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Mensagem do Ministro de Estado das Relações Exteriores ao Itamaraty, Embaixador Carlos Alberto Franco França
Mensagem do Ministro de Estado das Relações Exteriores ao Itamaraty, Embaixador Carlos Alberto Franco França – Brasília, 06/04/2021[*]
Senhoras e senhores Embaixadores, senhores Secretários e Chefes de Departamento, os colegas todos,
Decidi que um dos meus primeiros atos após a posse seria dirigir-me diretamente à Casa, neste momento sem precedentes de crise sanitária, onde é mais fundamental do que nunca que mantenhamos o espírito de coesão institucional e um canal aberto de comunicação entre nós.
A pandemia impõe desafios especiais ao Itamaraty – tanto na gestão da nossa política exterior, aqui na Secretaria de Estado, quanto em nossa rede de 218 embaixadas, delegações, consulados, vice-consulados e escritórios, no Brasil e no exterior.
A pandemia afetou as vidas de todos, em todo o mundo, e nós não somos exceção. Estou muito sensível à situação dos milhares de diplomatas, oficiais de chancelaria, assistentes de chancelaria e outros servidores, todos colegas que compõem a família do Serviço Exterior Brasileiro, da qual há 30 anos orgulhosamente faço parte.
Tenho plena consciência dos imensos esforços – e frequentemente dos sacrifícios – dos colegas. São esforços e sacrifícios necessários para manter a excelência do trabalho que fazemos em nome do Brasil e, ao mesmo tempo, lidar com questões às vezes inéditas, e não menos complexas, na esfera pessoal e familiar.
Para as nossas famílias com filhos em idade escolar, a pandemia impôs carga adicional de cuidados, que se agravou no exterior, como sabemos, onde não contamos com rede mais ampla de apoio.
Prezados colegas,
Sei que as dificuldades que o Itamaraty vive não são apenas circunstanciais e relacionadas à pandemia. Tenho bem presentes os desafios crônicos e as deficiências estruturais que também enfrentamos e que nos impactam de diferentes maneiras. Penso, por exemplo, em temas de progressão funcional; limitações orçamentárias; gargalos de gestão administrativa; dificuldades de lotação, particularmente nos postos C e D; participação e representação das mulheres na carreira de diplomata; e na aplicação do abate-teto no exterior, que afeta muitos funcionários em postos com custo de vida elevado.
Eu e o Secretário-Geral designado, Embaixador Fernando Simas Magalhães, não pouparemos esforços para enfrentar esses e outros desafios – sempre atentos às demandas e ao sentimento da Casa, e com o objetivo maior de melhorar nosso ambiente de trabalho, racionalizar métodos e fomentar o enorme talento humano de nossa instituição.
Eu me permito aqui fazer uma observação pessoal. Os primeiros cinco anos da carreira eu vivi na administração. Aqui no Ministério, foi na administração que eu nasci, em uma época de particular escassez de recursos financeiros e orçamentários. Essa era a realidade em que nasci e que fui criado aqui na Casa. Eu estou muito ciente e muito sensível a essa questão.
Gostaria também de recordar, e me permito fazê-lo sem desconsiderar a experiência de outros colegas, que, dos 12 anos que passei no exterior – 12 anos consecutivos –, mais da metade, seis anos e meio, foram cumpridos em postos da classe C, onde a vida frequentemente é difícil, e onde o profissionalismo dos funcionários do Serviço Exterior Brasileiro é testado dia a dia. Eu vivi pessoalmente essas experiências; essas palavras são palavras que vêm realmente do meu sentimento.
Da mesma maneira, eu gostaria de lembrar que venho da turma Ulisses Guimarães, uma turma que teve como paraninfa uma mulher, a Embaixadora Tereza Maria Machado Quintella, de modo que logo ao início da minha carreira, já antes, no Instituto Rio Branco, antes até de tomar posse como Terceiro-Secretário, era presente a questão de gênero, a questão da representação das mulheres na nossa carreira. Devo lembrar até – Otávio Brandelli, nosso Secretário-Geral, o Embaixador Brandelli é um colega de turma, há tantos outros aqui, Pedro Miguel, outros que vejo, Pedro Wollny, Sarquis, não estou enxergando direito, então vou parar de citar, senão não cito os outros – lembrar que a primeira embaixadora da minha turma foi a Embaixadora Gisela Maria Figueiredo Padovan, foi a primeira colega de turma a ser promovida a embaixadora. Foi promovida junto com o Embaixador Haroldo, mas ela foi a primeira, porque mais antiga. De modo que essas questões não são questões vazias, não são questões que coloquei no papel apenas para que sejam interesses corporativos. São, mas são questões às quais eu estive submetido, eu estive sensível desde o início de minha carreira, desde que entrei aqui no Itamaraty, há 30 anos.
Estimados colegas,
O Itamaraty sempre esteve – e continuará a estar – à altura do momento.
Todos conhecemos as contribuições desta Casa para o Brasil. Nosso acervo diplomático é motivo de justificado orgulho.
A hora é oportuna para recordar que a renovação, a adaptação e a superação de desafios são marcas indeléveis da diplomacia brasileira.
Gostamos sempre de lembrar, e com razão: vivemos hoje em um país com o quinto maior território no mundo graças a uma linhagem diplomática que começou antes da Independência e passa por nomes como Alexandre de Gusmão, Duarte da Ponte Ribeiro e o Barão do Rio Branco. Se vivemos em paz com nossos dez vizinhos há mais de 150 anos, também isso devemos à visão de nosso Patrono.
Apenas para mencionar área em que trabalhei diretamente, a da energia, evoco o exemplo de diplomatas visionários cujo trabalho abriu caminho para a construção da usina binacional de Itaipu, que transformou a infraestrutura brasileira e impulsionou nosso desenvolvimento econômico. Itaipu, é sempre bom repetir, foi resultado de delicada composição de interesses com dois de nossos mais importantes vizinhos estratégicos.
Novamente com o concurso da diplomacia, fomos capazes de, em plena Guerra Fria, desenvolver um programa de energia nuclear, com fins exclusivamente pacíficos, outra legítima demanda do desenvolvimento soberano.
E, claro, temos ainda uma tradição de relevantes serviços prestados à comunidade brasileira no exterior. É o ponto de contato mais direto e pessoal do Itamaraty com a população que representamos e defendemos. Quero relembrar as bem-sucedidas missões de repatriação de mais de trinta mil brasileiros retidos no exterior por ocasião da pandemia. Elas são mais um exemplo da dedicação e do profissionalismo que constituem os traços distintivos do nosso Serviço Exterior. Traços que só fazem sobressair em fases críticas como a que agora atravessamos.
Esse é o Itamaraty que sempre nos inspira: o Itamaraty que encara as dificuldades de cada momento e que as vence; que identifica oportunidades na adversidade; que reconhece seus melhores talentos e os mobiliza para promover o interesse nacional; que compreende o valor da transmissão da experiência acumulada às gerações mais modernas.
O patrimônio mais precioso do Itamaraty, não há dúvida, são as pessoas que o compõem. Quero dialogar com a Casa, na certeza de que o diálogo e o debate respeitoso são a chave para o nosso crescimento institucional.
Como de outras vezes, chegaremos ao fim da atual crise mais fortes e confiantes. E o faremos com sentido de unidade, de responsabilidade e profissionalismo.
Não subestimo, é claro, os desafios que teremos pela frente. Mas sinto-me seguro para enfrentá-los, porque sei do que somos capazes de alcançar coletivamente, num quadro de confiança recíproca e trabalho colaborativo.
Sei que, ao lidar, um a um, com aqueles desafios, terei o apoio de cada um de vocês.
Muito obrigado.