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Funarte lamenta a morte de um dos maiores nomes da música brasileira: João Donato
João Donato. Foto: Divulgação
A Fundação Nacional de Artes – Funarte lamenta a morte do instrumentista, compositor, arranjador e cantor João Donato (1934–2023). Considerado um dos maiores nomes da Música Popular Brasileira, também reconhecido mundialmente no jazz e na bossa nova, o artista, natural do Acre, faleceu nesta segunda-feira, 17 de julho, aos 88 anos, no Rio de Janeiro, onde morava. Ele vinha, há dois meses com, problemas de saúde.
Em solidariedade à família, aos amigos e aos milhões de fãs de João Donato e em homenagem ao legado desse artista, representando a Funarte, a presidenta da instituição, Maria Marighella, e a diretora de Música da entidade, Eulicia Esteves, estiveram presentes no velório do músico, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, na Capital Fluminense. "Perdemos o gênio musical João Donato. Das lonas de circo à Bossa Nova, Donato levou sua arte do Acre para o mundo. A Paz de Donato fez o mar da revolução em Gil e em nós. Seu legado viverá conosco. Toda solidariedade a amigos, familiares e a todo o campo artístico do país", disse a presidenta da Funarte.
João Donato se destacou como pianista e, com seu estilo único, influenciou gerações. Nos anos 1960, suas músicas Amazonas, A rã e Caranguejo, fizeram sucesso junto ao público norte-americano e brasileiro – alcançando, depois o mundo. Mas foram muitas as obras de Donato que marcaram a música. O artista ganhou o Grammy Latino, na categoria Melhor Álbum de Jazz e os prêmios: da Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA); Tim; Shell, pelo conjunto da obra; Sharp, de Melhor Disco e Melhor Arranjador; entre outros; e foi indicado para o Prêmio da Música Brasileira, entre outras premiações.
O artista gravou com Marisa Monte, João Bosco e Marcelo D2, Emílio Santiago e Wanda Sá, e incontáveis grandes nomes da música, brasileira e mundial. Ao longo de sua trajetória, Donato fez parcerias com outros talentos, tais como Tom Jobim, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Eumir Deodato e Astrud Gilberto, e muitos outros; e com grandes nomes internacionais, entre eles Bud Shank, Ron Carter, Stan Kenton, Nelson Riddle, Herbie Mann e Wes Montgomery. Deram vida às suas músicas artistas como a Gal Costa, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tim Maia, Leny Andrade, Nara Leão, Roberto Menescal, Milton Banana, Luiz Eça, Tito Madi, Maysa, Dóris Monteiro, Tamba Trio, Victor Assis Brasil, Joyce, Bebel Gilberto, Os Cariocas, Simone, Fafá de Belém, Miúcha, Fagner, Leila Pinheiro, Baden Powell, Ithamara Koorax, Zizi Possi, Adriana Calcanhoto, Angela Ro Ro, Nana Caymmi, Leo Gandelman e Nelson Motta, entre outros. Apresentou-se e foi reconhecido, pela crítica e pelo público, em vários países do globo.
Entre seus arranjos, destacam-se os trabalhos feitos para os CDs O homem de Aquarius, de Tom Jobim, e Minha saudade, de Lisa Ono; e para discos de Fagner, Gal Costa e Martinho da Vila.
A trajetória artística, desde os anos 1940
Pianista e acordeonista muito habilidoso, além de genial compositor e arranjador; e, ainda, cantor, João Donato de Oliveira Neto nasceu em 17 de agosto de 1934, em Rio Branco (AC). Quando criança, brincava de música, com flautinhas de bambu e panelas. Recebeu de presente um acordeão de oito baixos e, depois, um maior. Em 1945, mudou-se para o Rio de Janeiro (RJ) com a família. Começou a tocar em festas do colégio, onde fez amizade com Lúcio Alves, Nanai e Chicão. Em 1949, já atuava em jam sessions na casa de Dick Farney, e no Sinatra-Farney Fan Club, do qual era membro. Em 1951, participou do programa de música nordestina Manhãs da roça, comandado por Zé do Norte, na Rádio Guanabara. Começou a estudar piano.
Começou profissionalmente em 1949, no grupo Altamiro Carrilho e Seu Regional. Com ele gravou, nesse ano, o primeiro disco – mas o selo omite sua participação. Substituiu Chiquinho do Acordeon no conjunto de Fafá Lemos, numa boate. Atuou em outras casas noturnas. Em 1953, formou seu primeiro coletivo, o Donato e Seu Conjunto. Com este, lançou, no mesmo ano, dois discos: Tenderly e Já chegou a hora. Fez parte do grupo Os Namorados, com o qual gravou três discos de música popular. Em 1954, formou o Trio Donato. Em 1956, mudou-se para São Paulo, onde foi pianista do conjunto Os Copacabanas e na Orquestra de Luís Cesar. Em 1956, gravou seu primeiro long-play, Chá dançante, produzido por Tom Jobim. Em 1958, voltou para o Rio de Janeiro dedicando-se somente ao piano. Integrou a Orquestra do Maestro Copinha, no mais histórico hotel de Copacabana.
Em 1959, tocou no México, com Nanai e Elizeth Cardoso. Foi morar nos EUA, ficando lá por três anos. Lá atuou com Carl Tjader, Johnny Martinez, Tito Puente e Mongo Santa Maria. Excursionou com João Gilberto pela Europa. Em 1962, voltou para o Brasil, casado com a atriz norte-americana Patricia del Sasser. Em 1963, um dos seus trabalhos de sucesso foi o LP Muito à vontade, com Tião Neto (contrabaixo) e Milton Banana (bateria). Voltou para os Estados Unidos, onde viveu, por mais dez anos. Gravou um LP com o saxofonista Bud Shank e com a violonista Rosinha de Valença, entre outros discos – entre eles um com a participação do contrabaixista Ron Carter. Trabalhou também com outros artistas, como Astrud Gilberto, Caymmi, Tom Jobim, Eumir Deodato, Stan Kenton, Nelson Riddle, Herbie Mann e Wes Montgomery, entre outros.
Legado na música brasileira com influência mundial
Em 1972, João Donato voltou para o Brasil. Gravou o LP Quem é quem, lançado pela Odeon, em 73. Novidade: o disco inclui peças com letras cantadas pelo próprio compositor. No ano seguinte, fez a direção musical do show Cantar, de Gal Costa, no Rio de Janeiro, do qual também participou – registrado em disco. Em 1997, gravou, com o baterista Eloir de Morais, o CD “Café com pão”, pelo qual recebeu duas indicações para o Prêmio Sharp: Melhor Disco e Melhor Arranjador. Em 2000, lançou o CD Amazonas, por uma gravadora estadunidense, que inclui obras em parceria com João Gilberto. Com a Orquestra Jazz Sinfônica de São Paulo (SP), o contrabaixista Luis Alves e Cláudio Slon na bateria, fez turnê com o repertório, pela Europa, Japão, Austrália, Nova Zelândia e Estados Unidos – inclusive no Blue Note (Nova York). No mesmo ano, foi contemplado com o Prêmio Shell de Música pelo conjunto da obra; e participou, do Free Jazz Festival (RJ), com sucesso de público e crítica.
Em 2002, apresentou-se no Japão, com a cantora Joyce, com quem também gravou. Em 2003, ganhou o Prêmio da Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA). Apresentou-se em Cuba e na Rússia, produzindo para os dois países. Gravou com Marisa Monte, João Bosco e Marcelo D2, Emílio Santiago e Wanda Sá. Em 2004, foi contemplado com o Prêmio Tim pelo disco “Emílio Santiago encontra João Donato; e viajou para a Espanha. No mesmo ano, tocou com Johnny Alf, Carlos Lyra, Roberto Menescal, Wanda Sá, Leny Andrade, Pery Ribeiro, Durval Ferreira, Eliane Elias, Marcos Valle, Os Cariocas e Bossacucanova, no Bossa Nova in Concert, no Canecão (RJ), apresentado por Miele, com direção musical de Roberto Menescal e outros grandes nomes na criação e produção.
Alguns discos marcantes
Em 2005, lançou seu primeiro DVD, Donatural – João Donato ao vivo. Os convidados foram Leila Pinheiro, Joyce, Emílio Santiago, Angela Ro Ro e Gilberto Gil. No ano seguinte, apresentou-se com Bud Shank no antigo Mistura Fina (RJ). Em 2007, lançou um CD com o músico norte-americano, marcando o reencontro dos dois depois de 30 anos – registrado em DVD, que foi lançado em 2008. No mesmo ano, integrou o espetáculo Bossa nova 50 anos, na Praia de Ipanema, Rio de Janeiro – com Carlos Lyra, Zimbo Trio, Leny Andrade, Maria Rita, Fernanda Takai, Marcos Valle e muitos outros. Em 2010, recebeu o O Grammy Latino Prêmio à Excelência Musical. Em 2013, foi indicado ao Prêmio da Música Brasileira, na categoria Melhor Canção, com Eu não sei o seu nome inteiro – parceria com João Bosco e Francisco Bosco. Em 2014, apresentou-se Rio de Janeiro, em show que comemorava seus 80 anos de vida e 65 de carreira – o qual originou os os discos Live Jazz in Rio, volumes 1 e 2.
Em 2016, lançou o CD Donato Elétrico, com sonoridades que utilizaram recursos mais tecnológicos – reforçada por músicos dessa tendência. As experimentações do trabalho agradaram a crítica e o CD ficou na lista dos melhores do ano, do jornal O Globo. Em 2017, João Donato fez um show do disco Bluchanga (2014), com versões de clássicos do jazz mundial e músicas escritas em 1960. Em 2018, seu primeiro disco de trabalho a ter letras, o Quem é Quem (1973), com orquestrações de Lindolpho Gaya, Dori Caymmi, Ian Guest e Laércio de Freitas. O repertório teve turnê nacional.
Trabalho até os últimos anos
Em 2019, em comemoração aos seus 70 anos de carreira, o músico apresentou-se em uma série de shows no Rio de Janeiro, com o bloco carnavalesco Cordão do Boitatá. Em 2021, lançou álbum com temas inéditos, pela série Jazz is Dead, com temas compostos colaborativamente com os produtores e músicos Younge e Muhammad, que também tocaram com o artista. O projeto se tornou uma série de gravações, realizadas nos EUA, com nomes do jazz e da música brasileira que foram referências nos anos 1970.
Em agosto de 2022, João Donato lançou o álbum Serotonina – o primeiro, em 20 anos, com peças inéditas, geradas a partir de manuscritos musicais e fitas de mostruário do artista, com letras compostas por um grupo de compositores de renome.
Leia mais sobre João Donato no Dicionário Cravo Albin da Música Brasileira e no Instituto João Donato.