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Discurso de posse da Embaixadora Maria Laura da Rocha no cargo de Secretária-Geral das Relações Exteriores - Palácio Itamaraty, Brasília, 4 de janeiro de 2023
Agradeço ao Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e ao Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Mauro Vieira pela minha designação como Secretária-Geral das Relações Exteriores. A você, querido amigo Mauro, agradeço as referências generosas que fez a meu respeito, em seu importante discurso de transmissão de cargo, e as orientações que recebi para o meu trabalho como seu braço direito na condução do Itamaraty.
Essa designação, tenho certeza, possui um sentido especial não só para mim, mas também para muitas mulheres, que, como eu, têm uma carreira de dedicação à Casa de Rio Branco e ao Brasil.
Quero expressar minha gratidão, neste momento, a todos os chefes com quem tive o privilégio de trabalhar, e a todos os colegas que, desde 1978, foram inspiradores e mestres inesquecíveis. Recordo, inicialmente, a saudosa embaixadora Celina Maria Assunção do Valle Pereira, minha orientadora durante o curso no Instituto Rio Branco. Assessora do então Chanceler Antônio Francisco Azeredo da Silveira, Celina representou a certeza de que, mesmo com todos os desafios adicionais que enfrentam, era possível para as mulheres almejarem altas funções na carreira. Menciono, igualmente, a embaixadora Vera Pedrosa, primeira mulher a comandar a Embaixada em Paris, e de quem tive a honra e o prazer de ser ministra-conselheira.
Queria especialmente agradecer, entre tantos, ao Embaixador Celso Amorim, pelo privilégio de chefiar seu gabinete, em uma época particularmente produtiva e inovadora de nossa política externa, cujas grandes linhas, com arrojo e criatividade, se retomam agora neste renascimento do Brasil para o mundo. Ao Embaixador Ronaldo Sardenberg, meu chefe e mentor por 12 anos, na Embaixada em Moscou, na Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e no Ministério de Ciência e Tecnologia. E ao meu primeiro chefe, Embaixador Sergio de Queiroz Duarte, com quem comecei a trabalhar, na Divisão do Pessoal, e aprendi a importância de tratar com carinho e valorizar os temas relacionados à política de pessoal do Ministério. Ressalto, igualmente, a competência, a energia e o entusiasmo da nossa brilhante Presidente da ADB, Embaixadora Maria Celina de Azevedo Rodrigues, como exemplo a ser seguido.
Terei presente também a qualidade do trabalho dos Secretários-Gerais que me precederam e foram fieis defensores da Casa e dos interesses do Brasil em sua região e no mundo.
Sou muito grata, igualmente, a tantos amigos que fiz ao longo da carreira, e pelas inúmeras mensagens de felicitações e encorajamento que tenho recebido ao ter sido anunciada para o cargo. Espero estar à altura das expectativas.
Finalmente, agradeço ao meu antecessor e querido amigo, o Embaixador Fernando Simas Magalhães, pelas palavras amáveis que me dedicou ao transferir-me estas responsabilidades. Desejo-lhe muitas felicidades na continuação da sua brilhante carreira.
Senhoras e senhores, caras e caros colegas,
A Secretária-Geral é auxiliar direta do Ministro de Estado, encarregado de conduzir a política externa a partir das instruções e diretrizes do Presidente da República. É também a chefe da Casa, que com seu trabalho nessas duas dimensões deve inspirar e conduzir um Ministério peculiar, presente em todo o mundo, e seus valiosos integrantes, sejam eles do quadro de funcionários do Estado, sejam eles dedicados funcionários locais dos nossos postos no exterior.
Em seu discurso na transmissão de cargo, no dia 2, o Ministro Mauro Vieira ressaltou quais serão as prioridades de nossa política externa conforme as orientações do Presidente Lula. Será antes de tudo uma política que busca reinserir o Brasil em sua região e no mundo, e retomar o protagonismo, na medida certa que nos cabe, em tantos temas em que o Brasil tem condições de aportar uma contribuição reconhecida e esperada por seus parceiros. Uma política que mostrará um país pronto e disposto a dar sua contribuição para superar os desafios globais e regionais, usando seu relacionamento com os demais atores e organismos internacionais para perseguir seus objetivos de paz, estabilidade, desenvolvimento sustentável,
prosperidade, justiça social e pleno respeito aos direitos humanos em todo o mundo.
Destaco, a título de exemplo, apenas alguns pontos.
O Brasil terá de reconstruir pontes com países e grandes foros de debate, a começar pela sua própria região sul-americana e na América Latina e Caribe, além de colocar em marcha uma nova dinâmica no relacionamento com a África, com a Ásia e com parceiros prioritários como a Europa, os Estados Unidos, a China e os demais membros do BRICS.
A diplomacia brasileira voltará a refletir a posição do Brasil como grande país em desenvolvimento detentor da maior floresta tropical do mundo, buscando contribuir para as metas do Acordo de Paris sobre Mudança do Clima como parte de uma estratégia de desenvolvimento que garanta renda, empregos de qualidade e melhores condições de vida para seu povo, inclusive os mais de 27 milhões de brasileiros que vivem na região amazônica.
Teremos de renovar nosso compromisso com os organismos multilaterais. Como ex-Embaixadora na FAO e na UNESCO, conheço bem a demanda pelo Brasil como provedor de soluções para os desafios comuns da humanidade: do flagelo da fome à mudança do clima; da assistência a refugiados e deslocados à promoção dos direito humanos; das novas ameaças à paz e segurança ao enfrentamento de pandemias e catástrofes; dos riscos representados pelas armas nucleares às tensões geopolíticas entre grandes potências; do protecionismo comercial contra países em desenvolvimento à desestruturação de cadeias globais de suprimento.
O Brasil pode e deve voltar a ser uma voz a favor de soluções negociadas, da reforma democrática de organismos internacionais, a começar pelo Conselho de Segurança da ONU, e de uma ordem internacional baseada no direito, como desde o Barão do Rio Branco tem sido parte de nossa identidade diplomática.
Nessas e em tantas outras áreas, o Brasil tem vocação para dar uma contribuição significativa, que é exatamente o que nossos parceiros esperam de nós, e é o que corresponde aos nossos valores e interesses de longo prazo. Para isso trabalharemos incansavelmente.
Por instrução do Ministro de Estado, darei especial atenção à reconstrução da antiga Subsecretaria-Geral das Comunidades Brasileiras no Exterior, sob nova denominação, como clara resposta de um Itamaraty que se renova a essa que é das áreas centrais da nossa atuação no exterior - o atendimento, a proteção e a assistência a mais de quatro milhões de brasileiros que vivem pelo mundo e a outros milhões que por ele viajam. Trabalharemos sobre o muito que já se fez nessa área para que seja uma vitrine do Serviço Exterior Brasileiro.
Nessa e em todas as demais áreas, que tratei sumariamente sem a pretensão de esgotar a imensa agenda que nos aguarda, a Secretaria-Geral do Itamaraty será uma ativa instância de coordenação e seguimento do trabalho da Secretaria de Estado e dos postos no exterior.
E será também uma instância de coordenação e um interlocutor ativo com todos os demais órgãos governamentais que tenham competências ou responsabilidades que se projetam além de nossas fronteiras. E também com o Congresso, o Poder Judiciário, Estados e Municípios em suas ações internacionais. Não medirei esforços para desempenhar essa coordenação com dedicação e empenho, envolvendo todas as instâncias da Casa e os postos no exterior.
Estarei sempre aberta a ouvir sugestões, explicar nosso ponto de vista, cultivar canais de contato com nossos principais interlocutores dentro e fora do governo, para que os objetivos da política externa sejam mais bem compreendidos, para que tenhamos mais e mais aliados e parceiros na execução de nossa missão institucional.
Senhoras e senhores, colegas, amigas e amigos,
Para responder às instruções do Presidente e do Ministro de Estado, é fundamental que a Secretaria-Geral esteja atenta não apenas aos objetivos da política externa, mas também aos instrumentos e meios para executá-la.
Antes de tudo, desejo conduzir uma Secretaria-Geral amorosa, aberta à Casa e sensível aos desafios do nosso trabalho e às expectativas, ansiedades e dificuldades impostas pela própria natureza de um Serviço Exterior espalhado pelo mundo e a exigir constantemente uma dose adicional de esforço e sacrifício de seus membros e familiares, diretamente afetados que são pelo estilo de vida que a carreira nos impõe.
Darei atenção às necessidades de instruções, lotação adequada e recursos para as unidades da Secretaria de Estado e postos no exterior.
As questões de orçamento e de recursos humanos serão prioritárias no diálogo com os demais órgão governamentais, que precisam entender que o Itamaraty e o Serviço Exterior Brasileiro, a exemplo de seus congêneres em todo o mundo, têm peculiaridades que lhes são únicas e precisam ser atendidas para que possam com plenitude ser os instrumentos para a projeção e proteção dos interesses e necessidades do País no mundo.
Isso vai requerer também dar continuidade e aprofundar o esforço interno de modernização da gestão, transparência e planejamento estratégico, de modo a contarmos com a legitimidade que a comprovação de resultados nos confere na busca por recursos adequados e no constante aperfeiçoamento dos nossos métodos de trabalho.
É preciso insistir em que o principal ativo da nossa diplomacia são as pessoas, os integrantes das carreiras do Serviço Exterior Brasileiro – diplomatas, oficiais de chancelaria, assistentes de chancelaria, demais categoriais funcionais do antigo DASP - e nossos extraordinários funcionários locais e colaboradores da rede de postos no exterior.
Temos de seguir investindo em condições de trabalho adequadas, em treinamento e aperfeiçoamento profissional, em saúde e em ambientes livres de qualquer tipo de assédio e preconceito.
Será necessário aprimorar os critérios de remoção e ascensão funcional para que sejam mais objetivos, bem como estudar a reforma dos marcos legais pertinentes para garantir mais previsibilidade nos fluxos de carreira.
Há também uma legítima expectativa dos diplomatas mais jovens de que, desde cedo, possam contribuir mais diretamente para a formulação e execução da política externa e que possam ter uma carreira com permanentes oportunidades de ascensão, dentro de um ritmo adequado que premie a excelência, mas retire das carreiras as ansiedades e frustrações que erodem o entusiasmo e minam a autoestima dos funcionários.
Vamos conversar muito para que esses anseios sejam atendidos. A valorização da experiência acumulada, que é exclusivamente aquilo que a hierarquia deve traduzir para ser respeitada e almejada, não significa desaproveitar as capacidades, as ideias, a energia e a criatividade dos mais jovens, que devem oxigenar o processo decisório e contribuir para consolidar o Itamaraty no século XXI.
A liderança e a autoridade não se exercem de maneira solitária e isolada. Para serem efetivas, devem valorizar as capacidades dos mais novos, precisam ser capazes de motivá-los a contribuir de maneira ativa para os objetivos do Ministério, dentro dos princípios que regem o funcionamento de uma instituição de Estado, submetida a uma cadeia de comando clara, visível e responsável.
Como primeira mulher a ser nomeada Secretária-Geral, não medirei esforços para evidenciar o que a Casa ganha em múltiplas dimensões valorizando as suas funcionárias mulheres e a diversidade dos seus quadros. O objetivo da igualdade de gênero deve pairar sobre todas as ações do Ministério, orientando a atuação de cada um de nós em todos os momentos. Todos ganharemos com esse engajamento.
É preciso aprofundar a tendência do aumento no número de mulheres e negras e negros na carreira diplomática e em postos de chefia,
ampliando suas oportunidades nas classes superiores da carreira e em posições de comando na Secretaria de Estado e no exterior.
Vamos cuidar para que o Itamaraty seja um ator engajado, em parceria com outros órgãos e com a sociedade civil, para ampliar o número de mulheres, negras e negros, pessoas menos favorecidas e candidatos de todas as regiões do país recrutados para as nossas carreiras. Isso é ainda mais importante no caso da carreira de diplomata, que precisa refletir cada vez mais a cara do Brasil. Mas isso não se fará se não agirmos para motivá-los, desde a escola secundária, a ver na carreira diplomática, tanto quanto uma oportunidade, uma verdadeira possibilidade. Essa tarefa de divulgação mais ampla, transversal, da carreira é tarefa tanto institucional como individual, a mobilizar cada um de nós.
O Ministro Mauro Vieira anunciou, também, a intenção de recriar o Comitê de Raça e Gênero, que havia sido extinto, e que queremos fortalecer e voltar a valorizar como ele havia feito em sua gestão anterior.
É um primeiro passo importante para que essas questões se tornem realmente transversais no governo, para que o Itamaraty, instituição pioneira na ação afirmativa para ampliar a representação regional e para apoiar as brasileiras e brasileiros negras e negros no ingresso na carreira, continue na vanguarda dessa causa que deve ser de todos, porque uma instituição de Estado mais diversa não é apenas mais justa e democrática como convém, mas é também mais eficiente, produtiva e inovadora.
O sonho de um país de oportunidades iguais, de um país generoso, comprometido com as boas causas humanitárias, ambientais e de justiça social, de um país que caminha para o desenvolvimento e cuida bem de sua gente, é o sonho que precisamos realizar na prática e de maneira muito concreta no nosso trabalho e na nossa vida. O Itamaraty estará plenamente engajado nesse desafio.
Senhoras e senhores, QUERIDAS E queridos colegas,
Ao concluir essa breve síntese de ideias que me acompanharão como Secretária-Geral, quero ressaltar minha intenção de ajudar a todos e a cada um na medida das minhas possibilidades.
Vamos criar canais, como o Ministro Mauro Vieira indicou, para colher sugestões de todas as categorias sobre temas de política externa e assuntos administrativos.
Para o êxito de toda a equipe, são essenciais a harmonia no trabalho e a visão de conjunto das responsabilidades e objetivos. Estimularei todos os servidores do Itamaraty sobre a relevância do trabalho em equipe e do respeito à liberdade de opinião com responsabilidade.
Conto com o compromisso de cada um de vocês para reforçar esse sentimento de equipe. É um compromisso com o Itamaraty e com o Brasil, que reflete a verdadeira vocação de serviço público e de devoção à Nação brasileira, que são a marca da nossa Casa.
Muito obrigada.