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Funai aprova e publica relatórios de identificação e delimitação de terras indígenas em São Paulo
Foram publicados, hoje (24), no Diário Oficial da União, os Despachos nº 86, 87 e 88, de 19 de agosto de 2016, em que o presidente substituto da Funai, Artur Nobre Mendes, aprova as conclusões e reconhece os estudos de identificação e delimitação das Terras Indígenas Djaiko-Aty, Amba Porã e Ka'aguy Mirim, localizadas nos municípios de Miracatu e Pedro Toledo, estado de São Paulo.
Os estudos compõem elementos objetivos de natureza etnohistórica, antropológica, documental, ambiental, cartográfica e fundiária, que identificam e delimitam as terras de ocupação tradicional dos povos indígenas Guarani-Nhandeva, Guarani-Mbya, Tupi e Tupi-Guarani da região do Vale do Ribeira, conforme preconiza a Constituição Federal.
De acordo com os dados dos Relatórios Circunstanciados de Identificação e Delimitação (RCIDs) aprovados, os Guarani Mbya, Nhandéva (incluindo os Tupi e Tupi Guarani) e Kaiowa contemporâneos totalizam hoje mais de 180.000 indivíduos na América do Sul. No Brasil, totalizam aproximadamente 60.000, sendo que, nas regiões Sul e Sudeste, onde se inserem as Terras Indígenas Djaiko-Aty, Amba Porã e Ka'aguy Mirim, a população Guarani gira em torno de 13.000 pessoas.
Os territórios tradicionalmente ocupados por esses povos se estendem, portanto, numa ampla região que engloba áreas no Uruguai, Argentina, Paraguai, Bolívia e Brasil, onde estão presentes nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul.
A Terra Indígena Djaiko-Aty foi identificada com superfície aproximada de 1.216 hectares e perímetro aproximado de 24 quilômetros, sendo fundamental à reprodução física e cultural dos povos indígenas Guarani-Nhanedeva, Guarani-Mbyá, Tupi e Tupi-Guarani da região do Vale do Ribeira, na sub-bacia do rio São Lourecinho.
As Terras Indígenas Amba Porã e Ka'aguy Mirim foram identificadas com superfície aproximada de 7.204 e 1.190 hectares, respectivamente, correspondendo às áreas de ocupação tradicional do povo indígena Guarani-Mbya.
Ocupação e esbulho
Os estudos detalham a complexa história de ocupação Guarani e Tupi em toda a região do Vale do Ribeira, reconstruída a partir da sistematização de fontes escritas e arqueológicas e por meio da memória oral tanto dos Guarani e Tupi como de moradores não indígenas mais antigos.
Nesse contexto, os relatórios publicados apontam que, até o ano de 1961, quando inaugurada a Rodovia Regis Bittencourt, principal meio de acesso à região, as matas do Vale do Ribeira permaneceram pouco exploradas pela colonização, o que permitiu aos indígenas uma ocupação relativamente autônoma.
Contudo, remontam também a violentos processos de esbulho territorial que perpassaram todo o século XIX, com episódios de confronto direto entre colonos e indígenas e, ainda, às tentativas de remoção forçada e concentração dessas populações dispersas pelo Vale do Ribeira em locais únicos, com a criação de aldeamentos.
Faz parte das conclusões dos estudos a importância do conceito nativo de tekoha ( lugar onde se é , segundo seu próprio modo de vida), "que exprime a indissociabilidade entre o ser e o lugar, as condições ambientais e a reprodução cultural do grupo". Dessa forma, segundo os indígenas das Terras Indígenas Djaiko-Aty, Amba Porã e Ka'aguy Mirim, o tekoha é, "dentre outras coisas, um espaço com áreas suficientes para o plantio e para o manejo das espécies fundamentais para a atualização dos ciclos rituais, entre elas o milho, a erva mate, o fumo, o guembe (costela de adão) e o jety etei (batata doce tradicional)".
A resistência dos indígenas às remoções forçadas e a situação de renitente e violento esbulho territorial a que estão sujeitos ainda hoje está caracterizada nos relatórios, que concluem que a regularização dos limites identificados é imprescindível à manutenção das condições ambientais necessárias à reprodução física e cultural das atuais e futuras gerações indígenas do Vale do Ribeira, de acordo com seus usos, costumes e tradições.
Regularização fundiária
O direito dos povos indígenas às suas terras de ocupação tradicional está previsto no artigo 231 da Constituição Federal, que o configura como um direito originário que garante a reprodução física e cultural dos mais de 300 povos indígenas que habitam, hoje, o Brasil. Consequentemente, o procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas se reveste de natureza meramente declaratória, ou seja, a terra indígena não é criada por ato constitutivo, e sim reconhecida a partir de requisitos técnicos e legais.
O processo de demarcação é regido pelo Decreto 1775/96, e corresponde ao meio administrativo pelo qual são identificados e sinalizados os limites dos territórios tradicionalmente ocupados pelos povos indígenas.
Após a fase de elaboração, avaliação, aprovação e publicação das conclusões dos estudos que compõem o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação de Terras Indígenas, o procedimento seguirá para as seguintes fases: contraditório administrativo; declaração dos limites, a cargo do Ministro da Justiça; demarcação física, a cargo da Funai; levantamento fundiário de avaliação de benfeitorias; homologação da demarcação, a cargo da Presidência da República; retirada de ocupantes não-índios, com pagamento de benfeitorias consideradas de boa fé, a cargo da Funai, e reassentamento dos ocupantes não índios que atendem ao perfil da reforma agrária, a cargo do Incra; e registro das terras indígenas na Secretaria de Patrimônio da União, a cargo da Funai.
Texto: Mônica Carneiro/ASCOM Funai