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Projeto empreendedor de mulheres Xikrin alcança reconhecimento internacional
Tradicionalmente, as comunidades Xikrin usufruem dos múltiplos benefícios provenientes do óleo de babaçu graças ao trabalho e esforço das menire (mulheres, na língua Mebengokré). Na Terra Indígena (TI) Trincheira-Bacajá, no Pará, as visionárias Xikrin fizeram do saber ancestral uma oportunidade de autonomia, etnodesenvolvimento e compartilhamento desse tesouro natural.
Após conquistarem o apoio da Funai e de instituições parceiras, as mulheres da TI têm conseguido o fortalecimento concreto da cadeia produtiva de óleo de babaçu por meio do Projeto Menire há alguns anos. Em 2013, desenvolveram as primeiras atividades a partir do Projeto Gestão Ambiental e Territorial Indígena - GATI, uma realização da Funai e outras instituições públicas. Em 2014, quando visitaram uma miniusina da comunidade ribeirinha do Rio Novo, conhecerem de perto o método de produção de óleos dos produtos coletados na floresta, maneiras de quebra de coco e processamento da farinha do coco babaçu. A partir de então, as Xikrin desenharam o próprio plano de geração de renda por meio da utilização de máquinas extratoras adquiridas nos anos posteriores.
A construção da própria miniusina deslanchou a extração do óleo que, além do usufruto da própria comunidade em festas, rituais, na alimentação, nas pinturas (misturado ao urucum) e no corpo, é comercializado para os não-indígenas, gerando renda às famílias Xikrin e possibilitando o consumo de um produto sustentável pela sociedade envolvente.
A iniciativa gerou reconhecimento internacional. Após a participação no prêmio Saberes e Sabores,
2018, o empreendimento das menire recebeu menção honrosa da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) que visou à valorização das atividades de empoderamento e autonomia das mulheres no mundo rural e à visibilização da importância que têm em promover uma alimentação tradicional e saudável.
Orgulhosa do trabalho de sua comunidade, Kokoté Xikrin, uma das menire à frente da operação da miniusina, menciona a contribuição que a venda do óleo pelos indígenas trouxe aos moradores da cidade no que diz respeito ao resgate dos hábitos alimentares tradicionais: "O óleo de babaçu nunca deixou de ser utilizado pelos Xikrin. Por outro lado, seu consumo está sendo resgatado pelas famílias que moravam na beira do rio e usavam o óleo tradicionalmente, mas que, quando se mudaram para a cidade, adotaram o óleo de soja. Muitas destas famílias voltaram a ser consumidoras do babaçu com nosso óleo."
As contribuições da atividade, no entanto, ultrapassam os benefícios alimentares. Além de ser totalmente sustentável por requerer apenas a coleta da natureza sem danificar a vegetação nativa, o solo e as águas, a cadeia produtiva do babaçu na TI Trincheira/Bacajá tem suprido a necessidade do óleo pelas comunidades Xikrins das outras terras indígenas, conquistado consumidores em feiras de sociobiodiversidade e chamado a atenção de fabricantes. Em 2018, as menire conseguiram seu primeiro contrato com uma fábrica de sabonete artesanal.
Desafios à continuidade do projeto
Atualmente a gestão do projeto é feita pelos indígenas por meio da Associação Instituto Bepotire Xikrin (Ibkrin) e da Associação Bebô Xikrin do Bacajá (Abex). De acordo com Kroire Xikrin, presidente da Abex, são extraídos 100 a 150 litros por mês. A venda pode alcançar até 60 litros comercializados em embalagens de 500 ml vendidas a 30 reais cada.
Os números poderiam ser maiores, mas os entraves logísticos têm desafiado a expansão da atividade. "O transporte do coco é uma das maiores dificuldades. O preço do combustível é alto e isso atrapalha bastante", conta Kroire. A grande distância até a aldeia Potikrô, onde fica a usina, torna inviável a extração de óleo pelas mulheres de outras aldeias.
As mulheres Xikrin planejam contemplar as outras comunidades da TI Trincheira/Bacajá com a extração de óleo a partir da compra de uma máquina extratora para a aldeia Bacajá e de atividades de capacitação. Com o acompanhamento da Funai e outros parceiros, as menire pleiteiam o apoio da Norte Energia, que já declarou assumir a demanda dentro do leque de projetos financiados pela empresa como contrapartida da construção da Usina de Belo Monte.
Certas da imensurável contribuição da atividade extrativista que gerenciam, as incansáveis Xikrin seguem na luta pelo crescimento e fortalecimento da cadeia produtiva do babaçu, exemplo de sustentabilidade e desenvolvimento rumo a um modo de vida saudável e harmonioso que, se valorizado, pode ser acessível a todos os brasileiros.
Clique e baixe o livro de autoria das Xikrin após os primeiros resultados do Projeto Menire.
Kézia Abiorana
Assessoria de Comunicação/Funai
Contribuição: Coordenação Regional Centro-Leste do Pará e Coordenação-Geral de Licenciamento Ambiental