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Etnia de seis indígenas perde anciã
Ururu, a mais velha dos Akuntsu morre aos 85 anos. Guerreira, a índia sobreviveu ao massacre nos anos 1980, que dizimou o seu povo
Febre alta, forte dor de cabeça e de garganta.
No último mês de setembro, os sintomas tornaram-se comuns entre os Akuntsu da Terra Indígena Rio Omerê/RO. Entretanto, mesmo com todos os cuidados para combater os sintomas, Ururu não resistiu. Muito debilitada, morreu no dia 1º de outubro, às 12h15, no Posto da Frente de Proteção Etnoambiental Guaporé.
A exata causa de sua morte ainda não foi diagnosticada. Os outros cinco indígenas Akuntsu apresentaram, na mesma época, sintomas semelhantes ao de gripe. Durante todo o mês que permaneceu doente, Ururu foi acompanhada por seu filho Pupak, 39 anos, um técnico de enfermagem da FUNASA e uma enfermeira colaboradora da Funai requisitada especificamente para reforçar os cuidados com a anciã.
Konibú, de 73 anos, irmão de Ururu, é quem, atualmente, está com o quadro mais complicado. Em radiografia tirada do tórax foi diagnosticada pneumonia em estado avançado e tuberculose, provavelmente manifestada após a baixa da imunidade decorrida da pneumonia. Além disso, o exame de tomografia apontou para uma cardiomegalia (aumento do tamanho do coração), congestão venosa central e derrame pleural (acúmulo de líquido entre as membranas que revestem o coração). Apesar da crítica situação, Konibú está se recuperando. A última informação fornecida por Altair Algayer, coordenador da Frente de Proteção Guaporé, é de que o indígena já iniciou o tratamento, voltou a se alimentar e não apresenta mais insuficiência respiratória.
Para acompanhar Konibú, atualmente o mais velho da etnia, um médico da FUNASA ficou em campo até o dia 21 deste mês. A medida evitou a necessidade de retirada do indígena de sua Terra e o poupou do estresse da cidade.
Segundo Jussara Castro, enfermeira que acompanhou Ururu, não tem como saber quais são os motivos do surto de gripe entre os Akuntsu. Até porque eles são acostumados a ficar mais na aldeia, sem contato com outros grupos. "A contaminação acontece pelas vias aéreas superiores. O vírus poderia estar latente já há algum tempo em um dos indígenas e só se manifestou com a baixa da imunidade", afirma Jussara.
Todos os Akuntsu foram hospitalizados com infecções respiratórias entre os dias 15 de setembro e 6 de outubro. O tratamento ocorreu em Cerejeiras, Vilhena e Cacoal. Essa foi a primeira vez que as índias Aramina, 49 anos, e Enotéi, 23 anos, saíram da Terra Indígena e foram até uma cidade. A experiência não foi boa para elas, que sentiram náuseas em toda viagem de carro.
Os deslocamentos dos indígenas para Vilhena e Cacoal foram feitos pela FUNASA. O técnico Adriano Camargo, que trabalha na T.I. Rio Omerê, acompanhou os indígenas por todo o período em que estiveram internados no hospital. A FUNASA também providenciou, na madrugada do dia 25 de setembro, os encaminhamentos necessários para a internação de Konibú. Foi responsável, ainda, pelo procedimento cirúrgico de retirada do útero e do ovário esquerdo da índia Txiaruí de 37 anos. Há mais de dois anos foi constatado um mioma uterino. Todo o procedimento em Cacoal aconteceu em hospital particular e foi custeado pela Funasa.
Massacre dos anos 80
Mesmo com a idade avançada, a perda de Ururu é grande não só para sua etnia, mas para todos os brasileiros que perdem um tanto de história já quase extinta. Nos anos 80 os, aproximadamente, 30 Akuntsu foram vítimas de um massacre no município de Corumbiara/ RO. O recorrente conflito de terras na região dizimou quase toda a etnia. À época, restaram sete sobreviventes que, ainda hoje, carregam as marcas dos tiros em seus corpos. Com a perda de Ururu, o grupo fica com seus últimos cinco guerreiros.
Para Altair, indigenista da Funai que há anos acompanha os Akuntsu, o que o Estado pode fazer pelo povo é garantir a sua proteção, o que é o mínimo de consideração com eles. "Infelizmente, já os encontramos com um número muito reduzido. Desde que a Funai fez o contato oficial em 1995, a gente conseguiu fazer a proteção, mas não conseguimos salvar o povo. Quando iniciamos nosso trabalho, o povo e sua história já tinham se perdido", lamenta o indigenista.
Certamente já não dá mais pra recuperar o que aconteceu, mas é indiscutível a importância de garantir aos Akuntsu a tranqüilidade de viverem em seu território livres das ameaças físicas e com a dignidade necessária para exercerem o direito universal à vida.