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Discurso do Ministro Ernesto Araújo na Reunião Ministerial sobre Liberdade de Religião ou Crença
Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, na Reunião Ministerial sobre Liberdade de Religião ou Crença – 16/11/2020*
Bom dia, boa tarde, boa noite a todos,
Gostaria, em primeiro lugar, de cumprimentar o Ministro Zbigniew Rau e a Polônia por organizarem esta tão importante sessão. Também gostaria de saudar as palavras do Secretário Mike Pompeo.
Caros colegas, Ministros e Secretários de Estado das Relações Exteriores, Embaixadores, senhoras e senhores,
Tenho a honra de representar o Brasil nesta assembleia de nações reunidas em torno da causa da liberdade religiosa. Infelizmente, existem muitos motivos para as nações se preocuparem com o assunto.
As minorias religiosas continuam a ser oprimidas em todo o mundo, seja oficialmente, pelas autoridades, seja por formas mais difusas de opressão em suas sociedades. A comunidade internacional deve enfrentar os abusos contra todas as religiões. O Brasil não se esquivará dessa tarefa urgente.
Nenhuma fé está a salvo da intolerância e da perseguição, e os cristãos estão entre suas principais vítimas. Infelizmente, temos visto episódios contínuos de ódio e violência contra os cristãos em todos os hemisférios e continentes. De acordo com pesquisas recentes, oito cristãos são mortos diariamente em todo o mundo devido a sua fé.
No entanto, os atos de violência contra cristãos e pessoas de qualquer outra religião não são a única razão pela qual devemos nos dedicar à proteção da liberdade religiosa. Há uma ameaça mais sutil, mas não menos perniciosa, que nos cerca e também merece atenção. Em 1968, o então recentemente nomeado Cardeal Karol Wojtyla escreveu: “O mal de nossos tempos consiste, em primeiro lugar, numa espécie de degradação, na verdade, numa pulverização da singularidade fundamental de cada pessoa humana”.
A urgência do aviso de São João Paulo II aumentou desde então. Em nossa era de inteligência artificial e Big Data, o espírito humano deve se esforçar para evitar ser reduzido a seres subservientes. A liberdade religiosa é fundamental para garantir a integridade e a profundidade da dimensão espiritual da humanidade.
O desafio de proteger a liberdade religiosa deve começar por reconhecer e reafirmar que a dimensão espiritual faz parte do ser humano. A liberdade religiosa significa a preservação daquele espaço, a defesa daquele território sagrado em nossa alma. As pessoas só podem ser livres na medida em que preservem a dimensão espiritual interior. O materialismo não é compatível com sociedades livres. A concepção materialista do mundo e da vida encerra o ser humano em uma prisão de impulso e satisfação sem nenhuma aspiração mais elevada, tornando-o presa fácil dos ditames políticos do momento.
Os freios e contrapesos, em uma perspectiva horizontal entre diferentes instituições, não são suficientes para construir sociedades livres. Apenas os freios e contrapesos verticais, fornecidos pela dimensão espiritual, podem criar a verdadeira liberdade. Somente se puder se comunicar com o que está acima e além o ser humano poderá escapar do ciclo de controle e opressão.
A religião com a qual estou, é claro, mais familiarizado – o cristianismo – é basicamente uma busca pela libertação. A verdade como meio para a liberdade: esse é possivelmente o conceito filosófico central do cristianismo. Mas estou certo de que outras religiões têm apego igualmente importante à liberdade como algo central para a dignidade humana. A infinita dignidade de cada ser humano não foi inventada pelos filósofos do século XVIII. Não foi criada pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948. Esteve presente, desde o início, no cristianismo, islamismo, judaísmo, budismo, hinduísmo e outras religiões.
A liberdade religiosa não é algo que a sociedade democrática deveria apenas tolerar, como se a religião fosse apenas um corpo estranho. Religião, fé e vida espiritual devem ser consideradas fundamentais para a democracia. A liberdade está no cerne da Declaração Universal dos Direitos Humanos, uma pedra angular do nosso mundo, porque já existia no coração e no espírito humanos, e devemos viver de acordo com esses ideais.
Liberdade de pensamento, liberdade de consciência, liberdade de expressão, liberdade de religião, todas as liberdades consagradas na Declaração Universal dos Direitos Humanos estão mutuamente arraigadas e são mutuamente interdependentes. A liberdade religiosa não deve ser uma consideração secundária e tardia. A liberdade religiosa é essencial para a liberdade como um todo.
Muito obrigado.
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* Fonte: Ministério das Relações Exteriores