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Comunidade Amarelão tem um violonista erudito
Na Comunidade Indígena Amarelão, no Rio Grande do Norte, o Projeto Musical Irmã Therezinha Galles inicia, desde 2004, crianças e adolescentes no estudo de flauta e violão. Foi nesse projeto que o jovem potiguara Fernando Batista conheceu a musicalidade, não da viola catequista, mas da música erudita, e hoje (12/06) apresenta o seu recital de graduação como um violonista na Escola de Música da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
A viola foi um instrumento utilizado para catequização dos indígenas pela Companhia de Jesus, em 1549. O som da viola, segundo alguns autores, teria despertado um encantamento facilitando a conversão ao cristianismo. Em 1929, em Paris, Heitor Villa-Lobos apresentou a primeira execução pública de seu poema sinfônico Amazonas, após 59 anos do grande sucesso na Europa da ópera O Guarani de Antônio Carlos Gomes, os dois grandes músicos procuravam representar o universo indígena brasileiro para as plateias europeias.
Veja abaixo a integra da entrevista com o violonista Potiguara Fernando Batista:
Como te iniciastes na música?
FB - Comecei a estudar flauta doce e violão em 2004 sem muitas pretensões no momento, porém, com o meu desenvolvimento musical, vi na música uma oportunidade de vencer na vida e de um dia poder retribuir de volta todo o conhecimento que me foi repassado de forma gratuita.
Como foi a tua vida acadêmica?
FB- Ingressei na graduação em 2011, participei de grandes festivais violonísticos de cunho nacional e internacional como o VIII FENAVIPI(Festival Nacional de Violão do Piauí); IV Festival Internacional de Violão Leo Brouwer (São Paulo/SP); VI Festival de Violão da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e ainda de todas as edições da Mostra de Violão da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Fiz masterclasses com renomados violonistas como: Paulo Martelli, Eduardo Meirinhos, Mário Ulloa, Jorge Caballero, Pablo Cohen, Thomas Patterson, Jaime Velasco, Nadja Borislova, Francisco Gil, Thierry Bégin-Lamontagne, Daniel Göritz entre outros.
Estou me graduando em Música com Habilitação em Violão Erudito, sou professor do curso de extensão da Escola de Música da UFRN e professor voluntário do Projeto Musical Irmã Therezinha Galles, desenvolvido em minha comunidade.
Qual a tua pretensão como músico?
FB- Pretendo seguir como violonista concertista e continuar na vida acadêmica fazendo pós-graduação. A qualificação profissional é muito importante para mim, pois mostro para outros jovens da comunidade que é possível que nós Mendonças, como somos conhecidos, podemos cursar uma faculdade.
Fazes ou pretendes fazer pesquisa sobre a música do teu povo?
FB- Não faço, mas me interesso muito pelo assunto para futuramente desenvolver um trabalho nesse campo.
Qual a origem do grupo familiar Mendonça do Amarelão?
FB - O grupo familiar Mendonça se constituiu a partir de antecessores indígenas pertencentes a etnia Potiguara de Brejo de Bananeiras, na Paraíba e se deslocou para o Rio Grande do Norte no inicio do século XIX por meio de migrações do estado da Paraíba há mais de dois séculos ocasionadas por situações de crise como epidemias de cólera, as secas, expansão colonial, etc., segundo a historia oral da comunidade.
Como se deu a origem do nome da comunidade?
FB - O nome "Amarelão" se deu de um antigo ritual que os Mendonça praticavam. Eles subiam a Serra do Torreão (serra próxima da comunidade) por volta das 3 horas da manhã e lá em cima aguardavam a chegada do sol e, quando esse aparecia, desciam a serra cantando e dançando, pois tinham ido buscar o "Amarelão" e isso traria sorte para a aldeia.
Onde estão os Mendonça hoje?
FB - Os Mendonça, embora ocupem espaços diferentes, ampliam as redes de parentesco, incluindo novos valores culturais sem no entanto, perderem os laços de afinidade junto à família extensa, tornando fortemente consolidado o sentimento de pertença à terra de origem – o "Amarelão" com aproximadamente 220 famílias. Esse grupo familiar se expandiu para outras localidades a exemplo do "Assentamento Santa Terezinha" – AST" com cerca de 126 famílias, resultado de uma luta conjunta com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terras/ MST, na década de 1990, bem como outros povoados do município de João Câmara, entre os quais, estão "Serrote de São Bento" a dois quilômetros do "Amarelão", com aproximadamente 60 famílias, "Cachoeira" ou "Nova Descoberta", e até em Natal, mais precisamente na "Cidade-Praia" ou "Amarelão Novo", que pertence à Zona Norte, distante mais de oitenta quilômetros do lugar de origem no campo.
Recebestes em algum momento apoio da FUNAI?
FB - Sim. Quando precisei atestar/comprovar minha identidade indígena junto ao Ministério da Educação, pleiteando a bolsa permanência, contatei a FUNAI e fui atendido de forma rápida pelo Coordenador Martinho Andrade.