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Com defesa da Funai, indígenas Guarani Kaiowá são inocentados por júri popular em processo envolvendo conflito no território Passo Piraju
Foto: Adi Spezia/Cimi
Indígenas Guarani Kaiowá foram inocentados por júri popular em processo que envolveu conflitos e luta pelo território tradicional Passo Piraju/Amambaipeguá III, na região de Dourados (MS). O julgamento de Walmir Júnior Savala e Sandra Arévalo Savala ocorreu entre os dias 26 e 29 de fevereiro no Tribunal do Júri da 1° Vara de São Paulo, com defesa da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Os indígenas foram inocentados após 18 anos da acusação de envolvimento na morte de dois policiais civis e tentativa de homicídio de um terceiro. (Leia abaixo mais detalhes sobre o caso)
Walmir foi acusado da tentativa de homicídio, e Sandra, de duplo homicídio e tentativa de homicídio contra policiais civis à paisana. Na decisão, os jurados entenderam que Walmir não foi o autor e nem participou do crime, e o inocentaram, contrariando a narrativa da denúncia. No caso de Sandra, os jurados a declararam inocente, não tendo participado das mortes e nem da suposta emboscada da qual foi acusada.
Em relação à acusação da tentativa de homicídio, os jurados entenderam que não houve intenção de matar, então, decidiram por uma desclassificação para lesão corporal grave. Na ocasião, a juíza que presidiu a sessão aplicou uma sentença de três anos pela lesão corporal, a ser cumprida em regime de semiliberdade na aldeia sob fiscalização da Funai. Considerando que Sandra já ficou presa por um ano, restam dois anos a cumprir.
A defesa dos indígenas foi realizada pelo procurador da Advocacia-Geral da União (AGU) Derli Fiuza e pela assessoria jurídica do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), composta por Caroline Hilgert, Michael Nolan e Guilherme Madi. A audiência foi presidida pela juíza federal Bárbara de Lima Iseppi, e a acusação foi representada pelo procurador do Ministério Público Federal Gustavo Torres, bem como pelo assistente de acusação Mauricio Rasslan.
Dezenas de indígenas Guarani Kaiowá da TI Guyraroka, do tekoha Passo Piraju e da retomada Nhu’Vera Guasu, em Dourados, acompanharam o júri presencialmente.
De acordo com o procurador da AGU Derli Souza, este foi um processo de alto grau de complexidade. “Houve ainda forte repercussão na época dos fatos, que exigiu a interposição de diversos recursos e pedidos de habeas corpus perante o Tribunal Regional Federal (TRF) da 3° região e, também, do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Após 18 anos, fez-se justiça aos indígenas que sofreram um ataque à época”, pontuou.
Entenda o caso
O episódio aconteceu em 2006 na região de Dourados (MS). Os indígenas Guarani Kaiowá Walmir Júnior Savala e Sandra Arevalo Savala foram acusados de envolvimento na morte de dois policiais civis e tentativa de homicídio de um terceiro, após confronto envolvendo a luta pelo território tradicional de Passo Piraju, sobreposto pela Fazenda Campo Belo. Em abril daquele ano, três policiais à paisana invadiram a área em um veículo descaracterizado e atiraram contra a comunidade.
Segundo os indígenas, eles abordaram o carro e, neste momento, uma arma calibre 12 de um dos policiais disparou, atingindo acidentalmente uma das vítimas fatais. O confronto se iniciou e resultou na morte dos policiais Rodrigo Pereira Lorenzato e Ronilson Magalhães. Um terceiro, Emerson José Gadani, se feriu. Na sequência, cerca de 20 policiais chegaram ao local, invadindo as casas e ameaçando matar os indígenas. A versão da polícia na época, não acatada pelo júri, é de que eles teriam sido alvos de uma emboscada.
Reconhecido procurador federal faz último júri após 38 anos
Após 38 anos de atuação na defesa criminal de indígenas, o procurador federal Derli Cardoso Fiúza participou de seu último júri na defesa dos Guarani Kaiowá. Amplamente reconhecido, atuou pela Procuradoria Federal Especializada da Funai em centenas de júris defendendo comunidades indígenas em todo o Brasil.
Em 2006, Fiúza foi homenageado por indígenas Kaingang de Nonoai (RS) e deu nome à Casa de Cultura local. Na época, o cacique José Lopes justificou a homenagem enaltecendo o trabalho que o procurador desenvolveu para que a comunidade indígena pudesse viver em um território totalmente regularizado.
No despacho da 1ª Vara Federal Criminal, do Júri e das Execuções Penais de São Paulo, a juíza federal Bárbara de Lima Iseppi formalizou uma homenagem ao procurador federal, reconhecendo sua trajetória em prol de causas indígenas. Segue o apontamento da magistrada:
“Considerando que, ao final dos trabalhos da sessão plenária do Tribunal do Júri da 1ª Vara Federal de São Paulo/SP, tomou-se conhecimento acerca da atuação profissional do Procurador Federal Dr. DERLI FIUZA, o qual já participou de mais de 150 júris ao longo de 38 anos de carreira, e que a sessão realizada em 28/02/2024 foi a última antes de sua aposentadoria, bem como levando-se em conta a demonstração do brilhantismo de sua competente atuação, que levou inclusive este Juízo a muito aprender durante o julgamento, OFICIE-SE à Procuradoria Geral da União e à Presidente da FUNAI para que façam constar dos registros funcionais do Procurado Federal Doutor DERLI FIUZA as homenagens por todos prestada.”
Assessoria de Comunicação/Funai