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Volta da Funai: STF derruba marco temporal em defesa dos povos indígenas
Foto: Lohana Chaves/Funai
O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que derrubou a tese jurídica do marco temporal para a demarcação de terras indígenas consolida a volta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), tendo em vista que o resultado atendeu a um pedido do órgão indigenista. A afirmação é da presidenta da instituição, Joenia Wapichana, um dia após a decisão da Corte.
“A Funai voltou! Voltou para estar ao lado dos povos indígenas, para cumprir sua missão institucional de defender os direitos territoriais dos povos indígenas. A decisão da maioria do STF em não aceitar o marco temporal foi o resultado do pedido da Funai, por meio de recurso proposto juntamente com a União e fortemente defendido pelos povos indígenas e suas instituições representativas, bem como defensores de direitos humanos em Amicus Curiae”, enfatizou.
“Foi o resultado da união de esforços, reafirmando que a Funai voltou a atuar, a defender e a se manifestar. Estamos cumprindo nosso papel em busca da justiça e dignidade para os povos indígenas”, completou Joenia.
O procurador-chefe da Procuradoria Federal Especializada (PFE) junto à Funai, Matheus Antunes Oliveira, contextualiza que o STF deu provimento ao recurso extraordinário interposto pela Funai contra uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que havia condenado a Funai e a comunidade indígena a se retirarem de uma área que estava sobreposta a uma Unidade de Conservação Estadual em Santa Catarina. Ao fazer isso, o Tribunal também afastou a tese do marco temporal, garantindo a posse plena dos indígenas sobre essa área específica.
“O julgamento de ontem foi muito importante, pois o recurso teve origem na Funai, foi provido e também implicou na manifestação do STF contrária ao marco temporal. No entanto, é importante observar que o julgamento continuará nos próximos dias, quando os ministros irão debater as teses que serão propostas, incluindo aquelas que abordarão questões indígenas de forma mais geral”, ressaltou.
O recurso interposto pela Funai considerou, por exemplo, que a Constituição Federal de 1988 acolheu a teoria do indigenato, uma vez que foram reconhecidos os direitos originários dos indígenas sobre as terras que ocupavam, não dependendo de título ou reconhecimento formal. Outro ponto é que o título de domínio incidente sobre terras indígenas é nulo, sendo o direito às terras tradicionalmente ocupadas pela comunidade indígena imprescritível, e tais terras são inalienáveis e indisponíveis, não sendo cabível o entendimento segundo o qual aos direitos ou o usufruto das terras necessitem da demarcação administrativa da área. “[…] A Funai entende que deve prevalecer o direito fundamental à vida, à saúde, à segurança e à terra tradicionalmente habitada pela comunidade indígena”, informa ainda o recurso. Clique aqui para conferir o recurso da Funai na íntegra.
A procuradora federal Carolina Augusta de Mendonça Rodrigues Santos pontua que a decisão do STF servirá de parâmetro para outras análises. “Esse caso concreto, que envolve a Terra Indígena Ibirama-Laklano do povo Xokleng, servirá de paradigma para o julgamento da Repercussão Geral Tema 1031, que visa discutir o estatuto jurídico constitucional da posse indígena. Por 9 votos a 2, o STF decidiu dar provimento ao recurso da Funai e afastar a teoria do marco temporal no caso concreto para reconhecer a tradicionalidade da TI Ibirama Laklano.”
A tese do marco temporal afirmava que os povos indígenas apenas possuíam direito às terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da CF, em 5 de outubro de 1988. Assim, os povos originários só poderiam reivindicar a posse de áreas que ocupavam até essa data.
A Funai vinha denunciando, ao longo dos últimos meses, que a tese do marco temporal ignorava o longo histórico de esbulho possessório e violência praticada contra os povos indígenas, acarretando a expulsão de seus territórios, além de violar os direitos indígenas previstos na própria Constituição Federal (CF) e em tratados internacionais dos quais o Estado brasileiro é signatário.
Votaram contra o marco temporal o relator do caso, ministro Luiz Edson Fachin, e os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber. Foram favoráveis os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça.
Assessoria de Comunicação / Funai