro. Com curadoria de Moacir dos Anjos, a mostra reúne mais de 200 itens. "Se não fosse essa palestra eu não saberia a luta para conseguir essas escolas, há 60 anos. O sofrimento que foi. A gente, às vezes, mora num lugar, mas não sabe o que aconteceu com a nossa cidade e isso é conhecimento", declarou comovida a aluna Adrielly Araújo, 13 anos. Para o seu colega, Ellton Ribeiro de Castro, foi surpreendente. "Não sabia de nada disso. E é muito importante a gente saber de onde vem as origens. Antigamente, 70% da população recifense era analfabeta"? Indagou ainda incrédulo o adolescente. "O Recife poderia ser muito melhor se não tivesse havido o golpe, que acabou com o MCP", afirmou.
A técnica pedagógica da Divisão de Anos Finais da Secretaria de Educação do Recife, Yúria Gagarin, ressaltou que esse momento foi muito importante para os estudantes, não é sempre que eles têm a oportunidade como essa. Se eles tiverem um acompanhamento para que isso seja explorado em sala de aula e replicado, será maravilhoso! Fiquei encantada!”. A próxima palestra acontecerá no dia 27 de novembro, sobre a Comissão Estadual da Memória e da Verdade Dom Helder Câmara, com o professor Manoel Moraes.
Mutirão
Em cartaz até 4 de novembro, a mostra Mutirão foi produzida pela Unidade de Artes Visuais/Dimeca. Entre os mais de 200 itens que reúne, há itens de diversas coleções públicas e privadas, incluindo fotografias, folders, cartazes, documentos, filme, objetos, jornais, livros e obras de artistas de algum modo associados ao Movimento de Cultura Popular, tais como Abelardo da Hora, Francisco Brennand, Guita Charifker, Maria Carmen e Wilton de Souza.