Venezuela - Primeiras instruções
Instruções de 7 de dezembro de 1841 de Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho, ministro dos Negócios Estangeiros, a Miguel Maria Lisboa, encarregado de negócios junto ao governo da Venezuela. Publicado nos Cadernos do CHDD, ano VIII, n. 15, p. 160-161
N. 11
Para Miguel Maria Lisboa
Acuso a recepção dos ofícios que V. Mce. me dirigiu sob n. 22, 23 e 24, e reservado n. 3, todos de agosto passado.
Ainda que a declaração, de que trata o n. 22, de serem os súditos brasileiros equiparados em Chile com os da nação mais favorecida, estava já compreendida na manifestação desse governo a todos os povos da terra, de que serão tratados em suas pessoas e propriedades com perfeita igualdade (política absolutamente conforme com a do Governo Imperial); contudo, aprovo as explicações e notas que V. Mce. cruzou com o ministro das Relações Exteriores, pois é sempre satisfatório ver que se nos faz explícita aplicação destes princípios, à vista dos quais desaparece, inteiramente, o seu receio de que os produtos do Brasil não fossem admitidos nesse mercado em concorrência com outros iguais, procedentes de diverso país. Diz V. Mce. que, se forem aprovados os tratados concluídos ultimamente em Lima, não deixará o governo dessa república de ressentirse da contradição das explicações, que acaba de fazer-lhe em meu nome;mas, essa suposição há de esvaecer-se quando V. Mce. comparar o tratado de Chile com o do Peru (até para explicar a diferença ao mesmo governo, se tanto for necessário) e conhecer que o primeiro devia acabar em 1842, e que o segundo, se for aprovado, só terá princípio em 1843, época em que, provavelmente livres de anteriores compromissos, poderemos celebrar outro igual com essa república: conceito que V. Mce. dará a entender desde agora, mas, prevenindo também que há de ser sem aquela cláusula que o Senado ampliou (de que se algum marinheiro escravo fugisse dos barcos brasileiros para terra, ficaria liberto e não se entregaria a pedido do capitão, nem dos agentes do Brasil), cláusula oposta ao uso consuetudinário das nações marítimas, as quais, independentemente de tratados e só por utilidade comum, entregam os marinheiros fugidos, que vêm filiados no rol da equipagem, conforme o costume da nação respectiva, sem indagar a sua condição ou qualidades civis, cujo conhecimento só pertence à autoridade que lhe garantiu a saída, confiando na proteção que encontrará em todos os países para obrigar esses indivíduos a regressar no mesmo navio, a fim de que não se malogre a viagem. As suas observações ao tratado de navegação do Amazonas serão tomadas em consideração oportunamente e aproveitadas, sempre que elas abraçarem, a par dos nossos interesses privados, as regras de eterna justiça que o Governo Imperial tem adotado por base das suas relações com os Estados limítrofes, não duvidando jamais que o seu exemplo, próprio das luzes do século, deixa de ser seguido pelos respectivos governos em prol da justa reciprocidade que o Brasil tem direito a esperar deles.
À vista do modo como V. Mce. se expressa a respeito do artigo adicional ao tratado preliminar feito com Buenos Aires em 1828, julgo necessário lembrar-lhe que, em vez desse artigo negar o nosso direito, antes foi posto para advertir que o temos, conceito que V. Mce. deverá ter muito presente para emiti-lo sempre que alguém o interpretar de outra forma.
Enquanto ao que refere ter passado com o encarregado de negócio dos Estados Unidos e a política aludida por ele, esquecendo-se de que um representante do seu governo tomou assento no Congresso do Panamá, não obstante existir já o citado discurso de Jefferson contra alianças enredadoras (que o Brasil também não quer), aprovo a sua resolução de não falar mais neste assunto com o dito encarregado de negócios; e tenho a recomendar-lhe que continue a sustentar, como opinião do Governo Imperial, que México e Centro-América devem concorrer ao congresso, não só pelas razões que V. Mce. expõe, como para ir conforme com a ideia essencial do convite, isto é, a reunião de um “Congresso Geral de Representantes de todos os novos Estados Americanos”. Em tudo mais, deverá V. Mce. regular-se pela resposta que, a respeito dessa assembleia, mandei dar ultimamente ao governo do Peru e se lhe transmitiu por cópia, para fazê-la constar também a esse governo; e quando a não haja recebido, a poderá reclamar da legação competente.
O que tudo participo a V. Mce., para sua inteligência e execução.
Deus guarde a V. Mce..
Palácio do Rio de Janeiro,
em 7 de dezembro de 1841.
Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho
Sr. Miguel Maria Lisboa