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PROTAGONISMO
Indígena se dedica à confecção de bonecas e transforma sonho da infância em geração de renda
A costureira indígena Luakam Anambé conquistou autonomia por meio da confecção de bonecas. Foto: Divulgação.
Anambé, Kayapó, Kamayurá e Krahô: imagine ver sua etnia representada em forma de boneca, esse símbolo tão forte da infância. Este é o trabalho de Luakam Anambé, nascida em Viseu, estado do Pará. A vida da indígena deu uma guinada no final de 2019, quando sua neta gravou um vídeo contando sua história, que viralizou na internet.
A partir de então, as vendas das bonecas confeccionadas por Luakam aumentaram consideravelmente e passaram a ser feitas em canais digitais. Ela, que tinha decidido ser costureira após ver uma programa na televisão, agora é uma inspiração para outras mulheres.
A costureira patenteou suas bonecas, trouxe uma equipe de mais 4 pessoas de seu estado e criou o projeto “Mãos de fadas”, para ajudar mulheres paraenses que passam dificuldades a terem um ofício. “Esse projeto é voltado para mães solo e meninas em situação de risco. O que eu vivi me marcou como uma cicatriz. Toda vez que eu bato, dói. Isso fica pro resto da vida. É por isso que eu estou criando esse projeto. Porque a gente trabalhando, conversando com outras pessoas, vai saindo dessa”, conta. Confira mais detalhes no vídeo abaixo:
História
Luakam tinha 14 irmãos e passou parte de sua infância em Viseu (PA). Com toda a dificuldade enfrentada por seus pais para sobreviver, ela e as irmãs precisaram trabalhar fora desde cedo. Na casa dos patrões, teve início uma jornada de privação e violência, incluindo a violência sexual.
Ainda criança, a indígena acompanhou sua patroa a uma festa, onde se apaixonou por uma boneca. “Naquele momento foi que começou a minha trajetória até hoje. Foi ali que eu disse que quando eu crescesse ia arranjar condições de comprar uma boneca só pra mim.”
Aos 19 anos, com dois filhos e já separada do primeiro casamento - no qual também sofreu violência doméstica - , Luakam teve acesso, pela primeira vez, à televisão, ao assistir a um programa de costura. “Eu achava muito bonito quando via alguém com uma profissão. Foi vendo esse programa que nasceu a minha vontade de aprender a costurar.”
Luakam, que até então trabalhava como empregada doméstica, começou a ter acesso à costura por meio de sua curiosidade, comprando tecidos e fazendo roupinhas cortadas e costuradas a mão para sua filha. Tinha muita vontade de fazer um curso, porém não tinha oportunidade. “Mas a boneca, a todo tempo, eu não esqueci. Um dia eu vou aprender a fazer essa boneca”, pensava Luakam.
Seus filhos cresceram e, depois do casamento do mais velho, a indígena Anembé foi embora sozinha para o Rio de Janeiro, na boleia de um caminhão. “Eu via muitas mulheres passando pelo que eu passei. Sofrendo violência doméstica, sem expectativa de vida. Eu vou sair daqui e eu vou atrás de um objetivo. E no dia em que eu conseguir, eu vou voltar para Viseu e montar algo para vir trabalhar com essas mulheres”, afirmou.
Chegando à cidade, Luakam dormiu na rua até conseguir abrigo na casa de uma amiga, e se deparou com uma cultura totalmente diferente da sua. Em poucos dias, conseguiu trabalho numa fábrica de biquínis, onde aperfeiçoou sua costura e sofreu bastante preconceito. “Até essa época, eu ouvia muito falar em preconceito sofrido pelo indígena, mas eu não sabia diretamente o que era aquilo. Foi naquele momento que eu descobri.”
Com seu primeiro salário, Luakam comprou uma passagem e trouxe sua filha para perto dela. Após muitas dificuldades, juntou dinheiro e saiu da fábrica. Com o dinheiro que juntou, comprou sua primeira máquina de costura. Nesse período, sua filha engravidou e ela tornou-se avó. Com o nascimento de sua neta, renasceu o sonho de infância da boneca. Luakam começou a produzir bonecas indígenas e vender em feiras, e se mudou para um lugar maior.
“O que eu passei não quero para minha filha nem para minha neta. Nunca desistam, sempre persistam. A gente tem que lutar pelos nossos objetivos porque se eu cheguei onde eu cheguei foi com muita persistência. Se eu consegui, vocês também vão conseguir”, garante.
Assessoria de Comunicação/Funai