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Discurso do Ministro Ernesto Araújo na Reunião Plenária do Conselho Empresarial Brasil-EUA (CEBEU)
Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, na Reunião Plenária do Conselho Empresarial Brasil-EUA – CEBEU (02/12/2020)
Queridos amigos,
Membros do Conselho Empresarial Brasil-Estados Unidos (CEBEU), membros do que poderíamos chamar comunidade empresarial e governamental Brasil-Estados Unidos, da qual, se me permitem, considero-me um membro honorário,
Senhores convidados à 38ª Reunião Plenária do CEBEU,
É um grande prazer, uma grande alegria, para mim, dirigir-me novamente aos senhores neste evento que congrega as duas seções deste Conselho. Lamento não poder estar presente em tempo real com os senhores em função de um compromisso onde acompanho o Senhor Presidente da República, mas queria destacar que este ano de 2020 foi muito produtivo no âmbito das relações econômicas e comerciais entre o Brasil e os Estados Unidos. Nessas relações, não houve lockdown, por dizer assim. Nós conquistamos importantes resultados concretos, vários deles há muito tempo esperados, inclusive, por todos nós aqui desta comunidade, do setor privado e do governo, que acreditamos no extraordinário potencial dessa parceria Brasil-Estados Unidos. São realizações que não seriam possíveis sem o trabalho incansável do CEBEU. Este Conselho, desde 1976, cumpre a tarefa de apontar rumos para que o setor público desenvolva plenamente o potencial do diálogo, cooperação, comércio e investimentos entre essas duas grandes nações e grandes economias.
Queria apontar um número, entretanto, que nos deve dar um pouco o que pensar, que é o seguinte: de janeiro a outubro deste ano de 2020, as exportações do Brasil para os Estados Unidos representaram 9,8% do total exportado pelo Brasil. No ano 2000, esse número era 25%. Vinte anos atrás, portanto, 25% das nossas exportações iam para os Estados Unidos. Essa queda foi resultado, por um lado, certamente, de novas condições, de novas estruturas do comércio mundial, mas acredito que também de políticas equivocadas, sobretudo por parte do Brasil. Houve um longo tempo em que se acreditava que os Estados Unidos não deveriam mais ser um parceiro fundamental do Brasil e que nós poderíamos – ou até deveríamos, nessa visão – desenvolver-nos sem uma parceria com os Estados Unidos. Acho que isso – fica bastante claro – não deu certo. Não deu certo essa visão de ignorar os Estados Unidos na nossa estratégia econômica, comercial, política e em todas as frentes. E estamos tirando esse atraso. Essa estratégia sem Estados Unidos resultou em estagnação econômica, ou mesmo decréscimo econômico, perda de capacidade, sobretudo no setor industrial e de alta tecnologia, perda da presença brasileira nas cadeias globais de suprimento, entre outros problemas.
É certo que os Estados Unidos permanecem como o principal destino das exportações brasileiras de manufaturados e principal origem de investimentos estrangeiros no Brasil. Mas é preciso fazer muito mais. E hoje, o que nós vemos é uma recuperação da relação bilateral Brasil-Estados Unidos em todas as frentes. Nessa frente econômico-comercial e de investimentos, certamente, mas também na frente política, na frente do diálogo, na frente da nossa visão de mundo. Eu poderia dizer que Brasil e Estados Unidos estão tornando-se os parceiros na dimensão econômico-comercial que queremos ser porque também estamos voltando a ser os parceiros em todos os domínios: na promoção da democracia, por exemplo, na promoção das liberdades fundamentais. Nós temos a convicção compartilhada entre os dois países de que liberdade econômica e liberdade política são fundamentais uma para a outra.
No plano nacional, os Estados Unidos estão contribuindo para um processo que, além de ser a abertura da economia brasileira, a recapacitação industrial e tecnológica, é também um processo de transformação, um processo de consolidação efetiva da nossa democracia, das nossas liberdades, da nossa democracia entendida como um sistema onde todo o poder emana do povo.
No plano mundial, estamos trabalhando juntos, no fundo, pela liberdade. Eu acho que estamos em um momento no qual é preciso que, em todos os fóruns internacionais, seja o Sistema das Nações Unidas, ou em qualquer outro, as palavras “liberdade” e “democracia” deixem de ser palavras que não se podem mencionar. Estranhamente, depois de trinta anos de globalização, chegamos a esse ponto de que, quando se pronuncia a palavra “liberdade” nos fóruns internacionais, é como se fosse às vezes quase uma palavra feia. Brasil-Estados Unidos pronunciam essa palavra, porque acreditamos nela e queremos que a liberdade seja novamente o centro da globalização.
Em março deste ano, durante a visita do Presidente Jair Bolsonaro à Flórida, tivemos um momento simbólico na esteira do encontro com o Presidente Donald Trump em Mar-a-Lago, quando essa comunidade de visões foi concretizada na assinatura do acordo bilateral referente a projetos de pesquisa, desenvolvimento, teste e avaliação, o chamado Acordo RDT&E. Trata-se, como os senhores sabem, de um acordo que facilita o financiamento de pesquisa e desenvolvimento no campo militar e contribui para alcançarmos um novo patamar, como estamos alcançando, de relacionamento entre as Forças Armadas dos dois países; e, não menos importante, maior integração no desenvolvimento conjunto de produtos de defesa.
Agora em setembro, o Brasil organizou a 11ª Reunião do Fórum de Altos Executivos Brasil-Estados Unidos, o CEO Fórum. Em razão da pandemia, a edição deste ano foi virtual, mas, a despeito das limitações impostas, o Fórum confirmou a relevância atribuída pelos governos à parceria com o setor privado.
Em outubro, celebramos, durante a visita do Conselheiro de Segurança Nacional, Robert O’Brien, o Protocolo ao Acordo de Comércio e Cooperação Econômica Brasil-Estados Unidos (ATEC) Relacionado a Regras Comerciais e de Transparência. É um marco expressivo nas relações bilaterais e uma demanda histórica dos setores privados norte-americano e brasileiro. Esses acordos na área de facilitação de comércio e também de combate à corrupção mostram a centralidade na parceria Brasil e Estados Unidos no processo de transformação que o Brasil está vivendo, que é justamente um processo que tem, entre seus pilares, a facilitação de negócios, a simplificação, a desburocratização e o combate intransigente à corrupção.
Na última década, os únicos entendimentos econômico--comerciais celebrados tinham sido sobre pontos muito específicos, e carecíamos desses passos mais ambiciosos que estamos atingindo. Mesmo no contexto da pandemia, as nossas equipes negociadoras, coordenadas, de um lado, pelo Itamaraty e, de outro, pelo Escritório do Representante Comercial (USTR), conseguiram em tempo recorde fechar textos inovadores. Com certeza, esses documentos serão referência em suas respectivas áreas para entendimentos futuros.
Se me permitem, falarei rapidamente dos três anexos do Protocolo ao ATEC: facilitação do comércio e administração aduaneira; boas práticas regulatórias; e anticorrupção. No primeiro anexo, nós temos o texto mais avançado negociado nessa área pelo Brasil, de facilitação de comércio, e um dos capítulos mais ambiciosos negociados em âmbito internacional, ultrapassando em diversos aspectos aquele estabelecido no Acordo sobre a Facilitação do Comércio da OMC. No anexo sobre boas práticas regulatórias, temos não só o primeiro acordo com cláusulas vinculantes adotado pelo Brasil nesse campo, mas também o primeiro instrumento na área a utilizar, como referência, o Acordo Estados Unidos, México e Canadá (USMCA). E o terceiro anexo, sobre dispositivos anticorrupção, consolida esforço conjunto de conferir maior transparência para o ambiente econômico no qual operam empresários dos dois países.
Em suma, esse Protocolo ao ATEC relacionado a regras comerciais e de transparência constitui um passo crucial rumo à maior fluidez nas trocas comerciais entre Brasil e Estados Unidos, além de ser um elemento de aproximação entre autoridades públicas reguladoras dos dois governos.
Em paralelo, a abertura de linhas de crédito a empresas brasileiras, anunciadas pelo Conselheiro de Segurança Nacional dos Estados Unidos, quando na sua passagem por São Paulo, em 19 de outubro, ilustra a força da nossa relação. Os Estados Unidos repassarão cerca de 400 milhões de dólares ao banco Itaú para que conceda crédito a pequenas e médias empresas afetadas pela pandemia e 300 milhões de dólares adicionais serão liberados para ampliar o apoio do banco BTG Pactual às pequenas e médias empresas. Outros financiamentos norte-americanos terão por destino projeto de iluminação pública no Rio de Janeiro.
Poderia mencionar ainda inúmeros outros avanços, o mais recente dos quais, poucas semanas atrás, foi a criação do Grupo de Trabalho sobre Minerais Estratégicos, no quadro da visita que fez a Brasília o Subsecretário para o Crescimento Econômico, Energia e Meio Ambiente do Departamento de Estado, Keith Krach. Além disso, adotamos, nessa mesma ocasião, em conjunto com o Ministério do Meio Ambiente – o Ministro Ricardo Sales esteve aqui conosco no Itamaraty, na adoção desse instrumento –, uma declaração que cria o Diálogo Ambiental Brasil-Estados Unidos, centrado não só na dimensão da proteção ambiental, mas também na promoção de investimentos em desenvolvimento sustentável, uma vez que temos cada vez mais a convicção de que, para contemplar tudo o que nós queremos fazer em termos de meio ambiente e para cumprir aqueles compromissos que o Brasil tem e reitera na área de meio ambiente, nós precisamos não só da dimensão da proteção ambiental e da conservação, mas também do investimento em empregos verdes, em desenvolvimento limpo, sobretudo na Amazônia.
Além desse conjunto de iniciativas, todas elas muito promissoras, lançamos, nos últimos meses, outras com impacto econômico também nos setores aeroespacial, de infraestrutura, de ciência e tecnologia, de combate à pirataria e de energia. Para dar um exemplo, nesse último tema, nós intensificamos o diálogo com os Estados Unidos por meio da criação do Fórum de Energia Brasil-Estados Unidos (USBEF, na sigla em inglês). O Fórum começou a atuar em fevereiro deste ano e conta com três áreas prioritárias no seu plano de ação: energia nuclear; petróleo e gás; e eficiência energética do setor elétrico. No final de outubro, realizou-se, em modo virtual, workshop sobre o mercado de gás natural e seus aspectos econômicos, logísticos e jurídicos no Brasil e nos Estados Unidos. Estamos mantendo com os nossos amigos americanos uma colaboração valiosa no processo de reforma do setor energético brasileiro, com foco no aumento da participação de investimentos privados.
Isso é sempre importante que se repita: nós estamos avançando cada vez mais na criação de um novo ciclo de crescimento no Brasil, o primeiro ciclo de crescimento baseado no investimento privado. Portanto, esperamos, o primeiro que será sustentável. Todos os ciclos de crescimento anteriores, baseados em investimento estatal, em estatização da economia, viveram o seu ciclo de maneira muito rápida e não tiveram todos os benefícios que se esperava. Esperamos que este, agora, seja um ciclo muito mais longo, que permaneça e proporcione mudanças estruturais na economia brasileira. Sempre, também, naquele conceito de que a liberdade econômica favorece a liberdade política, e a liberdade política favorece a liberdade econômica.
Portanto, já fizemos muito, e faremos ainda mais, tenho certeza. Eu queria reiterar o nosso compromisso, do governo brasileiro, de buscar aprofundar a parceria com os Estados Unidos, um país com o qual nós compartilhamos princípios centrais não só para a prosperidade, mas também para a dignidade humana: democracia, liberdades fundamentais, Estado de Direito e economia de mercado.
Outro ponto importante é o continuado e enfático apoio dos Estados Unidos ao ingresso do Brasil na OCDE, uma parte muito importante desse nosso projeto de reestruturação da economia brasileira e também, tenho certeza, um passo importante para a própria OCDE. O ingresso do Brasil nessa Organização significará o ingresso de uma grande economia, que hoje traz todo esse entusiasmo que todos nós temos no rumo da criação de uma verdadeira economia de mercado e na defesa daqueles que são também valores fundamentais da OCDE: liberdade, democracia (nunca é demais que se diga).
No campo bilateral, para voltar também à dimensão concreta daquilo que nós estamos fazendo, prosseguimos a tratativa de um acordo de reconhecimento mútuo de operadores econômicos autorizados, negociações que permitirão criar um canal rápido para a importação e exportação de produtos, reduzindo custos para as empresas dos dois países. Além disso, estamos trabalhando para a plena participação do Brasil no Program Global Entry de viajantes pré-autorizados.
Acho que aqui tive a oportunidade de colocar exemplos, tanto de iniciativas concretas, específicas, quanto de um grande desenho dessa nova relação Brasil-Estados Unidos, que se encaixa com esse novo desenho que nós queremos para o Brasil, de um país que renova a sua esperança em torno da prosperidade, da liberdade. E o CEBEU, bem como toda a comunidade (volto a citar esse conceito, se posso) governamental e empresarial Brasil-Estados Unidos tem um papel-chave nessa construção desse novo Brasil e de um novo papel do Brasil no próprio cenário internacional.
Muito obrigado.