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Exposição do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Carlos Alberto Franco França, em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados
Exposição do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Carlos Alberto Franco França, em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN) da Câmara dos Deputados – Brasília, 28/04/2021
Antes de mais nada, gostaria de agradecer, aqui, na pessoa do Presidente Aécio Neves, à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados a oportunidade desta sessão. É um prazer e é uma honra estar aqui.
Cumprimento, também, o Deputado Coronel Armando, Segundo Vice-Presidente da CREDN, e, em nome dele, também, todas as Senhoras e Senhores Parlamentares.
Em meu pronunciamento de posse, falei em diálogo. De fato, não se concebe nem se executa uma política externa sem diálogo. Diálogo para fora do País, como é próprio da diplomacia, mas também diálogo para dentro do País, como é próprio da democracia.
Nesse esforço de diálogo para dentro, o Congresso Nacional é certamente um interlocutor fundamental. É fundamental pelo que representa – os interesses da sociedade brasileira em sua ampla diversidade. É fundamental pela experiência que acumula e pelos aportes que pode oferecer à ação do Ministério das Relações Exteriores.
Portanto, se compareço a esta sessão para falar, venho aqui também para ouvir. Os desafios do momento são grandes demais para que qualquer um de nós pretenda ter o monopólio das soluções. Nunca é assim, menos ainda em tempo de urgências tão agudas.
As nossas urgências já estão mapeadas: a urgência da pandemia, a urgência da economia e a urgência do desenvolvimento sustentável. Ao assumir o Itamaraty, conversei sobre cada uma delas com o Presidente Jair Bolsonaro. E tenho dele a orientação clara de enfrentá-las.
Uma primeira observação, singela, é que não será fácil. Os parlamentares aqui presentes sabem disto melhor do que eu, mas digo até para os que nos assistem em diferentes cantos do Brasil: não há passes de mágica. O que há, sim, de minha parte, é uma disposição total para trabalhar e para acertar. Uma disposição total para decompor os problemas nas suas múltiplas variáveis e para atacá-las, com método e paciência, uma a uma. Digo de minha parte, mas posso – e devo – dizer, também, da parte do conjunto dos funcionários do Itamaraty, cujo sentido de missão e de serviço a nosso País pude uma vez mais confirmar nestes primeiros dias de gestão.
Senhoras Deputadas e Senhores Deputados,
Conscientes da dimensão dos desafios, minha equipe e eu estamos desde a primeira hora inteiramente mobilizados. Em menos de um mês, acho que dei mais telefonemas do que, em outras condições, teria dado em um ano. Foram conversas com outros Chanceleres, da região e de fora dela. Foram conversas com colegas da Esplanada. Foram – na verdade, têm sido e continuarão a ser – conversas com interlocutores os mais variados, no Brasil e no exterior, na tentativa de erguer pontes que nos ajudem a cuidar das nossas urgências.
Começo pela questão da saúde pública – a emergência sanitária. Nossas missões no exterior vêm empenhadas em obter acesso a vacinas e a outros medicamentos para o combate à COVID-19. Por iniciativa própria, ou por chamamento do Ministério da Saúde, têm feito o melhor para identificar possibilidades e oportunidades.
Mais recentemente, a busca por suprimentos para o chamado “kit intubação” tem sido uma das prioridades. Seja para obter doações, quando é o caso, seja para levantar oferta disponível para compra, nossas Embaixadas, Consulados e outras representações não têm poupado esforços. Em Washington, já cuidamos de viabilizar aquisições por meio do Fundo Estratégico da Organização Pan-Americana da Saúde, a OPAS.
É claro que é preciso que as informações que recolhemos mundo afora não se percam. Cumpre processá-las e organizá-las adequadamente; cumpre unir as pontas no Brasil entre os atores relevantes, em particular o Ministério da Saúde. Para isso, para melhor sistematizar esse decisivo exercício de coordenação, criamos o Grupo de Trabalho da Diplomacia da Saúde, que já está em pleno funcionamento.
Como tem de ser, estou pessoalmente engajado na nossa diplomacia da saúde. Um dos primeiros contatos que mantive, como Ministro, foi com minha colega espanhola, Arancha González, que visitará o Brasil, agora, dia 7 de maio. Como tem de ser, pudemos anunciar, em seguida, que a Espanha havia doado ao Brasil medicamentos para intubação, que chegaram ao Brasil ontem, terça-feira, dia 27. Também nos foi possível conseguir de Portugal doação de medicamentos anestésicos para procedimentos de intubação.
A China é, ninguém ignora, outro parceiro-chave nessa matéria. Em conversa telefônica com o Ministro dos Negócios Estrangeiros Wang Yi, fiz dois pedidos: que apoiasse a aquisição pelo Brasil de 30 milhões de doses da vacina da Sinopharm, para entrega ainda no segundo trimestre deste ano; e que nos auxiliasse no fornecimento de IFAs com vistas à produção no Brasil de um total de 60 milhões de doses da vacina Oxford-AstraZeneca. Nosso diálogo foi muito positivo. O Ministro Wang comprometeu-se a fazer todo o possível para cooperar. Reservará e fornecerá ao Brasil, o quanto antes, quota maior de IFAs para a produção da vacina Oxford-AstraZeneca. Ressaltou, na ocasião, que abril seria mês crítico na China, e que precisam acelerar a vacinação interna. Mas afiançou que, em maio e junho, haverá grande aumento da produção de IFAs naquele país.
Monitoraremos a situação. Nossa Embaixada em Pequim acompanha praticamente em tempo real cada processo de autorização de exportação do insumo farmacêutico ativo, o IFA. Desde fevereiro, a Fiocruz recebeu insumos suficientes para a produção de cerca de 38 milhões de doses, o que garante entrega de doses pela Fundação até o início de junho.
Temos atuado igualmente junto à Índia. Buscamos a liberação das 8 milhões de doses pendentes – dentre as 12 milhões de doses que adquirimos – da vacina Oxford-AstraZeneca produzidas pelo Instituto Serum. A crise sanitária na Índia, como temos acompanhado, vem se agravando. Mas, pelos canais adequados, estamos agindo para que autorizem exportações para o Brasil.
Nosso trabalho junto ao governo norte-americano tem sido permanente e incansável, com o objetivo de conseguir para o Brasil a contribuição possível, por parte de Washington, de insumos médicos e vacinas, em particular do montante de doses que o governo norte-americano mostra-se disposto a compartilhar com outros países ao longo dos próximos meses. Estamos em contato com unidade recém-criada, no Departamento de Estado norte-americano, dedicada à alocação de vacinas para parceiros internacionais dos Estados Unidos e temos trabalhado para que o Brasil possa dispor do aporte disponível, à medida que evolui a parcela já imunizada da população norte-americana.
Com Israel, desde o início de abril, temos promovido videoconferências para fazer avançar a cooperação em matéria de vacinas e outros medicamentos. O diálogo com Israel inclui, ainda, telemedicina, terapias avançadas e saúde digital.
Também temos trabalhado com a Rússia. Acompanhei telefonema do Presidente Bolsonaro com o Presidente Putin no dia 6 de abril, mesmo dia em que tomei posse à frente do Ministério das Relações Exteriores. Trataram de diferentes temas, inclusive da aquisição pelo Brasil – e da produção em nosso país – da vacina Sputnik V. Esperamos que as questões pendentes para aprovação da vacina possam ser oportunamente solucionadas de modo satisfatório para a Anvisa, de modo a podermos eventualmente contar, no médio prazo, com o aporte de mais uma vacina em nosso esforço nacional de imunização e superação da pandemia.
São regulares, aliás, as tratativas da Anvisa com fabricantes no exterior, bem como as missões de inspeção a outros países para agilizar a aprovação de vacinas e outros medicamentos. O Itamaraty tem prestado à Anvisa, e continuará a prestar, todo o apoio necessário.
Senhor Presidente Aécio Neves,
Diante da pandemia de COVID-19, o Brasil tem também participado de movimentos multilaterais em favor do acesso a vacinas e tratamentos seguros, eficazes e de alta qualidade.
Nosso País está associado a iniciativas como o ACT-Accelerator, o Solidarity Call to Action e a COVAX Facility, mecanismos que têm o objetivo de garantir ao maior número possível de países acesso amplo e equitativo a vacinas, medicamentos e insumos médicos e hospitalares necessários para o controle e derrota da pandemia. A adesão à COVAX Facility garantirá ao Brasil quarenta e dois milhões e quinhentas mil doses. Estamos falando de cobertura para 10% da nossa população. Com o início da vacinação em vários países, instamos a COVAX a garantir, de imediato, o acesso a vacinas aos países participantes. Estamos atentos e queremos influenciar a governança da COVAX, razão pela qual apresentamos candidatura à sua Comissão Executiva.
Mantive, no dia 21 de abril, videoconferência com o Diretor-Geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom, que me garantiu estar trabalhando para acelerar o cronograma de entregas da vacina pela COVAX ao Brasil, tendo em conta nossa urgência de recebimento.
A mensagem do Dr. Tedros foi secundada por sua Diretora-Assistente, a brasileira Mariângela Simão, que informou manter a OMS interlocução constante com a Fiocruz e o Instituto Butantan, de modo a prestar apoio firme da OMS à produção nacional de vacinas e insumos. Na mesma reunião, o coordenador do ACT-Accelerator reconheceu o papel decisivo do Brasil no apoio ao ACT e à COVAX. Elogiou, ainda, os fortes sinais de apoio a essas iniciativas que estão sendo prestados pelo governo brasileiro.
Na Organização Mundial do Comércio, o Brasil vem respaldando – ao lado de outros países, desenvolvidos e em desenvolvimento – os esforços de resposta à pandemia propostos pela nova Diretora-Geral, a nigeriana Ngozi Okonjo. A Diretora-Geral pretende que a OMC possa identificar, nos mais diversos mercados, capacidade ociosa para produção de vacinas, bem como incentivar acordos de licenciamento voluntários e de transferência acelerada de tecnologias e insumos. Aliás, o Brasil tem se empenhado nessas vias ampliando sua capacidade de produção e desenvolvimento farmacêutico mediante os acordos firmados pela Fiocruz e pelo Instituto Butantan.
Para dar contornos concretos a essa agenda, a OMC promoveu, há menos de duas semanas, em 14 de abril, evento com a Organização Mundial da Saúde, a Organização Mundial de Propriedade Intelectual e os principais países produtores de vacinas, entre os quais o Brasil. Estiveram também representantes do setor privado e da sociedade civil. Penso que essa é mais uma frente da qual poderão surgir contribuições importantes para o combate à crise sanitária que nos atinge a todos.
Igualmente na OMC, é relevante mencionar que o Brasil apoia a Iniciativa sobre Comércio e Saúde. Temos conosco a Austrália, o Canadá, o Chile, o México e a União Europeia, entre outros países. O objetivo é garantir acesso a vacinas, equipamentos médicos e outros insumos essenciais importados em caso de pandemias, mediante i) a identificação e o uso de capacidade instalada para a produção; ii) a facilitação de acordos de licenciamento para a transferência de tecnologia, expertise e know-how; e iii) a identificação e resolução de forma consensual de qualquer barreira comercial à produção e à distribuição desses produtos, inclusive os relacionados à propriedade intelectual.
Ainda quanto ao combate à pandemia no âmbito da OMC, muito se tem dito, e compreensivelmente, sobre a hipótese da chamada “quebra de patentes” – o que equivale ao licenciamento compulsório. Há quem defenda, em Genebra, uma moratória de direitos de propriedade intelectual. Não nos parece, porém, que esse seja o caminho mais eficaz.
Os motivos são muitos, e começam com a constatação de que a moratória advogada não se limitaria a patentes farmacêuticas. A rigor, não se limitaria sequer a patentes em geral. Abrangeria a globalidade dos direitos de propriedade intelectual relacionados à resposta à pandemia por tempo indeterminado.
Mas isso não é tudo. O fato é que o grande gargalo hoje, para o acesso a vacinas, são os limites materiais da capacidade de produção e questões ligadas à complexidade das cadeias de abastecimento. Os especialistas afirmam que vacinas são virtualmente impossíveis de copiar, a curto ou médio prazo, sem o apoio dos laboratórios que as desenvolveram, mesmo com o auxílio da patente. Os países de menor desenvolvimento relativo já contam com uma moratória aplicável a todo tipo de propriedade intelectual e nem por isso, infelizmente, têm conseguido assegurar suprimentos.
Passando de Genebra à nossa região, devo acrescentar que a pandemia é, como não poderia deixar de ser, assunto também com nossos vizinhos. Na América do Sul, temos procurado manter as fronteiras abertas, respeitando as decisões soberanas de cada país em matéria sanitária.
O tom que queremos imprimir é o da cooperação. No Mercosul, usamos recursos do Focem, o Fundo de Convergência Estrutural do bloco, para medidas de teste e prevenção contra a COVID. No PROSUL, o foco em 2020 e 2021 tem sido a colaboração no combate à pandemia, mediante busca de fontes de financiamento para necessidades comuns.
Enfim, estamos intensificando e melhor articulando, em distintos planos, as ações da nossa diplomacia da saúde.
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,
Ao mesmo tempo em que cuidamos da urgência sanitária, temos de cuidar da urgência econômica.
Quando deixávamos para trás uma das maiores recessões da nossa história, veio a pandemia. Com a pandemia, vieram novas dificuldades econômicas. Uma resposta monetária e fiscal robusta tem mitigado os efeitos sobre os mercados, tem garantido renda a dezenas de milhões de brasileiros. Mas, em paralelo, precisamos continuar produzindo as condições para uma retomada consistente da atividade econômica – uma retomada que gere mais empregos, e empregos de qualidade.
Também aqui, a tarefa tem facetas diversas. Boa parte delas é de natureza doméstica. Boa parte delas depende, em larga medida, desta Casa, que tanto tem feito por nossa pauta de modernização econômica. Mas, sem dúvida, há um papel para a política externa.
Uma maior exposição do Brasil ao mundo, se bem desenhada e bem calibrada, pode ajudar a fazer crescer, e a dinamizar, a nossa economia. Mais comércio exterior; mais investimentos estrangeiros em áreas cruciais, como infraestrutura; mais contato com políticas públicas de reconhecida excelência – todos esses aportes que a diplomacia busca trazer para o desenvolvimento do nosso Brasil.
Penso, primeiro, no MERCOSUL. Estamos comprometidos com a continuada modernização do bloco, que consideramos peça importante de uma engrenagem mais ampla voltada para a melhor inserção do Brasil nos fluxos internacionais de bens, serviços e investimentos.
Internamente, buscamos melhorar o ambiente de negócios no MERCOSUL. Concluímos a negociação de acordos de compras governamentais, de facilitação de comércio e de comércio eletrônico. Estamos revendo a Tarifa Externa Comum e as regras de origem do bloco. Também continuamos o trabalho de convergência e harmonização regulatória.
Ninguém tem ilusões quanto aos desafios inerentes a esse processo. Primeiro, todo exercício de integração econômico-comercial enfrenta percalços, tem altos e baixos. Segundo, o momento é de dificuldades – ora mais, ora menos agudas – também para os nossos sócios. Nossa contribuição, neste estágio, será no sentido de mantermos o rumo, com os olhos postos num horizonte estratégico. Será no sentido de não nos perdermos na conjuntura. Sempre guiados, como é evidente, pelos valores e pelos interesses do Brasil.
Ao mesmo tempo em que procuramos cultivar a agenda interna do MERCOSUL, trabalhamos para impulsionar a agenda externa do bloco.
Temos dado grande atenção às negociações de acordos comerciais com parceiros externos. Perseguimos mais mercados para nossas exportações e maior acesso a importações de alto conteúdo tecnológico. Queremos, em suma, ampliar nossa competitividade. Esse é um imperativo de um mundo que – apesar de toda a conversa sobre o que seria um retrocesso na globalização econômica – continuará a funcionar, até o futuro previsível, sob o signo da interconectividade.
Lembro que, no MERCOSUL, temos negociações em curso com o Canadá, Singapura, a Coreia do Sul e o Líbano. Propusemos o início de negociações a todos os países da América Central. Queremos aprofundar os acordos que temos com o México, com a Índia, com Israel. E estamos explorando o terreno para negociações abrangentes com os Estados Unidos, o Japão e o Reino Unido.
É verdade que os sócios do MERCOSUL podem ter tempos diferentes quando se trata de iniciar novas negociações, de apresentar ofertas, de concluir processos em curso. Essas diferenças são naturais e eu penso que elas devem ser respeitadas. Mas estamos convencidos, porém, de que o MERCOSUL é capaz de articular as flexibilidades necessárias ao progresso de sua agenda externa. Estamos abertos a discutir possibilidades que sejam aceitáveis para todas as partes.
Será oportuna, a esta altura, uma palavra sobre um dos importantes acordos do MERCOSUL cujas negociações já concluímos: aquele com a União Europeia, cuja aprovação do outro lado do Atlântico parece envolta em controvérsia.
Aqui, temos ponderado aos nossos amigos europeus que convém nos concentremos nos fatos.
Conforme reconhecido pelo próprio Comissário de Comércio da União Europeia, o acordo conta com o mais moderno capítulo de desenvolvimento sustentável entre os negociados até então pela UE. Até por isso, carece de todo fundamento a narrativa de que o acordo poderia ter efeitos negativos em termos de emissão de gases de efeito estufa ou resultar, como se diz, em “importação de desmatamento”. “Importação de desmatamento” entre aspas. Para não falar na sustentabilidade da agropecuária brasileira, cuja produtividade, sabemos todos aqui, vem da inovação, não vem da devastação.
O Brasil está aberto à negociação de documento paralelo (em diplomacia, chamamos de side letter) para reafirmar os compromissos em matéria ambiental e social. Mas não aceitamos a reabertura do texto do acordo, que é resultado de longa e complexa negociação, que chegou a duas décadas.
É importante não confundir a qualidade dos compromissos negociados com o desejo de alguns parceiros em tratar de outros temas, como as queimadas na Amazônia e nossas metas em mudança do clima. Tratamos sem dificuldade desses temas, mas isso não significa, nem poderia significar, a renegociação de acordos já concluídos.
Devo dizer que a Comissão Europeia, como tal, tem atuado como aliada nossa. Juntamente com alguns países do bloco favoráveis ao acordo, está empenhada em esclarecer ao público europeu os benefícios do instrumento. Destaco ainda, e preciso destacar realmente, o apoio ativo que temos tido de Portugal, que ocupa neste semestre a presidência do Conselho da União Europeia.
Senhores Deputados,
Permito-me aqui prosseguir no que vinha dizendo sobre nossa busca por mais comércio e mais investimento para o Brasil, agora para além do MERCOSUL.
Temos podido avançar junto a uma gama de parceiros, de forma estritamente bilateral, em arranjos que não envolvam concessões tarifárias.
O acordo de livre comércio com o Chile, firmado em 2018 e hoje em tramitação nesta Câmara dos Deputados, é um exemplo. É o mais amplo acordo comercial assinado pelo Brasil em temas não tarifários.
O acordo contempla compras governamentais, serviços, investimentos, facilitação de comércio, regulamentos técnicos. Tem o potencial de trazer ganhos concretos para nossa indústria e nosso agronegócio. Deverá facilitar a aprovação dos estabelecimentos exportadores do nosso setor de carnes. Deverá reduzir significativamente a burocracia para todo o comércio. Permito-me apelar a Vossas Excelências por uma tramitação tão expedita quanto possível deste importante acordo com o Chile.
Com os Estados Unidos, concluímos um Protocolo sobre Regras Comerciais e de Transparência assinado em outubro passado e enviado pela Presidência da República ao Congresso Nacional no último dia 26, dois dias atrás. O Protocolo está totalmente em linha com os objetivos do Acordo de Comércio e Cooperação Econômica Brasil-Estados Unidos, de 2011, é composto por três anexos: i) facilitação de comércio e administração aduaneira; ii) boas práticas regulatórias; e iii) anticorrupção. O instrumento tem por objetivo simplificação de trâmites de comércio exterior e diversificar os fluxos bilaterais de comércio e investimentos. Também aqui me permito apelar por uma tramitação tão célere quanto possível.
Outro parceiro central para nós – é até redundante dizê-lo a Vossas Excelências – é a China. A China é o maior parceiro comercial do Brasil e um dos cinco maiores investidores estrangeiros no País. No primeiro trimestre de 2021, já há mostras de que essa tendência deve perdurar. A corrente comercial, naquele período, atingiu US$ 28,5 bilhões, quase 20% a mais do que no ano passado. A China é, ainda, a principal origem externa de investimentos no PPI, com um quarto do total de investimentos previstos naquele programa.
Olhando para frente, olhando adiante, observo que nossas exportações para a China, ainda concentradas em poucos produtos primários, poderão expandir-se e diversificar-se. Uma via será pela aprovação de mais Organismos Geneticamente Modificados, os OGMs, e pelo aumento da venda de proteína animal, com a habilitação de mais investimentos.
Está por novamente reunir-se, em princípio no segundo semestre do ano, a Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação, a COSBAN. É um foro de alto nível e, do lado brasileiro, liderado pelo Vice-Presidente da República, Hamilton Mourão. Será oportunidade para o encaminhamento de questões que ajudarão a intensificar o comércio, os investimentos e a cooperação com a China.
Senhoras e Senhores Deputados,
Outra tradição do Brasil é o fomento do comércio pela via multilateral. Também aí permaneceremos ativos. Seguimos engajados nas negociações para a 12.ª Conferência Ministerial da OMC, no final do ano. Uma reforma bem conduzida da OMC será instrumental para que a Organização ganhe nova vitalidade e concorra para a recuperação da economia mundial no pós-pandemia.
Na perspectiva da modernização da nossa economia, capítulo não menos relevante é o da crescente aproximação do Brasil à OCDE. Somos o país não membro mais alinhado às práticas da Organização. Só em 2020, aderimos a mais 17 instrumentos da OCDE. Com isso, o Brasil se tornou o país não membro com maior número de adesões (96 de um total de 248 instrumentos vigentes).
A acessão formal do País à OCDE é certamente um objetivo para nós. Mas gostaria de ressaltar que nesta instância, como em tantas outras, o caminho que se percorre – neste caso, o estreitamento constante das nossas relações com a Organização – já tem um inestimável valor intrínseco.
Muito ainda poderia dizer a Vossas Excelências sobre a contribuição que, na política externa, procuramos dar para a retomada firme do crescimento econômico e da geração de empregos em nosso País. Nossa diplomacia tem vocação universal, e nossas iniciativas de cooperação econômica engajam também países no Oriente Médio e na África. Do mesmo modo, incluem eventos de atração de investimentos e de projeção da imagem de sustentabilidade da nossa produção agropecuária. Não mais me estenderei mais a esse respeito, nesta apresentação inicial. O tempo é escasso, e, antes de passar ao diálogo com Vossas Excelências, ainda quero tratar da urgência ambiental.
Senhor Presidente,
No campo ambiental – ou, mais amplamente, do desenvolvimento sustentável –, faço duas considerações preliminares que julgo essenciais.
A primeira é de cunho eminentemente prático. O tema da sustentabilidade ganhou o centro do debate público em países de diferentes perfis. Em muitas sociedades, e cada vez mais, a preocupação do consumidor com aspectos ambientais e sociais da cadeia de produção dos bens é uma realidade incontornável. Grandes investidores são pressionados a montar carteiras ditas “verdes”. Com isso, não é exagero dizer que a sustentabilidade se tornou questão de acesso a mercado e uma questão de atração de investimentos ao mesmo tempo.
Somos movidos, antes de tudo, pela compreensão de que o planeta é um só, e que temos de preservá-lo para as gerações futuras. Mas seria um erro desconsiderar que, no século XXI, a sustentabilidade adquiriu, também, uma marcada dimensão econômico-comercial.
A boa notícia – e aqui vai a minha outra consideração preliminar – é que o Brasil não tem motivo para adotar, em matéria de desenvolvimento sustentável, uma atitude defensiva. Ao contrário. Estamos entre os países que podem apontar para soluções. Nossa histórica atuação nos debates internacionais e nossa trajetória interna em sustentabilidade, penso eu, nos dão autoridade para isso.
Assim é que, em nossa atuação externa, continuaremos a valorizar os ativos ambientais brasileiros, com ênfase na composição de nossa matriz energética; no caráter intensivo em tecnologia da nossa agropecuária; no rigor da nossa legislação de proteção ambiental. E continuaremos a fazê-lo em todos os foros pertinentes.
No nível regional, temos buscado fortalecer a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, a OTCA, que foi criada a partir de iniciativa brasileira e tem sede em Brasília. A OTCA é valioso instrumento de aproximação entre os países amazônicos. Tem amplo conhecimento da região e experiência de algumas décadas na realização de projetos de desenvolvimento sustentável na Amazônia.
Temos alguns resultados a mostrar no plano regional. Posso referir-me ao lançamento do Fundo para o Desenvolvimento Sustentável e a Bioeconomia da Amazônia, no âmbito do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o BID. Ou à conclusão de um protocolo regional de combate a incêndios florestais, exemplo de ação conjunta da OTCA e do Pacto de Letícia. São avanços encorajadores.
Nas negociações multilaterais, prezamos por resultados que respeitem os interesses, as prioridades e as sensibilidades dos países envolvidos.
Trabalhamos em textos equilibrados, que levem em consideração o princípio da responsabilidade comum, porém diferenciada – afinal, já é consagrado o reconhecimento de que os países desenvolvidos têm maior responsabilidade histórica pela preservação do meio ambiente. Trabalhamos por textos que incorporem as práticas econômicas existentes nos países em desenvolvimento. Na busca dos consensos possíveis, trabalhamos a partir de nosso patrimônio de conquistas econômicas, sociais e ambientais.
Ao mesmo tempo, estamos empenhados em demonstrar ao mundo que asseguraremos a implementação de nossa ambiciosa Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), ao amparo do Acordo de Paris.
Em nossa NDC, o Brasil reafirmou compromisso com a redução das emissões líquidas totais de gases de efeito estufa em 37% em 2025. O Brasil assumiu ainda o compromisso com a redução em 43% as emissões até 2030. E enunciou objetivo indicativo de atingir neutralidade climática – ou seja, emissões líquidas nulas – em 2060.
Na semana passada, na Cúpula de Líderes do Clima promovida pelo Presidente dos Estados Unidos, o Presidente Jair Bolsonaro foi além. Assumiu o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal no Brasil até 2030. Expressou a disposição brasileira de antecipar para 2050 o prazo para atingirmos a neutralidade climática. E afirmou seu comprometimento com duplicação do orçamento de fiscalização ambiental, ferramenta necessária para o cumprimento de nossas metas.
A questão principal remanescente, para a COP26, foro em que vamos participar agora no final do ano, é a regulamentação do Artigo 6.º, que assentará as bases para o mercado global de carbono, de vital importância para a manutenção das nossas propostas de desenvolvimento sustentável. Outra questão especialmente cara ao Brasil é levar os países desenvolvidos a cumprir a sua obrigação de assegurar aos países em desenvolvimento meios apropriados de implementação de políticas de mitigação e adaptação à mudança do clima.
Nossa energia está posta também na Convenção de Diversidade Biológica, onde negociamos a adoção de um novo marco global para a biodiversidade, com metas para 2030 e possivelmente para 2050.
De modo necessariamente resumido, essas são algumas de nossas principais posições em desenvolvimento sustentável. O Brasil é uma potência ambiental. Isso nos traz responsabilidades, e estamos cientes delas. E isso nos abre possibilidades, que seguiremos explorando.
Senhoras e Senhores Deputados, Senhor Presidente,
Concluo por aqui. Como disse, também compareço a esta Casa para ouvir. Aguardo com interesse os comentários e as indagações que Vossas Excelências tenham a bondade de dirigir-me.
Muito obrigado por esta oportunidade.