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Reestruturação da Funai é um avanço para os povos indígenas brasileiros
No ano em que se completa o centenário do indigenismo no Brasil, o Decreto 7.056, assinado no último dia 28 de dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que renova a estrutura da Funai promove um avanço nas políticas públicas de Estado e moderniza a estrutura de atendimento ao seu público específico.
A principal mudança está na substituição das Administrações Executivas Regionais (AER) e Postos Indígenas por Coordenações Regionais e Coordenações Técnicas Locais, respectivamente. Criadas ainda no período do Sistema de Proteção ao Índio (SPI – 1910/1967), tanto as AER's como os Postos Indígenas tinham como principal objetivo assistir aos povos.
De acordo com a nova concepção, as Coordenações Regionais e Locais prestarão atendimento mais de perto, saindo dos centros urbanos para mais próximo das Terras Indígenas (TI) e terão como principal atribuição promover e executar as políticas públicas voltadas aos indígenas que estão sob jurisdição. O Decreto prevê, ainda, a criação de um Comitê Gestor paritário (50% indígena, 50% servidor), para cada Coordenação Regional, garantindo, assim, o protagonismo dos povos indígenas na implementação e execução das políticas públicas.
Desde março de 2007 muitas mudanças foram promovidas para melhorar o atendimento aos povos indígenas brasileiros. O aumento do orçamento de R$ 100 milhões em 2006 para R$ 423,1 milhões em 2010 demonstra a atenção que o governo federal vem promovendo para melhorar as condições de vida dos povos indígenas. Outras ações também merecem atenção especial, como o aumento salarial dos servidores e a implantação do cargo de indigenista, a instalação da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), em abril de 2007, onde os indígenas participam das discussões de governo; a entrega ao Congresso Nacional do novo Estatuto dos Povos Indígenas, em agosto de 2009, e as portarias declaratórias de 39 Terras Indígenas e 10 homologações.
A carência de servidores públicos especializados também será sanada com a abertura do concurso público para 3.100 novos cargos, divido em etapas. A primeira acontecerá em março deste ano e prevê a entrada de 425 pessoas. Ainda em 2009 a Funai realizou concurso para servidores temporários, contando com 60 cargos que atuam na sede, em Brasília. A instalação da Agenda dos Povos Indígenas e dos Territórios da Cidadania Indígena também otimizou as ações do governo federal para os povos indígenas.
Em entrevista, o presidente da Funai, Márcio Meira, explica as principais medidas adotadas na reestruturação e esclarece como estão sendo atendidas as comunidades que estão realizando manifestações contrárias à implementação da nova estrutura.
A publicação do Decreto 7.056 irá extinguir as Administrações Executivas Regionais e os Postos Indígenas? Neste sentido, os índios ficarão sem atendimento?
Márcio Meira – As Administrações Executivas Regionais, que eram 45, serão substituídas por Coordenações Regionais, algumas; e Coordenações Técnicas Locais, outras. Nenhuma instituição da Funai existente será fechada. Elas estarão funcionando normalmente para atender à população indígena. O que houve de mudança é que nós criamos 36 Coordenações Regionais – muitas delas eram Administrações Executivas Regionais e se transformaram em Coordenações Regionais, e criamos 297 Coordenações Técnicas Locais – muitas eram Administrações Regionais, porém a maioria eram os Postos Indígenas. Por que isso? Porque nós queremos levar a Funai mais para perto dos povos indígenas. Tirar a Funai das capitais, das cidades e levar mais para perto das florestas, das aldeias, das Terras Indígenas (TI's), e as Coordenações Técnicas Locais serão fortalecidas.
Na prática, então, significa que os indígenas terão atendimento 100% do estado brasileiro, da Funai, próximo a eles? Diferentemente do que vem sendo colocado?
MM – Exatamente! Diferentemente do que vem sendo dito, inclusive, principalmente no estado de Pernambuco e da Paraíba, onde tem sido afirmado que não vai mais funcionar a Funai. Não é verdade! As unidades da Funai de João Pessoa e de Recife continuarão a funcionar e vamos, ainda, ampliar a presença da Funai, inclusive em Pernambuco, com a criação de Coordenações Técnicas Locais. O mesmo ocorrerá na Paraíba, em Sergipe e Alagoas. Para cada nova regional será criado um Comitê Gestor, com a participação paritária dos indígenas e de servidores. Esse comitê promoverá a discussão do planejamento orçamentário, financeiro e político da Funai e da política indigenista daquela região. Portanto, a população indígena do Brasil inteiro pode ficar tranqüila por que esse decreto de reestruturação veio pra melhorar, modernizar e tornar a Funai mais forte. Para tanto, saiu essa semana (12/01) o edital para a realização do concurso público para contratar, até junho de 2010, 425 novos funcionários para trabalhar principalmente nas áreas indígenas, nas Coordenações Regionais e Técnicas Locais. Ou seja: queremos que 90% dos servidores contratados por concurso trabalhem perto das aldeias. Na verdade estamos fazendo uma ação de reestruturação da Funai no sentido de fazer com que os serviços, o atendimento e a assistência sejam ampliados e melhorados e que sejam mais adequados ao atendimento aos povos indígenas, dentro das TI's.
Inclusive, na mesma semana que assinou o Decreto de reestruturação da Funai, o presidente Lula homologou a demarcação de 5,2 milhões de hectares de Terras Indígenas (21/12/09), 10 TI's distribuídas entre os estados do AM, PA, MS. Todas essas ações são para reforçar a proteção e a promoção dos povos indígenas do Brasil. Então a reestruturação é uma ação positiva, de melhoria e de qualificação da Funai, que vai garantir maior presença dessa instituição no território brasileiro.
Agora, presidente, desde quando foi pensada a reestruturação? É um processo recente ou vem sendo discutida há algum tempo?
MM – A reestruturação da Funai vem sendo discutida há duas décadas, no mínimo. Há muitos anos a população indígena reclama pela reestruturação e fortalecimento da Funai. E o presidente Lula foi quem teve a coragem de promover esta reestruturação. Fazendo o quê? Abrindo vagas para a Funai por meio de concurso público, realizando um aumento do salário dos servidores, melhorando a capacitação desses servidores e criando novas estruturas. Agora, essa nova organização funcional foi publicada por esse decreto coroa um processo longo de reestruturação. A Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) criada pelo presidente Lula, recebeu as informações da Funai em relação aos princípios gerais dessa reestruturação, principalmente os princípios de participação, de protagonismo dos índios nessa nova forma de gestão, que é uma gestão participativa. Recebemos também orientações muito importantes dos órgãos de controle, do Tribunal de Contas da União, porque a Funai apresentava também muitos problemas de execução financeira. Por isso, muitas medidas também foram levadas em conta para que a eficiência e a eficácia da aplicação desses recursos fosse realizada e esse problema está sendo sanado com o decreto.
Presidente, quando as mudanças poderão ser sentidas?
MM – A partir de hoje a Funai já começa a funcionar numa perspectiva de construção de uma gestão participativa, mais racional e eficaz, e que começará a funcionar imediatamente. O decreto estabelece prazos curtos de execução de funcionamento, e esse funcionamento começa imediatamente. Ao longo desse ano de 2010, certamente, vamos implantar pouco a pouco essa estrutura e eventualmente poderemos fazer também alguns ajustes, mas os princípios gerais do decreto são importantíssimos e serão mantidos e executados imediatamente.
Algumas lideranças indígenas estão realizando manifestações em algumas regiões do país. O que a presidência da Funai tem feito para sanar essas manifestações?
MM – Na verdade essas manifestações são localizadas, não estão acontecendo em todo o país. Elas basicamente vieram da Paraíba, algumas no Paraná e outras no Mato Grosso, principalmente do povo Xavante. Estamos recebendo os manifestantes quem vem a Brasília e querem dialogar com a Funai e com os esclarecimentos muitos deles perceberam a qualidade da mudança que nós promovemos, mas alguns ainda não estão satisfeitos. É óbvio que numa mudança estrutural grande não é possível se ter unanimidade. Nós temos recebido informações de todo o Brasil, e a maioria dos povos está plenamente satisfeita porque percebe que realmente a Funai chegou mais forte na sua região e vai atender as comunidades indígenas de forma participativa nova, e que era um anseio antigo deles.
Os povos indígenas isolados e de recente contato também serão beneficiados. Ou seja, a Funai está fortalecendo ainda mais a estrutura dos povos indígenas isolados. O senhor podia explicar um pouquinho?
MM – Com certeza. O decreto cria mais seis Frentes de Proteção Etno Ambiental, totalizando 12, que são as unidades que atuam na defesa dos índios em situação de isolamento voluntário e de recente contato. Nós ampliamos e duplicamos nossa presença nessas regiões delicadas e vulneráveis. A Funai já tem uma política de 20 anos de proteção e de não fazer o contato e respeitar os povos que não querem fazer contato ou aqueles de recente contato. Dessa forma nós estamos reforçando essa política, que aliás, já é reconhecida pelas ONU como referência mundial de proteção de povos indígenas em situação de isolamento ou de recente contato. Então esse também foi um grande avanço que a Funai recebeu agora com esse decreto do presidente Lula.
Pode-se dizer então, que ao comemorar os 100 anos do indigenismo no Brasil, os povos indígenas recebem um grande presente do Estado brasileiro?
MM – Sem dúvida nenhuma, no ano que se celebra o centenário do indigenismo brasileiro esse decreto honra a memória do Marechal Rondon, trazendo a modernidade da Funai para o século XXI, atendendo com mais qualidade os povos indígenas, com maior presença no território, protegendo e promovendo mais os povos indígenas. Que nós possamos celebrar esse centenário de uma forma positiva, para que os povos indígenas possam finalmente ver o Estado brasileiro atuando de uma forma mais eficaz e eficiente, cumprindo a sua missão de proteção e pagando uma dívida histórica com os povos indígenas, que ainda é grande e precisa ser paga cada vez mais.