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Carta enviada pela OCDE ao ministro da Fazenda aponta oportunidade de melhoria nas regras do Carf
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, recebeu carta da direção da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) apontando a oportunidade de melhoria nas regras do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão que julga disputas bilionárias entre empresas e o governo federal em relação a pagamento de impostos. Os principais pontos de atenção, segundo a organização, se referem ao chamado voto de qualidade (desempate) e o potencial conflito de interesses nos julgamentos.
Em 2020, uma alteração nas regras retirou do governo a prerrogativa de dar o voto decisivo durante os julgamentos do Conselho. A mudança significa, efetivamente, que quando os votos dos juízes representantes do setor privado e público resultarem em empate, a decisão é, por padrão, favorável às empresas.
Após o julgamento, o governo, por sua vez, não pode recorrer. O mesmo, por outro lado, não acontece caso a decisão seja contra o contribuinte. Neste caso, as empresas podem acionar os meios legais para contestar a decisão, manobra que pode travar disputas bilionárias por anos dentro do Carf.
“Isso parece inadequado, pois se a decisão é resultado de um empate, isso indica que há algumas questões jurídicas desafiadoras que provavelmente merecem ser esclarecidas e resolvidas por meio de um processo judicial independente, em vez de concluir que o caso está razoavelmente resolvido e deve ser considerado definitivo”, diz um trecho da carta. Geralmente, casos nos quais um alto valor de imposto está em jogo levam a uma decisão empatada no Carf.
Acesse a Carta da OCDE enviada ao ministro da Fazenda sobre o Carf (versão em português pdf)
Acesse a Carta da OCDE enviada ao ministro da Fazenda sobre o Carf (versão em inglês pdf)
O volume de disputas tributárias no Conselho está na faixa de 12% do Produto Interno Bruto (PIB) anual, ou seja, algo em torno de 25% da dívida pública do Brasil. Segundo a OCDE, o alto volume de casos no Carf, o grande valor de impostos sujeitos a disputas, bem como o longo tempo que esses casos levam para serem resolvidos “levantam questões sobre a “eficiência e integridade do atual processo de recurso administrativo tributário no Brasil”.
A prática brasileira não encontra precedentes em outras jurisdições ao redor do mundo, principalmente, no que diz respeito ao grau de participação dos entes privados nas decisões. O Carf é formado por oito juízes, sendo quatro representando a Administração Pública e quatro o setor privado.
“Nossa pesquisa inicial indica que, ao contrário do Brasil, a maioria das jurisdições que analisamos possui algum tipo de processo de recurso administrativo, mas não um que envolva representantes do setor privado no processo de revisão de tomada de decisão. Em vez disso, as revisões são realizadas por funcionários do governo, da administração tributária ou Ministério da Fazenda”, diz outro trecho da carta.
Como medida de boas práticas com base na melhor experiência internacional, a OCDE pede uma revisão das regras do Carf. A melhor saída, segundo a organização, seria retornar ao modelo anterior a 2020 quando o governo tinha o voto de minerva nos julgamentos. “Isso não terá um impacto negativo nos direitos dos contribuintes, porque eles ainda manterão seu recurso à revisão judicial independente, onde poderão contestar, com base legal, a avaliação tributária, bem como os impostos reivindicados e as penalidades aplicadas”.
Em janeiro, o governo editou uma Medida Provisória que revoga o fim do voto de qualidade no Carf. Na prática, o governo federal restabeleceu o voto final nas decisões do Conselho. No entanto, a palavra final a respeito da MP cabe ao Congresso Nacional, que ainda não analisou o mérito da questão.