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Discurso do Ministro Ernesto Araújo na LVI Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum (CMC) – sessão vespertina
Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, na LVI Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum (CMC) – sessão vespertina (01/07/2020)*
Muito obrigado, Chanceler Antonio Rivas.
Senhores Chanceleres, Ministros, todas as autoridades, senhoras e senhores,
Vivemos aqui um momento particularmente desafiador para os processos de integração regional. Sabemos que muitas das soluções para os problemas enfrentados no momento e em um futuro próximo terão que ser conjuntas, baseadas na cooperação. Num primeiro momento, perante a ameaça inédita da COVID-19, tivemos que reagir individualmente, de forma isolada, para responder de forma rápida aos desafios existentes em cada um dos nossos países. Não houve tempo para respostas coordenadas ou para negociar soluções comuns. Foi preciso privilegiar as prioridades internas. Isso é perfeitamente compreensível e não deve ser motivo para que diminuamos nosso empenho em trabalhar juntos.
No caso específico do MERCOSUL, nós, os países membros, apesar das respostas individuais e nacionais e de forma coerente com elas, mantivemos reunião presidencial extraordinária do bloco, ocasião em que discutimos como responder à pandemia e, logo em seguida, com grande destaque, acordamos destinar US$ 15 milhões do Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM) aos esforços nacionais de combate à pandemia. Outro exemplo que demonstra a nossa capacidade de resposta e o potencial da cooperação regional foi o processo de repatriação de nacionais. Graças ao diálogo e à cooperação, conseguimos unir esforços e trazer mais nacionais de volta para casa das mais diferentes origens. Foi um processo muito bem-sucedido de multiplicação de recursos existentes. No caso do Brasil, já foram mais de 33 mil brasileiros repatriados do exterior, muitos dos quais originários de países da região aqui representados. Também apoiamos o retorno de milhares de nacionais de outros países da região que se encontravam no Brasil ou que necessitavam passar pelo nosso território em trânsito rumo a seus países. O Brasil, lembro, foi um dos países que por mais tempo deixou suas fronteiras abertas, seus aeroportos abertos, facilitando o processo de repatriação de cidadãos de países amigos.
Tivemos também várias experiências de cooperação na fronteira. Em alguns casos, a partir do contato direto de nossas autoridades locais para enfrentar problemas urgentes e muito específicos. Em outros casos, resultado de contatos diretos entre nossas chancelarias. Eu, pessoalmente, tive o prazer de coordenar com vários chanceleres dos países aqui presentes e sob diferentes aspectos dessa cooperação com os países fronteiriços e igualmente com o Chile, país com o qual não compartilhamos fronteira, mas com o qual tivemos excelente cooperação no nível de chanceleres. E aqui saúdo o Chanceler Teodoro Ribeira, que vejo aqui, igualmente a Bolívia, também queria saudar a Chanceler Karen Longaric e todos os demais chanceleres do MERCOSUL e de países-membros propriamente. O importante foi sempre, para nós, manter a capacidade de responder às emergências com criatividade e flexibilidade, como soubemos fazer no caso do Brasil, perante pedido de países vizinhos para que, por exemplo, doentes graves viessem fazer tratamentos médicos nos hospitais do Brasil. Portanto, o Brasil já estruturou diálogos bilaterais sobre cooperação fronteiriça para lidar com os termos da COVID-19 com vários países aqui presentes, Colômbia, Peru, Uruguai, resolvemos questões específicas relativas aos temas da repatriação com Argentina, Paraguai e vários outros países.
No caso específico de Argentina e Paraguai, durante a pandemia, fomos capazes de resolver em conjunto questões relativas à crise hídrica, impacto importante tanto pela resposta específica à pandemia como para superar a crise econômica. Em termos regionais, realizamos também várias reuniões com os países--membros do Foro para o Progresso e Integração da América do Sul (PROSUL), sob a coordenação chilena, mostrando que esse órgão de integração regional já começa a comprovar sua utilidade. Estou certo de que a nossa cooperação e coordenação só vão aumentar, espero que, no tema central da vacina, o Brasil possa também prestar cooperação a partir dos seus centros de excelência.
Caros colegas, o elevado estado de liberalização comercial na América do Sul constitui importante esteio para que a nossa região atravesse, em melhores condições, a crise econômica mundial em curso. Para fazer frente aos desafios que se desenham, é necessário manter a dinâmica de modernização dos nossos acordos regionais de comércio e fortalecer a integração com o resto do mundo. A recuperação econômica beneficiar-se-á do crescimento do nosso comércio e dos investimentos, da diversificação das exportações e da nossa integração às cadeias regionais e globais de valor. Na América Latina e Caribe, seguimos aprofundando a nossa rede de acordos, seja por meio da expansão daqueles que já possuímos, enquanto MERCOSUL, seja negociando novos acordos pela via bilateral. Por exemplo, os congressos do Brasil e do Chile já estão analisando o acordo de livre comércio bilateral, firmado em 2018. Trabalhamos para que esteja vigente nos próximos meses e possa constituir elemento adicional de apoio ao enfrentamento dos desafios econômicos desses meses. É o nosso acordo mais abrangente e moderno, em matérias não tarifárias, que desejamos que sirva de exemplo para outras negociações do Brasil com países da região.
O Brasil e o MERCOSUL também apostam na aproximação com a Aliança do Pacífico. Queremos reforçar a dimensão negociadora dessa parceria, para que possa traduzir em ganhos concretos às discussões dos encontros técnicos nas várias áreas da agenda entre os blocos. O Brasil também está empenhado em concluir com o acordo de livre comércio com o México e que, de certo, produzirá sinergias muito significativas na relação com a Aliança do Pacífico. Outra prioridade é a negociação de acordos de livre comércio com países da América Central e Caribe, interessados na agenda de abertura e de integração comercial. Desejamos também aumentar os vínculos com a Guiana e o Suriname, com os quais hoje o Brasil possui acordos apenas limitados.
Quero também saudar o dinamismo que a presidência pro tempore paraguaia soube imprimir aos trabalhos em condições que estavam longe de ser as ideais. Nesse semestre que acabou, muitas das instâncias do MERCOSUL ampliado mantiveram o seu cronograma de reuniões tendo contado com o engajamento dos países associados. É fundamental dar seguimento às atividades das reuniões de Ministros e das reuniões especializadas, responsáveis por temas que impactam diretamente a vida do cidadão. Durante a nossa presidência pro tempore, insistimos na necessidade de orientar os nossos trabalhos nessa direção. Produzir resultados que sejam percebidos pelas pessoas como uma contribuição positiva do MERCOSUL em suas vidas. Ao longo de 2019, fomos capazes de alcançar diversos acordos em temas tão diversos como roaming de celulares e a cooperação policial, que atendiam àquele requisito, serem relevantes para as pessoas.
Quero sublinhar a importância que o Brasil atribui ao Plano de Ação do MERCOSUL de Combate à Corrupção. Desejamos poder adotá-lo em um futuro próximo. Trata-se de tema fundamental, que se beneficiará muito da participação dos Estados associados, no momento oportuno. Para o Brasil, o MERCOSUL, alinhado às nossas prioridades nacionais, deve seguir esse caminho, em sintonia com as necessidades concretas dos nossos cidadãos.
A pandemia da COVID-19 e a necessidade de adoção de medidas de isolamento social também trazem desafios à vida democrática, demandando cuidados especiais nos processos eleitorais, por exemplo. A democracia, como não nos cansamos de reiterar, é um pilar fundamental do MERCOSUL, condição essencial para a participação do bloco. Devemos assegurar que a vida democrática siga sem perturbações. Nesse contexto, não podemos deixar de notar que uma vez mais nos reunimos sem a participação dos nossos irmãos venezuelanos. É um sinal da persistência da intolerável situação de ditadura vivida naquele país. Ansiamos pelo dia em que voltaremos a contar com uma Venezuela democrática, aqui nessa mesa.
O MERCOSUL, a América do Sul, toda a América Latina tem a vocação de construir um grande espaço democrático com sociedades livres, dinâmicas, criativas e também um espaço de prosperidade, com economias competitivas e inclusivas. Realizar essa vocação é um permanente desafio para todos nós. Pois, lamentavelmente, existem na região forças que até hoje trabalham no sentido contrário, trabalham com sistemas geradores de pobreza, sistemas geradores de corrupção, baseados no narcotráfico, no crime organizado e no terrorismo. Necessitamos estar conscientes daquela vocação e desse desafio. O momento da pandemia não nos deve fazer esquecer essa vocação da nossa região. Essa é a nossa fortaleza.
Hoje, neste momento, o mundo está se reestruturando não mais sobre um eixo único, como foi o caso durante trinta anos, o eixo econômico, mas agora sobre dois eixos: o eixo econômico e o eixo democrático. A América Latina, com sua vocação democrática, pode contribuir muito para esse mundo que surge, onde prosperidade e liberdade se unirão. O Brasil trabalha hoje em todos os foros regionais, internacionais, plurilaterais, multilaterais, econômicos ou políticos para que o mundo pós-pandemia seja um mundo com mais liberdade, e não menos, um mundo com mais oportunidade de pleno desenvolvimento humano, e não menos. Seguiremos nessa linha. Queremos seguir em todos os âmbitos combatendo a corrupção, o crime, o totalitarismo, defendendo a liberdade, inclusive a liberdade de expressão, e a dignidade humana.
Caros colegas, ao terminar minhas palavras, quero fazer votos de muito êxito ao Uruguai nos trabalhos durante o próximo semestre e dizer que podem contar com o apoio do Brasil para que alcancemos juntos esse MERCOSUL que ambicionamos para os nossos povos e para essa América Latina plenamente consciente da sua vocação democrática.
A todos os colegas, foi um prazer revê-los aqui e faço votos de que a nossa próxima reunião possa ser presencial.
Muito obrigado!
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* Fonte: Canal do Itamaraty no Youtube