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Debate sobre a Convenção 169 da OIT reúne representantes governamentais, indígenas e quilombolas durante a Rio+20
Com o objetivo de garantir ampla participação social na implementação de políticas públicas e processos administrativos que afetem populações indígenas, quilombolas e tradicionais, o governo brasileiro iniciou, este ano, um diálogo no sentido de construir diretrizes que regulamentem no país a aplicação da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Dessa forma, foi instituído, em janeiro de 2012, um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) coordenado pela Secretaria Geral da Presidência da República e Ministério das Relações Exteriores e integrado por outros 22 ministérios e autarquias, dentre elas a Funai.
A Convenção 169 foi ratificada pelo Brasil em 2002 e é único instrumento jurídico internacional de caráter vinculante a tratar especificamente dos direitos dos povos indígenas e tribais. Para o presidente da Fundação Palmares, Eloi Ferreira, "o debate sobre a Convenção 169 não é um debate apenas dos povos indígenas ou quilombolas, mas é um debate de toda a nação. Um debate que visa ao reconhecimento, à afirmação da identidade e à proteção da cultura brasileira".
Foi com esse espírito, de ampliar a discussão e o conhecimento sobre o tema, que representantes governamentais, indígenas e quilombolas, pesquisadores e demais interessados estiveram reunidos para o painel "O Estado brasileiro e a Convenção 169 da OIT: avanços e perspectivas", na manhã deste sábado, 16, no Galpão da Cidadania, durante a Rio+20.
Eloi Ferreira destacou a luta das comunidades remanescentes de quilombos, diante do Estado brasileiro, pelo direito de serem reconhecidas como sujeitos de direitos da Convenção 169. Para o chefe da Divisão de Temas Sociais do MRE e um dos coordenadores do GTI, ministro Sílvio Albuquerque, a conquista é parte de um processo evolutivo de garantia de direitos humanos no país, que nasce no pós-guerra e passa por diferentes fases que vão da aversão à diferença ao integracionismo, culminado na atualidade com um Estado que trilha possibilidades de se pautar pelo reconhecimento, inclusão, proteção e garantia de direitos na diferença. Na visão do ministro, o próximo passo a ser conquistado é a extensão às demais comunidades tradicionais, além de indígenas e quilombolas, de direitos que tenham como base a Convenção 169 da OIT.
A representante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Maria Rosalina dos Santos, falou do papel que as comunidades tradicionais têm para a preservação do meio ambiente e do planeta. "Quem vive em comunidade quilombola não destrói a natureza, e sim preserva a natureza. Todo o seu território é sagrado, é vida". E ressaltou a relevância da Convenção 169 nesse processo de garantir os direitos territoriais a estas populações, "por isso acreditamos que a nossa participação na Rio+20 e nesse debate sobre a 169 fortalecerá e muito a nossa trajetória de luta", reforçou.
Joênia Wapixana, representante indígena na mesa, destacou a importância da consulta aos povos indígenas no processo de construção das normas que irão regulamentar a Convenção 169. "O Estado brasileiro deve ter um diálogo bastante transparente, aberto, participativo e de boa fé para garantir que a participação dos povos envolvidos seja plena e efetiva. É preciso que sejam respeitadas todas especificidades dos povos indígenas que a própria Convenção 169 prevê".
Levar o debate sobre a Convenção 169 para a Rio+20 é, para o representante da OIT, Renato Mendes, colocar na ordem do dia a necessidade de crescimento do país vinculado à distribuição de renda e riquezas. "A mensagem da Convenção 169 da OIT é clara: com um crescimento econômico sem respeito aos direitos fundamentais e direitos coletivos, não se realiza justiça social. O crescimento econômico, para chegar ao patamar de desenvolvimento, precisa distribuir os benefícios desse crescimento a todos os cidadãos."
Da teoria à prática
Um exemplo de experiência concreta de consulta aos povos indígenas foi relatado pela coordenadora geral de Gestão Ambiental da Funai, Marcela Menezes, com o processo de construção da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas (PNGATI). A construção da política começou em 2008 e contou com um amplo processo de mobilização e participação indígena.
A Funai e o Ministério do Meio Ambiente, em parceria com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), realizaram três reuniões prévias e cinco consultas regionais envolvendo cerca de 1.250 indígenas. O esforço resultou na recente assinatura do Decreto 7.747/12, que institui a PNGATI, pela presidenta Dilma Rousseff, no dia 5 de junho, durante as comemorações do Dia Mundial do Meio Ambiente. "A PNGATI é um exemplo de que é possível dialogar com os povos indígenas, fazer acordos e ter um processo de consulta", disse.
Segundo Thiago Garcia, assessor da Secretaria Geral da Presidência da República, o processo de construção da regulamentação da Convenção 169 da OIT prevê a realização de 27 reuniões informativas em diferentes regiões, seguidas de consultas macrorregionais, finalizando com um seminário nacional de concertação, que se constituirá em um "momento de ajuste e consolidação do instrumento que irá regulamentar os mecanismos de consulta da Convenção 169. O seminário buscará refletir o acúmulo de discussões realizadas durante todo processo". A proposta é envolver a diversidade de representantes indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais para que se construa consensos sobre tema.