Assuntos de Gênero e Geracionais
Publicado em
18/11/2013 18h12
Atualizado em
20/11/2020 16h34
No campo da cidadania, os povos indígenas têm direito a promover, desenvolver e proteger suas estruturas institucionais, organizações, usos e costumes, diferentes noções de espiritualidade, tradições, procedimentos, práticas e, sistemas de resolução de conflitos próprios, em conformidade com a Constituição Brasileira e com as diretrizes internacionais de direitos humanos.
A Convenção OIT nº 169 dispõe que os povos indígenas:
"deverão ter o direito de manter seus próprios costumes e instituições, desde que compatíveis com os direitos fundamentais definidos pelo sistema jurídico nacional e com os direitos humanos internacionalmente reconhecidos. Sempre que necessários, deverão ser estabelecidos procedimentos para a solução de conflitos que possam surgir na aplicação desse princípio".
Trata-se de um respeito à autonomia dos povos indígenas dentro de um Estado Democrático de Direito que tutela tanto o direito à vida como as noções de bem-viver pautada em valores próprios de cada povo indígena. Nesse sentido, cabe ao Estado brasileiro garantir a maximização das condições que permitam sempre a qualidade e sustentabilidade da vida indígena, além da reprodução da existência familiar e comunitária.
Questões de gênero e de relações entre gerações são importantes para todas as sociedades humanas e fazem parte da noção de dinâmica sociocultural, que está em constante processo de reflexão e reelaboração no tempo e entre diferentes grupos sociais.
No caso dos povos indígenas, o direito à diversidade étnica e ao respeito das formas próprias de organização social dos mais de 305 diferentes povos indígenas exige que o Estado respeite como cada povo indígena lida com esses assuntos, a partir de suas cosmologias e de seus modos de vida. E, especialmente quando eles são afetadas por iniciativas (como por exemplo de gestão participativa e controle social) ou políticas públicas, que para sua eficácia devem levar em conta as particularidades dos diferentes povos sobre assuntos de gênero e geracionais.
Daí, o papel da Funai é garantir a proteção aos direitos das populações indígenas para que estas mudanças culturais sejam pautadas na própria organização sociocultural de cada povo indígena e jamais como resultado das intervenções arbitrárias ou de pressão externas, sejam de invasores de terras indígenas ou outros segmentos sociais que tentam impor valores morais e sociais sobre os povos indígenas ou violar seus direitos.
Nesse sentido, é fundamental apontar as diversas experiências dos povos indígenas em relação à criação de estratégias próprias, baseadas nos costumes e cosmovisões internos a cada povo, para alterar situações de vulnerabilidade social. Observa-se que são frequentes os registros da Funai que apontam como diferentes povos indígenas desenvolvem estratégias próprias para solucionar conflitos de diferentes naturezas.
Por exemplo, quando uma criança indígena nasce em condições "não ideais", considerando as variações socioculturais, observa-se que a principal estratégia de solução indígena é a adoção do neonatal pela avó materna ou paterna ou por alguma outra família da própria etnia, sendo possível estender esta prerrogativa aos grupos indígenas relativamente próximos. No entanto, informações distorcidas são frequentemente veiculadas contra povos indígenas para justificar interferências de adoções não-indígenas e campanhas para a tentativa de dominação cultural de povos indígenas por determinados grupos sociais ou religiosos.
A Funai, no cumprimento das suas atribuições, busca garantir a proteção e a promoção de condições de igualdade de vida das crianças e povos indígenas, atuando na implementação de ações estruturantes e intersetoriais, e evitar a discriminação contra destes povos.
No caso específico do trabalho com mulheres indígenas, a Funai atua com o propósito de apoiá-las na busca de:
- Não discriminação
- Fortalecimento do papel das mulheres indígenas na promoção do bem viver, considerando a diversidade e a especificidade dos povos
- Estabelecimento de processo de escuta das mulheres indígenas pelos órgãos de governo para a qualificação de ações específicas para os povos indígenas e com participação
Atualmente, as principais ações realizadas direta e indiretamente, em contextos de parcerias, pela FUNAI, buscam fortalecer o reconhecimento das formas próprias de organização indígena. Nessa perspectiva, a FUNAI tem atuado com as questões de gênero e assuntos geracionais principalmente a partir de suas práticas com as mulheres indígenas ao longo dos últimos anos, refletindo sobre a relação que se dá entre homens e mulheres indígenas e vice e versa, entre mulheres e mulheres e entre homens e homens e entre as diferentes gerações. A atuação da Funai foca na importância do respeito às formas de organização familiares diferenciadas, a valores reprodutivos, e opções à orientação sexual conforme a realidade de cada povo.
Especialmente no campo das políticas públicas, a Funai apóia e valoriza a participação de mulheres e jovens nas instâncias de controle social, na formulação, implementação e monitoramento das políticas públicas no país. Para tanto, busca-se atender de forma qualificada a mobilização social dos povos indígenas e ações de educação comunitária em torno de discussões afetas às questões de gênero e assuntos geracionais.
Diante do desafio de incluir o recorte de gênero e geração para povos indígenas em políticas públicas, a FUNAI está elaborando um documento orientador considerando que Gênero se refere a um conjunto de atitudes, tarefas e responsabilidades associadas aos homens e às mulheres de uma determinada sociedade, assim como tudo aquilo que pode ser definido ou classificado como masculino e feminino. Gênero se refere, portanto, ao caráter social e relacional das distinções baseadas no sexo. O corpo masculino ou feminino é reinterpretado dentro de uma cultura e sociedade, a qual dá um significado e diz o que uma mulher ou um homem pode e deve fazer na sociedade a qual pertence.
As relações de gênero e as diferenças entre homens e mulheres variam consideravelmente, dependendo da cultura a que se referem. Além disto, gênero está articulado às várias dimensões da vida social e aos diferentes ciclos de vida. Assim, a participação na vida social é definida pelas categorias de gênero e idade as quais se pertence e de acordo com as sociedades em que se inserem os indivíduos.
São exemplos de ações voltadas a Assuntos de Gênero e Geracionais:
- Conscientização de atores políticos e gestores sobre a importância de respeitar e considerar os de modos de vida indígenas, as suas especificidades;
- Assembleias indígenas voltadas ao fortalecimento organizacional e político autônomo;
- Fortalecimento de práticas tradicionais dos povos indígenas para prevenção das situações de vulnerabilidades sociais, ambientais e territoriais;
- Diálogos para enfrentamento à violência e prevenção de violências contra mulheres;
- Informações e formação sobre direitos e reflexão sobre assuntos de gênero e geração;
- Oficinas preventivas com a juventude indígena sobre as situações de vulnerabilidade (álcool, drogas, violências, suicídios);
- Atividades com mulheres indígenas para promoção de direitos sociais e de cidadania e para o fortalecimento de ações de etnodesenvolvimento;
- Reuniões de fortalecimento das lideranças tradicionais;
- Atividades de informação sobre a Convenção 169 da OIT;
- Formação sobre organização e controle social dos povos indígenas.