Notícias
Discurso do Ministro Ernesto Araújo na cerimônia de transmissão de cargo do Secretário-Geral das Relações Exteriores
Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Ernesto Araújo, na cerimônia de transmissão de cargo do Secretário-Geral das Relações Exteriores, em Brasília (03/01/2019)*
Muito bom dia!
Senhor Ministro Aloysio Nunes,
Senhores Embaixadores, Secretário-Geral, ex-Secretários-Gerais,
Senhores diplomatas, membros do corpo diplomático,
Queridos colegas,
Em primeiro lugar, queria pedir desculpas pelo atraso inteiramente motivado por mim, por essa cerimônia, pelo fato de que estava na primeira Reunião Ministerial convocada pelo Presidente Jair Bolsonaro, e tivemos mais de três horas de reunião e, evidentemente, sobretudo sendo a primeira, eu não podia deixar a reunião antes do término.
Queria começar só recordando uma experiência de quando era Terceiro-Secretário recém-formado, no Rio Branco, e estava em um daqueles plantões da Divisão de Comunicações que se faziam no Bolo de Noiva, à época. Eu devia ter uma semana de formado e recebi um telefonema de um Embaixador que estava em algum lugar do Oriente Médio, eu acho, que queria simplesmente perguntar: “O novo Secretário-Geral já tomou posse?” E eu, assim, nem sabia direito, na verdade; naquele dia que me dei conta da importância do Secretário-Geral para a Casa e, claro, em um tempo que não tinha Internet, mal tinha telefone, essa imagem, para mim, ficou muito gravada da preocupação de um Embaixador para saber se o novo Secretário-Geral já tinha tomado posse.
E pouco depois, pela primeira vez, eu vi ao vivo um Secretário‑Geral, que foi o meu sogro, não então sogro, Embaixador Seixas Corrêa, aqui na Secretaria-Geral, e foi um momento também de surgimento daquela, que se chama, em inglês, reverential awe, aquela sensação de que a gente está diante de uma figura que evidentemente vai além, simplesmente, daquele momento e que representa algo de fundamental.
A gente vai sempre aprendendo. Eu estou tentando sempre formular uma metáfora para entender os papéis que nós estamos, aqui, nesses poucos dias de exercício aqui do cargo. Nessa metáfora que eu imaginei, eu penso no Presidente da República como arquiteto, no Ministro como o engenheiro e no Secretário-Geral como mestre de obras. E a meu ver, a mentalidade que nos deve governar aqui deve ser essa da construção de um edifício, e não da simples administração e um edifício já existente. Nessa nossa política externa, que pretendemos implementar, devemos ter essa mentalidade de que estamos construindo algo, e não simplesmente administrando.
E, mais do que isso – isso é algo que eu já tinha percebido, mas que trago de maneira muito marcante dessa primeira Reunião Ministerial –, que esse edifício é parte de um complexo maior. Não é uma casa no meio do campo. Ele é parte de um projeto arquitetônico maior, e não algo isolado. É parte de um governo que tem uma característica de coesão e de articulação interna que, pelas pessoas que têm, evidentemente, mais experiência, não se conhecia anteriormente.
Para usar mais uma metáfora, eu diria que a participação do Itamaraty (como de qualquer outro órgão, mas, no nosso caso, a participação do Itamaraty) nesse governo, não é um jogo de tênis; é um jogo de rugby. Nós não vamos estar jogando isoladamente, mas com aquela necessidade de espírito de equipe e de articulação conjunta.
Queria transmitir o agradecimento de toda a Casa, muito sincero, ao Embaixador Marcos Galvão, pelo seu exercício brilhante da Secretaria-Geral durante esses mais de dois anos, quase três. O Embaixador Marcos Galvão assumiu esse posto e tranquilizou o Itamaraty em um momento difícil, após o impeachment. Trabalhou com dois Ministros de fora da carreira, o que sempre é um desafio diferente para um diplomata, evidentemente. Claro que teve o benefício de ter dois excelentes Ministros, ambos os quais se mostraram, também, diplomatas natos e membros desta Casa, assim como os diplomatas de carreira. O Embaixador Marcos Galvão assegurou o funcionamento material da Casa e deu-lhe coerência política de maneira admirável durante esse período. Sempre com orientação segura, sempre presente em todas as áreas, sempre acessível, sempre com a sua extraordinária capacidade de ação e de análise.
Eu só queria referir-me a um caso específico, que me marcou muito, que foi na Reunião Ministerial da OEA, em Cancún, onde o Embaixador Marcos Galvão estava atuando como Ministro interino e fez um discurso emocionante em defesa da democracia na Venezuela, e em defesa da democracia em geral. Algo que, realmente, eu estava na fila de trás, evidentemente, e fiquei arrepiado, e tive a oportunidade de dizer isso a ele na ocasião. E até hoje, no tratamento desse tema da Venezuela, aquele discurso que foi de improviso, que foi uma coisa do coração, é algo que me inspira. Desejo ao Embaixador Marcos Galvão, e a toda sua família, muito êxito em seu posto em Bruxelas e que conte comigo e com toda a Casa para o bom exercício de sua nova missão.
Quero, então, saudar de maneira muito especial, muito afetuosa, muito profunda o Embaixador Otávio Brandelli, que assume a Secretaria-Geral. Otávio é, antes de mais nada, um amigo. Nós ficamos amigos, sobretudo, quando servimos, justamente, em Bruxelas, e até hoje nós rimos dos mesmos trocadilhos que formulamos naquela época (temos novos, mas ainda nos lembramos daqueles trocadilhos), mas, às vezes, eu olho para o Otávio e já sei o que ele está pensando, qual é o trocadilho de que ele está se lembrando, e acho que a recíproca é verdadeira. A amizade da Maria Eduarda eminha com o Otávio e Rosa é uma permanente fonte de alegria, tranquilidade e inspiração para nós.
Otávio é um dos diplomatas mais competentes da nossa geração – e de qualquer geração, eu diria. É um diplomata que não é só diplomata; que sempre soube olhar para fora; sempre soube pensar o Itamaraty a partir do Brasil, e não o Brasil a partir do Itamaraty. Otávio é um diplomata que faz acontecer, é um gestor brilhante, extraordinário. Mostrou isso na sua atuação no Departamento do MERCOSUL, assim como em seu exercício da presidência no Instituto Nacional de Propriedade Intelectual, e em tantas outras funções. Ao mesmo tempo, é um formulador, é um diplomata que sempre consegue extrair soluções de qualquer problema, sempre uma solução criativa, de uma maneira pertinente e que vai além do momento, sempre com uma visão estratégica extraordinária.
Otávio, assim como eu, é alguém que ama essa instituição, que ama o Itamaraty e que, por isso mesmo, sente que precisamos mudar algumas coisas para que ela continue sendo um sustentáculo e uma coluna inabalável deste edifício que nós estamos construindo no Brasil.
Para terminar, eu gostaria só de dizer que nós vamos ter que introduzir uma exceção em uma coisa que é um lema dos partidários, de todas as pessoas que votaram no Presidente Bolsonaro, que é aquilo de que “a nossa bandeira jamais será vermelha”. A nossa bandeira jamais será vermelha, exceto se for a bandeira do Internacional, está bem?
Muito obrigado.
________________
* Vídeo disponível no canal do Itamaraty no YouTube.