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Discurso do Senhor Ministro de Estado na abertura do Seminário sobre os 30 anos do MERCOSUL
Discurso do Senhor Ministro de Estado na abertura do Seminário sobre os 30 anos do MERCOSUL – Brasília, 08/11/2021
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É uma satisfação abrir este seminário sobre os 30 anos do MERCOSUL, que realizamos, mais até do que em parceria com a Fundação Alexandre de Gusmão, eu diria que graças a Fundação Alexandre de Gusmão.
Contar com a presença do Presidente Fernando Collor de Mello, nesta sessão de abertura, é um privilégio porque o Presidente Collor teve um papel fundamental na criação do MERCOSUL, como todos nós aqui sabemos.
Além de haver assinado, pelo Brasil, o Tratado de Assunção, sua presidência foi marcada pelo signo da liberalização comercial e da abertura para o exterior. São princípios e propósitos que estão na base do MERCOSUL e orientam a atual política de integração do governo do Presidente Jair Bolsonaro.
Aproveito, Presidente Collor, para parabenizá-lo, uma vez mais, pela iniciativa de promover no Congresso a sessão comemorativa do aniversário do MERCOSUL, a qual tive a felicidade de comparecer.
Deixo aqui também uma palavra aos palestrantes do seminário, muitos dos quais funcionários do Poder Executivo, bem como do Legislativo, do setor privado e da academia. É uma diversidade fundamental para o debate que queremos promover hoje.
Agradeço ao Senador Nelsinho Trad, que participará depois virtualmente, cuja atuação foi decisiva para a recente aprovação no Senado do Acordo de Livre Comércio entre o Brasil e o Chile, de que foi relator.
E aproveito também para saudar o Embaixador Rubens Barbosa que foi o primeiro coordenador nacional do Grupo Mercado Comum do MERCOSUL, e que, de certo modo, também, acho que não exagero ao falar isso, foi um dos pais fundadores do MERCOSUL aqui na chancelaria brasileira.
E não me deixa mentir o Embaixador Paulo Roberto de Almeida, que acompanhou a trajetória do Embaixador Rubens Barbosa. Eu mesmo, em Washington, fui funcionário do Embaixador Rubens Barbosa, de 1999 a 2003, pude recolher todas essas características que ele tem de dedicação ao serviço público, às causas do Brasil e não foi diferente quando ele se ocupou do MERCOSUL. É um exemplo, realmente, a ser seguido.
E, em nome das autoridades presentes, quero também agradecer aos expositores dos debates. Inclusive, quero saudar também àqueles que nos assistem neste momento pelo YouTube.
Nosso propósito hoje é propiciar um debate aberto e franco sobre o MERCOSUL, suas realizações e seus desafios. Acreditamos ser necessário contar com uma base factual e objetiva como ponto de partida. Se, por um lado, não aceitamos que haja tema tabu, por outro precisamos trabalhar a partir de uma noção compartilhada sobre o que já conquistamos até aqui.
Como qualquer processo de integração profunda, o MERCOSUL tem tarefas pendentes. Ao mesmo tempo, é evidente que o bloco trouxe ganhos reais aos seus membros e reconhecer esses ganhos é parte indispensável do exercício de análise crítica do presente e do futuro do MERCOSUL. Olhar apenas para a parte vazia do copo é um erro, pois para um debate produtivo temos de dar a merecida atenção à parte cheia.
O MERCOSUL tornou-se uma força incontornável na consolidação da paz e da democracia em nossa região. Propiciou nível inédito de diálogo político de alto nível, reforçando nossa coordenação no tratamento de temas comuns e estimulando constante troca de ideias sobre como nossa região deve buscar sua inserção no mundo.
Hoje nossas autoridades dos mais diversos níveis reúnem-se com uma frequência que certamente não ocorreria sem o aparato da integração. Na atual presidência semestral brasileira do bloco, totalizaremos cerca de 400 eventos, entre reuniões, seminários e workshops. É um número significativo.
Temos ferramentas que beneficiam diretamente nossos cidadãos, nos campos da integração fronteiriça, da previdência social, da circulação de trabalhadores e do reconhecimento de diplomas e certificados profissionais, por exemplo. No primeiro semestre deste ano, consolidamos todos esses ganhos no chamado Estatuto da Cidadania, uma iniciativa fundamental para comunicar e projetar nossas realizações. Temos um déficit de comunicação no MERCOSUL a corrigir – e estamos corrigindo. A Unidade de Comunicação e Informação da Secretaria do MERCOSUL tem feito um trabalho importante de renovação da imagem do bloco e de divulgação de suas atividades e resultados.
Quando dirigimos nosso olhar para a esfera econômico-comercial, a remoção de barreiras tarifárias trazida pelo MERCOSUL resultou em forte crescimento das trocas entre os quatro sócios, especialmente na primeira década em que o bloco foi criado.
Ao longo do tempo, é verdade, o peso relativo do MERCOSUL foi diminuindo em nosso comércio total. A corrente de comércio interna, que chegou a superar US$ 50 bilhões por ano, girou em torno de US$ 30 bilhões em 2019 e também em 2020.
Temos também dificuldades em gerar os consensos necessários para avançar de forma mais rápida em nossa agenda econômica e comercial, seja ela interna ou externa. Há uma percepção correta de que os ganhos são parciais e chegam, muitas vezes, de forma lenta. Isso é algo que temos apontado de forma permanente desde o início do governo do Presidente Jair Bolsonaro e que pretendemos modificar.
Precisamos superar uma inércia que nos impede de ir, muitas vezes, além de um mínimo denominador comum. Muitos problemas, porém, transcendem dificuldades do MERCOSUL. Estão relacionados ao fato de o bloco refletir, como é natural, a evolução dos ciclos econômicos em nossos países, e – verdade seja dita – temos, em muitos momentos, assistido a uma falta de sincronia desses ciclos entre nós, com impacto prejudicial na dinâmica integracionista.
Não poderia ser de outra maneira, os fenômenos macroeconômicos, como crises cambiais ou desequilíbrios fiscais, acabam tendo repercussão no processo de integração, ainda que suas raízes estejam fundamentalmente ligadas a questões domésticas e ao contexto internacional mais amplo. Até ouso dizer que isso não é uma característica apenas do MERCOSUL, mas sim dos processos de integração que vivemos e acompanhamos pelo mundo. Daí a importância de continuarmos a mirar o objetivo de coordenação macroeconômica, em uma estratégia gradual por sua complexidade e muito afetada pelos ciclos de crescimento e crise.
Há, também, o desafio relacionado às assimetrias existentes entre os países da região. O êxito de um processo de integração mede-se pela eliminação de barreiras tarifárias e não tarifárias, mas também pela elaboração e implementação de políticas setoriais comuns. É uma tarefa que desafia processos de integração mais antigos do que o próprio MERCOSUL.
Há que se reconhecer o papel desempenhado pelo Fundo de Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM), com seu histórico de financiamento de projetos voltados para a promoção do desenvolvimento econômico e social, em áreas como infraestrutura viária e energética, aumento da competitividade de nossas empresas, além de aperfeiçoamento e construção de moradias, escolas, hospitais e redes de saneamento.
No plano externo, vivemos hoje em um cenário radicalmente diferente daquele que tínhamos em fase inicial do processo de integração, com a ascensão da Ásia como um dos principais polos do comércio internacional.
Em 2020, o continente asiático foi o destino de 53% das exportações e 44% das importações do MERCOSUL. Somente a China absorveu cerca de 30% das vendas do bloco[1]. Duas décadas atrás, em 2000, o MERCOSUL exportava para a Ásia cerca de dez vezes menos[2]. Ou seja, é um novo mundo hoje.
Uma das questões que requer nossa atenção no seminário de hoje é justamente essa: como o MERCOSUL deve ajustar-se a essa nova realidade, tão diversa daquela que enfrentava há 30 anos?
Como devemos atuar, nesse contexto, para assegurar uma modernização e diversificação permanentes de nossa pauta exportadora?
Como todos sabem, a maior parte das exportações do Brasil e do MERCOSUL para a Ásia é de produtos primários, como soja, minério de ferro, petróleo e carne. Essa situação reflete a competitividade de nosso agronegócio, nosso compromisso com o desenvolvimento sustentável e o fato de que somos um dos principais centros fornecedores de alimentos para o mundo. Essa é uma posição que nos orgulha e cabe reforçar, inclusive mediante uma ação determinada no MERCOSUL e com o resto da nossa região.
Ao mesmo tempo, nos parece claro que é preciso equilibrar essa pauta, de forma que, o avanço externo do agronegócio se dê ao mesmo tempo em que nossa indústria de bens e serviços possa fortalecer sua competitividade, possa aumentar sua participação nas vendas globais.
Um aspecto crucial, nesse contexto, é que o comércio intra-MERCOSUL tem contado com significativa participação de produtos manufaturados, em especial em setores como o automotivo, o químico e o têxtil. Esse peso dos produtos intermediários no comércio com o MERCOSUL traduz em muitos casos uma dinâmica de integração produtiva, que é também outro ganho importante do bloco e que cabe aprofundar.
Quero até aproveitar a presença do Fabricio aqui para dizer que a CNI tem sido realmente um arauto dessa importante característica que acontece no comércio intra-bloco, que é justamente dos produtos intermediários do comércio, os produtos industriais.
Esse debate sobre o perfil de nosso comércio e dos encadeamentos produtivos regionais abre espaço para uma breve reflexão sobre as lições trazidas pela pandemia. Como vimos, um dos fatores centrais na dificuldade de enfrentar a crise sanitária foi a dependência que temos de número reduzido de fornecedores de insumos. Isso se aplicou inclusive à produção de vacinas.
Creio que podemos e devemos extrair dessa situação a lição de que precisamos fortalecer um complexo industrial capaz de lidar com crises semelhantes, no futuro, no campo da saúde e farmacêutico. Esse avanço só pode ocorrer por meio de aproximação entre as cadeias industriais de nossos países, estimulando agregação de valor e incentivando cooperação científica e tecnológica entre nossas instituições.
Reforço, por esse motivo, a importância do MERCOSUL como instrumento capaz de contribuir para a integração em setores cruciais da nossa economia. Somente por meio de um esforço comum desse escopo reduziremos nossa vulnerabilidade externa e ampliaremos nosso poder de inserção na economia mundial.
O processo de integração deve ser um fator fundamental para a preservação e o fortalecimento de nosso complexo industrial. Foi com esse objetivo que realizamos, com o apoio da CEPAL, a sétima edição do Fórum Empresarial do MERCOSUL, dedicado exclusivamente à integração regional no setor de fármacos. É uma mostra clara de como o MERCOSUL pode e deve participar da resposta aos desafios do nosso tempo.
Senhoras e senhores,
Senhor presidente,
O governo do Presidente Jair Bolsonaro tem um claro compromisso com a maior abertura e maior integração do Brasil às correntes globais de comércio e de investimentos. Um MERCOSUL renovado é uma parte incontornável desse projeto.
Todos sabemos que ressurgiram no período recente, em diversos pontos do planeta, tendências críticas à abertura comercial e em favor de posturas protecionistas. E é preciso que o nosso entorno mantenha-se livre do protecionismo. Estou convencido de que somente a partir de uma participação mais ativa no mundo poderemos responder melhor a desafios estruturais e conjunturais, inclusive no contexto da recuperação pós-pandemia.
Devemos sempre lembrar que a criação do MERCOSUL ocorreu ao abrigo da ideia de um regionalismo aberto. O objetivo central de nosso processo de integração sempre foi construir uma plataforma de fortalecimento da nossa posição nas negociações com outros parceiros. Assim, o isolamento está e sempre esteve fora dessa agenda.
É urgente, portanto, que o MERCOSUL se torne cada vez mais uma plataforma para a inserção competitiva de nossos países no mercado global. O bloco deve ser um instrumento que amplie nosso acesso às cadeias transnacionais de agregação de valor e diversifique os destinos de nossas exportações. O MERCOSUL desempenha um papel fundamental no combate ao protecionismo agrícola, que ainda hoje limita o pleno aproveitamento do nosso potencial exportador.
De outro modo, o bloco pode ficar para trás: deslocado de mercados para suas exportações; sufocado por gargalos na competividade de suas indústrias; e questionado por consumidores cada vez mais exigentes e insatisfeitos com a relação custo/benefício dos produtos ofertados na região.
Não é por outra razão que o governo do Presidente Bolsonaro buscou, desde seu início, dinamizar a agenda de negociações de acordos comerciais do MERCOSUL. Passamos a buscar acordos amplos e ambiciosos, que vão além das reduções tarifárias e tratam, também, de: investimentos; serviços; propriedade intelectual; medidas sanitárias e fitossanitárias; facilitação de comércio; desenvolvimento sustentável; entre muitos outros temas que contribuem para fortalecer os benefícios dessas novas parcerias e também sevem para ampliar a competitividade dos países do MERCOSUL.
Em 2019, concluímos em junho a negociação com a União Europeia e, em agosto, com a Associação Europeia de Livre Comércio, a EFTA, que são os primeiros acordos de livre comércio do MERCOSUL com países desenvolvidos. Continuamos trabalhando nas negociações com Canadá, Coreia do Sul, Líbano e Singapura. São rodadas negociadoras que, mesmo durante o período da pandemia, têm registrado avanços em videoconferências. Meu objetivo é que possamos concluí-las em 2022.
Também examinamos com nossos sócios do MERCOSUL a abertura de novas frentes com Indonésia e Vietnã e exploramos a aproximação comercial com outros parceiros na Ásia e na África. A diversificação de parceiros com diferentes perfis envolverá número mais amplo de setores econômicos, o que ajudará a difundir os efeitos positivos, tanto em nossa economia como também na geração de empregos no Brasil, e de uma rede ampla de acordos comerciais.
Ao olhar nossa vizinhança, cumpre mencionar uma conquista importante propiciada pelo MERCOSUL: por meio da rede de acordos comerciais que foi construída paulatinamente, temos, desde 2019, uma área de livre comércio de fato com a América do Sul. O MERCOSUL deu sua contribuição, assim, a que o próprio continente se integrasse cada vez mais.
É um esforço que levamos adiante sob diferentes formatos: como MERCOSUL, de forma bilateral, e também bloco a bloco, como demonstra o processo de aproximação entre o MERCOSUL e a Aliança do Pacífico.
Durante a presidência de turno do MERCOSUL, neste segundo semestre de 2021, estamos realizando reuniões das comissões responsáveis pelos acordos com Chile, Colômbia, Peru e Equador, além de encontro com a Aliança do Pacífico. Estamos, ao mesmo tempo, dando passos para ampliar a fronteira de liberalização com a América Central e o Caribe, começando com República Dominicana e El Salvador. Lembro, a proposito, que a América Central é uma região que, até o início da pandemia, importava, do mundo, cerca de US$ 100 bilhões ao ano.
No plano das relações bilaterais – do Brasil com os países da região –, não poderia deixar de citar a recente aprovação, pelo Congresso Nacional, do Acordo de Livre Comércio com o Chile e a implementação, em 2019, do Acordo de Livre Comércio Automotivo com o México.
O acordo com o Chile é o maior acordo bilateral já negociado pelo Brasil em temas não-tarifários, cujas disposições em temas como compras governamentais, facilitação de comércio, barreiras técnicas e comércio eletrônico pautaram a atuação do país nas negociações do MERCOSUL com a União Europeia e a EFTA.
Todas essas iniciativas, na América Latina e com o resto do mundo, são indicativas de nossa determinação em modernizar o Brasil e o MERCOSUL e em ampliar os seus laços com o mundo, em benefício de nossas empresas e de nossos cidadãos.
Dentro do MERCOSUL, também trabalhamos para reforçar o arcabouço de acordos e normas no campo econômico-comercial, com o mesmo objetivo de aumentar a competitividade e criar um ambiente mais propício aos negócios. Aí se inscreve, com destaque, o esforço, iniciado já em março de 2019, para revisar a Tarifa Externa Comum. Na sexta-feira, como sabem, o Brasil decidiu reduzir em 10% as alíquotas do imposto de importação aplicadas a 87% do universo tarifário de produtos. A decisão foi adotada ao amparo do Tratado de Montevidéu e busca atender a uma situação de urgência identificada pelo Ministério da Economia no enfrentamento dos efeitos da pandemia de COVID-19 sobre a vida e a saúde das pessoas. Trata-se de medida excepcional e temporária, que é plenamente compatível com nossas obrigações internacionais e que não prejudica nenhum de nossos parceiros.
Acho importante aproveitar esta oportunidade para ressaltar que o Brasil continua empenhado nas negociações sobre a TEC do MERCOSUL. Tanto assim que a medida adotada na última sexta-feira reflete o estado dos entendimentos que já havíamos alcançado preliminarmente com Argentina e Paraguai, e corresponde a um interesse que é compartilhado pelos quatro sócios. Se ainda nós não temos consenso, a dificuldade certamente não é em torno da TEC.
Senhoras e senhores,
Senhor presidente,
Encerro estas palavras destacando uma vez mais estarmos todos em um esforço modernizador comum, buscando preservar o MERCOSUL com uma estrutura institucional enxuta e um marco normativo adequado à nossa realidade.
É fundamental que o MERCOSUL possa implementar suas próprias normas com a agilidade necessária, resolvendo eventuais controvérsias de maneira imediata. É dessa institucionalidade que precisamos e pela qual trabalhamos para que o MERCOSUL possa desempenhar como deve o seu papel de acelerar nosso processo de integração e inserção na economia internacional, sem burocratizá-lo e sem gerar regras desnecessárias.
Nossa atuação deve-se pautar também pelo diálogo constante com o Congresso Nacional, com o setor privado e com a sociedade civil, que são forças vivas da integração.
Estou certo de que os debates de hoje terão como resultado novos esforços de reflexão sobre o futuro do MERCOSUL. É por meio desse esforço coletivo que teremos um MERCOSUL mais ajustado às necessidades e expectativas de nossas sociedades.
Agradeço, uma vez mais, a presença de todos e desejo uma excelente sessão de debates.
Muito obrigado.