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Discurso do Ministro Mauro Vieira por ocasião da IV Reunião de Presidentes dos Países Partes no Tratado de Cooperação Amazônica – Belém, 8 de agosto de 2023
Na preparação da reunião de Cúpula que tem lugar hoje e amanhã, os ministros dos Estados Partes no Tratado de Cooperação Amazônica mantivemos ontem dois encontros – primeiramente, entre nós e, depois, com representantes de países convidados e de organismos internacionais. Farei um breve relato dos entendimentos alcançados nos dois segmentos.
O primeiro ponto a destacar é que há muita convergência entre os oito países amazônicos. Todos queremos o desenvolvimento sustentável da Amazônia, que concilie conservação do bioma e da bacia, inclusão social, respeito aos direitos humanos e proteção de seus defensores, combate a ilícitos transnacionais, ação pelo clima, fomento de ciência, tecnologia e inovação, estímulo à bioeconomia, e valorização dos povos indígenas e comunidades tradicionais e seus conhecimentos ancestrais.
Esse encontro de perspectivas não se dá apenas no plano das ideias gerais. Coincidimos também sobre a necessidade de um enfoque operativo e pragmático para levá-las a termo. Sabemos que nossa atuação conjunta exige ações concretas e que essas ações devem ser empreendidas com sentido de urgência. Não podemos chegar ao ponto de não-retorno na Amazônia, quando a floresta, em função do desmatamento, não consegue mais se regenerar.
Para orientar-nos nessas ações, dispomos agora de um documento negociado, a Declaração de Belém, que será adotada hoje.
O texto resulta de amplas consultas em âmbitos nacionais e regionais que envolveram órgãos de Governo, academia, sociedade civil e comunidades indígenas e locais. Os governos dos oito países receberam contribuições importantes da sociedade civil no Encontro Técnico-Científico da Amazônia, promovido pelo Governo da Colômbia, em Letícia, em julho. As consultas à sociedade civil nas temáticas amazônicas culminaram nos Diálogos Amazônicos, que tiveram lugar nos últimos dias aqui em Belém.
E é este outro ponto de consonância entre nossos países, que foi reafirmado nas intervenções de vários Ministros: concordamos que é chegado o momento de haver maior participação da sociedade civil nos trabalhos da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, a OTCA.
Isso deve se dar por meio da criação de novas instâncias em sua estrutura, como o Foro das Cidades Amazônicas, o Observatório sobre a situação de defensores de direitos humanos, do meio ambiente e de povos indígenas. Por sua vez, representantes de nossos povos indígenas passarão a ter voz nos trabalhos na OTCA por meio do estabelecimento do Mecanismo Amazônico dos Povos Indígenas.
A Declaração de Belém responde a demandas das populações que vivem na região, a anseios dos povos de nossos oito países, assim como a expectativas de todo o mundo. Trata-se de uma nova agenda de cooperação abrangente e sua implementação será desafiadora.
Por essa razão, propusemos que as discussões entre os Ministros tivessem como foco o fortalecimento da OTCA. Nesse contexto de retomada da orientação regional e de lançamento de uma nova agenda comum de cooperação, caberá à OTCA um papel central. Assim evitamos a duplicação de esforços e a dispersão de recursos. Asseguramos, também, que os desafios comuns tenham tratamento transversal e continuado e que seja adequadamente conservada a memória das iniciativas e dos projetos realizados em âmbito regional. Mas, para que a OTCA esteja em condições de assimilar em seu programa de trabalho os mandatos emanados desta Cúpula, será necessário dotá-la de mais recursos financeiros e humanos.
O tema da busca de recursos financeiros foi considerado central para viabilizar a implementação desta nova agenda amazônica, de modo a tirar do papel nossas propostas. Precisamos avançar rapidamente na constituição de um mecanismo financeiro para atrair recursos não reembolsáveis para a Organização. Como muitos disseram, precisamos de uma OTCA robusta e com fortes mandatos para atuar em prol do desenvolvimento sustentável da região.
Para além de identificar fundos que viabilizem a execução de novos projetos, essa densa agenda de cooperação exigirá também a ampliação dos quadros da OTCA.
Em vista dessas considerações, acordamos convocar, com toda a possível brevidade, a próxima reunião de Ministros de Relações Exteriores da OTCA, instância política máxima prevista no Tratado de Cooperação Amazônica, que não se reúne desde 2017, ano do último encontro, no Equador. Temos de nos reunir para adotar as providências correspondentes para a implementação e incorporação progressiva das ações da Declaração de Belém aos trabalhos da OTCA, com a previsão de cronograma, prazos e meios de implementação. Acordamos que a Reunião de Ministros de Relações Exteriores permitirá também definir o processo sucessório da direção da Organização.
Senhores Presidentes,
A Amazônia exige compromisso forte dos países da região, assim como da comunidade internacional. Além do envolvimento ativo de nossos países, será fundamental receber apoio externo, incluindo aportes técnicos e financeiros, para ações firmes e em larga escala para evitar que a floresta chegue ao ponto de não-retorno. Por essa razão, mantivemos também, na tarde de ontem, um encontro com representantes de países amigos, organismos multilaterais, entidades financeiras e de cooperação para convidá-los a unir esforços com nossos países nesta nova agenda de cooperação amazônica.
De maneira a racionalizar a cooperação que é prestada na Amazônia, indicamos aos atores externos com incidência na Amazônia que a OTCA deve ser a plataforma prioritária para atuação conjunta na região. Avaliamos, que no âmbito regional, a cooperação internacional deve privilegiar parcerias com a OTCA, e que sua contribuição será fundamental no contexto de criação do mecanismo financeiro da Organização.
Os atores da cooperação internacional apresentaram as iniciativas que já vêm apoiando na Amazônia, com recursos técnicos e financeiros, em áreas como transição energética, biodiversidade, combate à fome e combate à mudança do clima e ao desmatamento. Expressaram entusiasmo com a realização da Cúpula como sinal importante da vontade política dos oito países em avançar na implementação de uma agenda ambiciosa de cooperação amazônica. Saudaram, nesse contexto, a decisão de fortalecer a OTCA e sua Secretaria Permanente. Manifestaram, de forma unânime, toda disposição em apoiar os esforços dos nossos países em prol da Amazônia. Nesse contexto, registramos com satisfação o lançamento do programa Amazônia Sempre, do Banco Interamericano em Desenvolvimento (BID). Esse é um programa amplo, mandatado pelos Ministros de Planejamento e da Fazenda dos países da região membros do BID, que constitui importante fonte de coordenação e financiamento.
Com os Ministros e representantes de países em desenvolvimento com florestas tropicais de outras regiões do mundo – a República Democrática do Congo, a República do Congo e a Indonésia –, identificamos convergências que nos habilitam a iniciar um processo de construção de posições coordenadas, a serem levadas às negociações multilaterais em temáticas ambientais, a começar pela COP-28 do Clima, a se realizar este ano nos Emirados Árabes Unidos. Conclamamos os países desenvolvidos a cumprirem suas metas de financiamento aos países em desenvolvimento, nas áreas de clima e biodiversidade, em contexto caracterizado pelo agravamento das múltiplas crises planetárias, aliás não só ambientais, mas também referentes à desigualdade, à fome e à pobreza. Os nossos colegas da República do Congo, da República Democrática do Congo e da Indonésia indicaram também interesse em estreitar o diálogo para conhecer a experiência amazônica de integração regional, que poderá vir a ser exemplo para arranjos semelhantes em outras próprias bacias.
Em resumo, foram estes os principais assuntos de que tratamos ontem. O debate dos senhores presidentes no dia de hoje, por sua vez, terá enorme importância para orientar as ações dos Governos e das Chancelarias, em particular, no processo de implementação dessa nova agenda comum de cooperação na Amazônia, conformada pela Declaração de Belém, a ser adotada ao final do dia de hoje.
Muito obrigado.