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Homenagem ao Dia do Servidor traz entrevista com Marcelo Torres, coordenador de Políticas para Povos Indígenas de Recente Contato da Funai
Marcelo Torres durante atividade de apoio a saúde dos indígenas de recente contato Xinane Yora, Acre, 2017 (foto: acervo pessoal)
A série especial em homenagem ao Dia do Servidor Público, comemorado nesta quarta-feira (28), traz, na última entrevista, o coordenador de Políticas para Povos Indígenas de Recente Contato da Fundação Nacional do Índio (Funai), Marcelo Torres. Na fundação desde 2010, ele atuou por sete anos na Frente de Proteção Etnoambiental Envira (AC), o que proporcionou uma experiência direta com as políticas públicas na área. Marcelo possui bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Acre (UFAC) e em Administração com habilitação em Comércio Exterior pela Faculdade Integrada do Oeste de Minas (FADOM).
Pergunta: O que significa, para você, trabalhar com a política indigenista?
Resposta: Acredito que o trabalho indigenista represente, antes de tudo, um grande desafio para cada um dos servidores da instituição, dada a complexidade e especificidade dos temas relacionados ao indigenismo com os quais nos deparamos rotineiramente no exercício de nossas atividades. No que diz respeito ao trabalho com os povos indígenas isolados e de recente contato, esses desafios me parecem ser ainda maiores, exigindo de nós, indigenistas, uma entrega e abnegação tremenda para que possamos conseguir assegurar a proteção física e cultural desses povos, além de promover e garantir o acesso deles a todos os seus direitos.
Pergunta: Qual é a importância da Funai para a garantia dos direitos indígenas e da autonomia dos povos tradicionais?
Resposta: Como órgão indigenista oficial e principal executor da política indigenista do governo federal, mesmo enfrentando inúmeras dificuldades (orçamentárias, de recursos humanos, etc.), a Funai é uma instituição de grande importância não só para os povos indígenas, mas para a sociedade de forma geral. É necessário que todos os brasileiros possam ser conscientes e gratos aos povos indígenas por toda sua história de luta e às inúmeras contribuições culturais para nossa sociedade.
Enquanto indigenista, minha luta diária é para que a Funai possa se fortalecer cada vez mais enquanto instituição e que consiga garantir a proteção e promoção dos direitos indígenas. Para que esta instituição possa fazer com que sejam respeitados todos os direitos dos povos indígenas, como o reconhecimento de sua organização social, seus costumes, línguas, crenças e tradições, o respeito às suas organizações, o direito sobre seus territórios, a proteção e a conservação do meio ambiente nas Terras Indígenas. Especificamente em relação aos povos indígenas isolados, garantir o exercício de sua autodeterminação e liberdade de suas atividades tradicionais sem a obrigatoriedade de serem contatados.
Pergunta: Qual projeto ou ação da Funai que foi mais marcante para você?
Resposta: Seria muito difícil e até injusto escolher apenas uma ação, até porque considero de grande importância cada atividade que desenvolvi pela instituição em prol dos povos indígenas com os quais trabalhei ao longo dos últimos dez anos. Cada atividade, à sua maneira, proporcionou um aprendizado específico, um novo desafio. Muitas vezes, com vários riscos durante a sua própria execução. Por isso, acredito que as dificuldades do trabalho em campo tenham ajudado a moldar a experiência que acumulei enquanto indigenista. Por esta razão, tomo a liberdade de listar não ações, mas alguns momentos que vivenciei dentro da instituição e que me parecem desafiadores por si só, dos quais relato abaixo de forma resumida:
• a chegada ao Acre e a primeira atividade na base Xinane, alto rio Envira, foram situações diferentes, mas muito importantes. Do período da chegada, até as boas lembranças e a honra pela oportunidade de sermos recebidos pelo sertanista Antônio Luiz Batista de Macedo, ou simplesmente o “Txai Macedo”. Foi ele quem nos guiou nas visitas com as instituições parceiras na execução do trabalho da Funai no estado do Acre. Foi quem plantou a semente do indigenismo em nós. Da primeira viagem ao Xinane, as lembranças dos tempos de “arigó”, com pouquíssima experiência e habilidade diante da primeira atividade e da dura realidade do trabalho de campo nas frentes de proteção, dos deslocamentos penosos e desafiadores.
• as viagens de monitoramento e localização de índios isolados por todo o Acre também têm lugar especial nas minhas memórias enquanto indigenista. Os longos percursos por rio, as agruras com as penosas caminhadas também merecem destaque, seja pela dificuldade seja pela experiência proporcionada. Nesse sentido, as viagens aos rios Muru e Humaitá (2012), Tarauacá (2013, 2015 e 2016), Envira e Acre (2014), Chandless e Jordão (2017) são especiais.
• por fim, a experiência de estar presente diante do contato com um grupo de índios isolados no alto Envira em 2014. Foi um episódio muito complexo e intenso, que ilustra bem as dificuldades dos trabalhos nas Frentes de Proteção Etnoambiental e a importância do Estado como garantidor aos povos indígenas isolados o exercício de sua autodeterminação, liberdade e de suas atividades tradicionais sem que exista a obrigatoriedade do contato.
Pergunta: Qual mensagem você deixaria para os servidores da Funai neste Dia do Servidor?
Resposta: Que possamos continuar firmes na defesa dos direitos dos povos indígenas, que a Funai possa se fortalecer cada vez mais para proporcionar a todos nós indigenistas as condições necessárias para realizar nossa missão institucional. Por mais que nossa atuação não seja tão reconhecida em diversas ocasiões, me considero um privilegiado por poder trabalhar rotineiramente com os povos indígenas e por eles sou motivado e me esforço cada vez mais para ser um melhor indigenista e um melhor cidadão.
Assessoria de Comunicação / Funai