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Discurso do Ministro Ernesto Araújo na LVI Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum (CMC) – sessão matutina
Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, na LVI Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum (CMC) – sessão matutina (01/07/2020)*
Embaixador Antonio Rivas Palacios, Ministro das Relações Exteriores do Paraguai, no exercício da presidência pro tempore do Conselho do Mercado Comum,
Chanceler Ernesto Talvi, Ministro das Relações Exteriores do Uruguai,
Chanceler Felipe Solá, Ministro das Relações Exteriores, Comércio Internacional e Culto da República Argentina,
Ministro Benigno López Benítez, Ministro da Fazenda do Paraguai, em nome de quem cumprimento todos os demais Ministros membros deste Conselho,
Senhores Coordenadores Nacionais do Grupo do Mercado Comum,
Senhoras e Senhores Parlamentares do PARLASUL,
Senhora Fernanda Monte, Diretora da Secretaria do MERCOSUL, em nome de quem saúdo aos funcionários do MERCOSUL,
Senhoras e senhores, agradeço à presidência pro tempore paraguaia a convocação desta reunião do Conselho do Mercado Comum e a apresentação do Relatório Semestral de Atividades do MERCOSUL.
Chanceler Antonio Rivas, querido amigo, felicito toda a sua equipe pela eficiente condução dos trabalhos do MERCOSUL ao longo do semestre recém-encerrado diante de tantos desafios sem precedentes.
Gostaria de estar presente pessoalmente para poder apertar a mão e dar um abraço aos queridos colegas e amigos, chanceleres também, Ernesto Talvi e Filipe Solá, assim como o Chanceler Antonio Rivas.
As atividades do MERCOSUL infelizmente sofreram as consequências das restrições a que fomos todos submetidos pela pandemia. É uma situação realmente dramática pelo sofrimento e pelas mortes que a COVID-19 tem causado e pelo impacto verdadeiramente destrutivo sobre a economia.
O Brasil tem buscado conciliar ações de combate à pandemia e a retomada com segurança da atividade econômica. A evolução da doença em vários países, com distintos níveis de desenvolvimento, mostra que não há receitas-modelo. As respostas precisam adaptar-se às distintas realidades e à evolução da pandemia em cada país. No caso do Brasil, às diferentes realidades regionais e locais. Gostaria de recordar que no nosso sistema, e conforme decidido pela própria suprema corte brasileira, coube e cabe aos estados da federação a determinação das medidas de contenção da pandemia como quarentenas, etc.
Ao governo federal tem cabido, sobretudo, a tarefa de preservar o nível de atividade econômica, além de apoiar a preservação da saúde em todos os estados através do nosso sistema de saúde. Recordo que o governo federal brasileiro injetou mais de 15% do produto interno bruto (PIB) na economia após o início da pandemia, mais de US$ 200 bilhões gerando demanda, uma demanda que, em parte, se tem comunicado aos nossos parceiros do MERCOSUL pela via do comércio, de tal forma que tem também contribuído para o nível de atividade econômica dos demais países do bloco. No MERCOSUL, conseguimos, sob a liderança do Paraguai, preservar as atividades essenciais do bloco. Além disso, ainda que de forma modesta, executamos iniciativas do enfrentamento à COVID-19.
Caros colegas e amigos, desde o início do governo do Presidente Jair Bolsonaro, o Brasil tem defendido um MERCOSUL que esteja inequivocamente identificado com os princípios da democracia e da liberdade, um MERCOSUL que seja instrumento de progresso e prosperidade para os nossos povos, um MERCOSUL que cumpra efetivamente o seu papel de plataforma para uma inserção mais vantajosa das nossas economias na região e no mundo, que traga resultados concretos para os nossos cidadãos e seja percebido por eles como um bem tangível. Mesmo com todas as dificuldades e mudanças de cenário trazidas pela pandemia da COVID-19, o Brasil continua acreditando que os desafios lançados em janeiro de 2019 continuam válidos e não podemos perder o rumo.
O processo de integração havia passado anos derrapando. Poucos foram os resultados até o ano passado, e muitas pessoas no Brasil e nos demais países-membros do MERCOSUL questionaram o sentido e a razão de ser do bloco. De motor de integração, o projeto havia passado a ser visto como símbolo de imobilismo e de atraso, como um modelo ultrapassado e imperfeito.
Ao longo de 2019, mudamos o sinal do MERCOSUL, mudamos a realidade e a imagem do MERCOSUL no mundo e diante das nossas sociedades. A aceleração das negociações externas, com a conclusão das negociações com a União Europeia e com a Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA) mostrou aos nossos empresários, à nossa opinião pública e ao mundo que o MERCOSUL estava finalmente pronto para fazer parte da grande rede de acordos comerciais que rege e pauta o comércio internacional de bens e serviços, que o MERCOSUL é capaz de atuar de forma coordenada e eficiente para negociar acordos de última geração e que o nosso bloco havia finalmente entendido que o comércio é uma via de mão dupla, onde não se abrem novos mercados, nem se criam novas oportunidades, sem oferecer algum grau de reciprocidade.
Além disso, firmamos o conceito de que um acordo comercial não serve apenas para a abertura de mercados, mas também para a atração de investimentos e para o reposicionamento de nossos países nas cadeias globais de produção, um desafio ainda mais premente nos dias de hoje. Agora, nesse primeiro semestre de 2020, apesar de todas as dificuldades, creio que o balanço continua sendo positivo. Conseguimos, com cooperação e flexibilidade, fechar quase todas as pendências negociadoras com a União Europeia. Faltam muito poucos elementos, em termos de revisão legal e outros detalhes do acordo, e espero, muito sinceramente, que nossos coordenadores nacionais sejam capazes de fechar o texto do acordo e seus anexos com os negociadores europeus logo após o recesso de verão no Hemisfério Norte. Dessa forma, será possível buscar a assinatura do acordo durante a presidência uruguaia do MERCOSUL e alemã da União Europeia. O Brasil também espera que sejamos capazes de concluir o que falta para finalmente assinar o acordo com os membros da EFTA. Depois disso, partiremos para a fase de ratificação dos acordos. Estamos seguros que, embora complexa, como é a ratificação de qualquer grande acordo comercial, essa ratificação será obtida tanto em nossos países quanto nos países europeus, uma vez que ambos esses acordos criam vantagens para todos, o que será certamente percebido por todos os parlamentos envolvidos.
Nas demais negociações, o ritmo imposto pela pandemia nos deu mais tempo para definir entre nós o modus operandi do bloco. Como já declaramos, em repetidas ocasiões, o Brasil não tem problemas com o conceito de flexibilidade nem com a ideia de atualizar o MERCOSUL para responder aos distintos interesses e realidades dos seus membros. Nossos técnicos precisam encontrar caminhos para as dificuldades que se apresentam nessas discussões, pois é vital que retomemos à normalidade das negociações externas o quanto antes, para que o que encontramos a partir deste momento, assim como encontramos no primeiro semestre com a presidência paraguaia, e com a presidência entrante do Uruguai. Precisamos apresentar, o mais breve possível, as propostas de negociação com países da América Central e Caribe, nova fronteira regional da nossa liberalização comercial e precisamos também tornar mais concreta a agenda de aproximação com a Aliança do Pacífico.
Em relação aos parceiros extrarregionais, queremos avançar com as negociações com Canadá, Líbano, Singapura e Coreia. Queremos dar por concluídos os diálogos exploratórios com Vietnã e Indonésia até o final do ano. Ainda em 2020, o Brasil quer expandir o acordo comercial atualmente em vigor com Israel, que já conta com ampla cobertura, e também retomar as discussões com a Índia em busca de uma expansão significativa daquele acordo. O momento é este, e necessitamos encontrar os caminhos para aproveitar as gigantescas oportunidades que estão surgindo para os nossos países na nova estrutura da economia mundial que surge com a pandemia e após o fim da pandemia.
Caros colegas, se o plano externo do MERCOSUL recebeu um impulso renovador que precisava, no plano interno, os desafios permanecem. Está na hora de darmos sinais claros de que somos capazes de superar os obstáculos. Por esse motivo, noto com satisfação que, apesar de nossas diferenças, fomos capazes de preservar o trabalho de revisão da tarifa externa comum (TEC). É urgente rever, simplificar e harmonizar a TEC. Devemos realizar as reduções possíveis para que o MERCOSUL deixe de ser um dos campeões mundiais de tarifas altas. Também temos que completar a revisão do regime de origem do MERCOSUL, com a simplificação e adequação desse regime aos acordos comerciais recentemente concluídos. Tivemos desdobramentos positivos no processo de adequação do setor automotivo à união aduaneira. Essa tarefa está sendo facilitada pela densificação da rede de acordos bilaterais nesse setor entre os Estados partes. Nos últimos seis meses, entrou em vigor o novo acordo do Brasil e Argentina e concluiu-se o acordo inédito entre o Brasil e o Paraguai. Outro avanço digno de nota é a retomada das atividades sobre o setor açucareiro, visto que não se conversava a esse respeito há quase 20 anos, e conversar sobre esse tema já é um bom início. A falta de disposição sequer para conversar era um sintoma muito negativo para o bloco.
Como disse há pouco, o Brasil considera que a agenda de abertura do MERCOSUL ao mundo e de modernização interna do bloco continua sendo o melhor caminho para enfrentar os desafios de desenvolvimento dos nossos países. A chegada da pandemia simplesmente intensifica essa necessidade de transformação. Todos queremos manter mercados abertos, criar novas oportunidades para nossas economias, sinalizar que estamos prontos para integrar a cadeias regionais e globais de valor, que serão transformadas e já estão sendo reconfiguradas. Os desafios domésticos que enfrentamos em nossas economias têm que ser equacionados com mais comércio e investimentos entre nós e com o mundo e mediante a adoção de regras mais simples e modernas, não o contrário. Fizemos bastante no contexto da pandemia. Fomos capazes de aportar quase US$ 15 milhões para projeto do Fundo para a Convergência Estrutural do MERCOSUL (FOCEM) destinado a reforçar a capacidade dos nossos laboratórios para realizar testes de COVID-19. Foi uma medida ágil e oportuna, que demonstrou a utilidade de contarmos com esse instrumento financeiro ao qual o Brasil se orgulha de contribuir com 70% de seus fundos. Na integração bilateral, que também é importante neste contexto, permito-me destacar, o início da construção de duas novas pontes entre o Brasil e o Paraguai financiadas pelas empresas Itaipu Binacional, no contexto da necessária ampliação da integração de infraestrutura entre nossos países. A integração entre quaisquer dois países membros do MERCOSUL beneficia a todos nesse terreno da infraestrutura dada a estrutura de circulação de mercadorias entre nós, mas estou certo de que a melhor contribuição que o MERCOSUL pode dar ao enfrentamento da pandemia e suas consequências se dá nas negociações comerciais capazes de gerar crescimento, riqueza e emprego.
As consequências da pandemia acentuaram a importância das tecnologias modernas de comunicação para a vida em sociedade como estamos vendo aqui nesta reunião. O MERCOSUL só pôde continuar a funcionar devido ao uso maciço das videoconferências. É urgente, portanto, acelerarmos a adoção de medidas que estimulem e tornem mais fácil e seguro o recurso a tais instrumentos de comunicação.
Nessa mesma linha de valorizar as novas tecnologias e as novas fronteiras da inovação, ressalto a importância de concluirmos, com a possível brevidade, a negociação do nosso acordo de comércio eletrônico. Seria muito positivo também intensificar a implementação da agenda digital do MERCOSUL. O comércio eletrônico está mostrando-se absolutamente essencial para a manutenção de níveis mínimos de atividade econômica e certamente o será para uma robusta recuperação econômica. Essa dimensão do comércio, já tão importante antes, será, estamos seguros, absolutamente decisiva no enfrentamento da crise econômica e na superação da crise econômica gerada pela pandemia. Precisamos responder a esse novo desafio. Apenas para dar um exemplo, nos meses de maio e junho, as vendas de comércio eletrônico no Brasil foram 20% superiores ao mesmo período de 2019, ao dar uma ideia da dimensão do crescimento desse mercado.
Na frente institucional, a plena implementação da assinatura digital, que entrou em vigor este ano, dará maior agilidade ao processo decisório do bloco, mas não podemos parar por aí. Em 2019, colhemos importantes resultados de reforma institucional. Devemos preservar e perseverar em tais esforços para lograr um MERCOSUL mais eficiente e coerente, fazendo mais com menos que produza resultados e economize recursos dos nossos povos que pagam impostos e esperam eficiência no uso desses recursos.
Senhoras e senhores, Membros do Conselho, termino minha intervenção com os outros dois pilares que, além da nossa agenda econômica e comercial, sustentam nosso bloco. O pilar do recurso do cidadão e das medidas que tocam diretamente a vida das pessoas, primeiramente. Na Cúpula de Bento Gonçalves, fomos capazes de gerar vários avanços, particularmente na cooperação fronteiriça, segurança, educação e saúde. Agora creio que o desafio imediato será o de buscar medidas de reação aos efeitos da pandemia. Já temos, por exemplo, uma experiência bilateral muito exitosa com o Uruguai, na fronteira, o que talvez seja possível alcançar em outras iniciativas dessa linha e que digam respeito à reativação das atividades econômicas.
Outro pilar que sustenta o MERCOSUL é o da democracia. Hoje, a Venezuela constitui, sem sombra de dúvida, o principal desafio para a nossa região nessa dimensão. Isso apesar dos ingentes esforços que temos feito para contribuir para uma transição democrática daquele país e para o fim da tirania que o assola. É um desafio que o Brasil continuará a encarar no sentido de prioridade e é, infelizmente, um desafio que o MERCOSUL, até aqui, não conseguiu encarar como bloco. Também lamento que um país candidato, em processo de adesão, que é a Bolívia, tenha sofrido a impossibilidade de participar dos trabalhos do bloco ao longo deste primeiro semestre. O Brasil espera que essa situação possa ser logo revertida.
Ao concluir, quero expressar ao governo do Uruguai meus votos de êxito na condução dos trabalhos deste colegiado ao longo do próximo semestre. O governo brasileiro estará à disposição para prestar a máxima colaboração a suas iniciativas, que, estou certo, buscarão dar pleno cumprimento aos propósitos para os quais o MERCOSUL foi criado.
Muito obrigado.
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* Fonte: Canal do Itamaraty no Youtube