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Projeto Ibaorebu, uma experiência de afirmação da identidade e autonomia do Povo Munduruku
Texto e fotos: Izabel Gobbi. Colaboração: André Ramos
Realizado por meio de etapas intensivas ou "tempo escola" (aulas presenciais) e etapas de acompanhamento ou "tempo aldeia" (momento de orientação às pesquisas desenvolvidas pelos alunos), o Ibaorebu tem se constituído como um espaço privilegiado de exercício da autonomia e do protagonismo do Povo Munduruku.
Como o próprio nome sugere, trata-se de um espaço de criação, construção e valorização de conhecimentos que não se esgotam no processo de escolarização e/ou profissionalização, mas tem caráter contínuo, voltado para a formação integral que dialoga com o significado de ser homem e de ser mulher Munduruku.
O Projeto Ibaorebu de Formação Integral Munduruku executado pela FUNAI, possui 210 cursistas, divididos em duas turmas de Magistério Intercultural, uma turma de Técnico em Enfermagem e uma de Técnico em Agroecologia, sendo que a maioria dos cursistas atua, há anos, como professores e Agentes Indígenas de Saúde em suas aldeias. Trata-se, sobretudo, de um Projeto construído com e para os Munduruku, configurando-se como um ótimo exemplo de educação escolar indígena específica, diferenciada e de qualidade.
O Projeto é realizado com o apoio técnico e financeiro da Coordenação Geral de Promoção da Cidadania – CGPC e Coordenação Regional Tapajós e vem avançando para consolidar parcerias que envolvem outras Coordenações finalísticas da FUNAI (CGETNO, CGGAM, CGMT, CGPDS), além da parceria com o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará – IFPA, notadamente o Campus Rural de Marabá e o Campus de Itaituba.
IX Etapa Intensiva do Projeto Ibaorebu
A IX Etapa Intensiva do Projeto Ibaorebu foi realizada entre os dias 12 de maio e 01 de junho, na Aldeia Sai-Cinza, localizada na região do Alto Tapajós - PA. Como de costume, a comunidade de Sai-Cinza, representada pelos Caciques Vicente Saw e Nezinho Saw, acolheu os integrantes do Ibaorebu e prestigiou os seminários de apresentação dos trabalhos elaborados durante a etapa.
Técnico em Agroecologia
Na IX Etapa Intensiva, a turma de Técnico em Agroecologia realizou trabalhos sobre etnohistória e território, saídas de campo para coletar copaíba, mel e buriti, bem como teve a oportunidade de produzir um excelente vídeo sobre o uso de agrotóxicos nas lavouras e a importância da valorização da agricultura tradicional, que poderá ser utilizado como material didático e informativo nas escolas e comunidades Munduruku
Técnico em Enfermagem
A turma de Técnico em Enfermagem teve aulas sobre feridas e curativos, qualidade de vida dos idosos e noções sobre o funcionamento de um centro cirúrgico, bem como retomou os trabalhos de plantio de plantas medicinais. No Ibaorebu, as diferentes noções presentes na formação técnica em enfermagem dialogam com as práticas e conhecimentos próprios aos Munduruku.
Magistério Intercultural
As turmas de Magistério Intercultural tiveram aulas sobre saúde bucal, prevenção e valorização da alimentação tradicional, gerando a produção de vídeos que poderão ser utilizados como material didático nas escolas, privilegiando a desejada integração entre educação e saúde.
Além disso, as turmas de Magistério tiveram aulas de bioquímica, quando desenvolveram trabalhos sobre os nutrientes que compõem a alimentação tradicional; aulas de física, gerando belos trabalhos sobre os processos físicos envolvidos na produção da farinha; e de fundamentos da educação escolar indígena, quando puderam refletir sobre a legislação e sobre a educação Munduruku.
Durante as aulas de Antropologia da Educação, cujo tema central foi "A escola que temos e a escola que queremos", as turmas de Magistério Intercultural realizaram um diagnóstico da educação escolar oferecida ao Povo Munduruku e elaboraram duas propostas de Projetos Políticos Pedagógicos Diferenciados - PPPD, que deverão auxiliar no processo de discussão e construção dos PPPDs das escolas de suas comunidades, já que nenhuma delas possui esse importante instrumento de defesa do direito à uma educação escolar indígena específica, diferenciada e de qualidade.
O Ibaorebu e a defesa dos direitos indígenas
No dia 21 de maio de 2014, uma comissão composta por alunos e alunas do Ibaorebu, lideranças, caciques e guerreiros participou de audiência pública com o Ministério Público Federal de Santarém, realizada na Aldeia Praia do Mangue, Município de Itaituba. O que motivou a realização da audiência pública foi a recente demissão de setenta professores Munduruku que atuam na região do Alto Tapajós, sendo a maioria profissionais com significativa experiência e conhecimentos que precisam ser valorizados e respeitados.
Na ocasião foi apresentada uma das propostas de Projeto Político Pedagógico Diferenciado – PPPD, iniciativa que foi muito valorizada pelo Procurador, que enfatizou a importância do PPP na defesa da educação escolar que o Povo Munduruku deseja.
Como desdobramento da audiência pública foi realizada reunião em Brasília, nos dias 27 e 28 de maio, com a presença de representantes do MPF, MEC, FUNAI, Secretaria Geral da Presidência e Prefeitura do Município de Jacareacanga - PA, a fim de buscar soluções para a situação dos professores Munduruku, além de outras questões referentes à educação escolar ofertada ao Povo Munduruku. Esses dois momentos são frutos da mobilização dos cursistas do Ibaorebu na defesa do seus direitos.
O Ibaorebu e a voz dos Munduruku
"A escola deve ajudar a entender o mundo ao nosso redor e, ao mesmo tempo, fortalecer a nossa própria cultura" (Professor Jairo Saw).
"Eu estudei na escola de branco e não aprendi. Lá fora, você não aprende o que aprende aqui" (Ivanilda Karo, cursista de Agroecologia)
"Pelo o que entendi, o PPP que nós estamos estudando aqui é fundamental. É muito importante aprender, estudar e saber defender nossos direitos" (Patrício Bõrõ, cursista de Magistério Intercutural)
"A gente respeita muito o Ibaorebu, porque aqui a gente aprende de acordo com a nossa cultura" (Maria Leusa Kabá, cursista de Magistério Intercultural)
"Quem está no poder tem medo do conhecimento, porque na medida que a gente aprende, na medida que a gente tem conhecimento, a gente tem liberdade" (Professor Ademir Kabá)
"Nós não somos perfeitos, apenas lutamos pelos nossos direitos e pelos nossos objetivos" (Manoel Poxo, cursista de técnico em enfermagem)