Londres-Mundo - Newsletter 01/2022
O CBAM do Reino Unido – possível impacto para as exportações brasileiras
Nicola Speranza, Chefe do Setor de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Energia, Embaixada do Brasil em Londres
Na esteira da União Europeia, o Reino Unido também está considerando a introdução de mecanismo de ajuste de carbono na fronteira (CBAM), medida que pode ter impacto sobre as exportações brasileiras para este mercado.
Hoje, os setores econômicos mais poluentes no Reino Unido são obrigados, por lei, a adquirir créditos de carbono em função do seu volume de emissões. Trata-se do Mecanismo Nacional do Comércio de Emissões (ETS), semelhante ao EU Emissions Trade Scheme (ETS) da União Europeia. Os custos associados ao ETS atingiram recordes históricos no último ano e têm gerado queixas dos setores submetidos às regras de precificação de carbono, já que, segundo alegam, muitos de seus concorrentes internacionais não estão sujeitos à mesma pressão de custo. O descontentamento já se traduz em movimentos políticos no parlamento e no governo.
Em 4 de abril, o Comitê de Auditoria Ambiental (EAC) da Câmara dos Comuns publicou relatório sobre formas de deixar as importações mais “verdes”. O documento discute a possibilidade de introduzir o CBAM, mecanismo por meio do qual o governo local cobraria imposto sobre produtos importados de alta intensidade de carbono. O objetivo seria garantir que tanto o Reino Unido quanto outros países honrem seus compromissos de atingimento de emissão líquida, segundo informou o comitê. Embora a EAC afirme que o CBAM britânico seria inspirado no europeu, não indicou se os setores abrangidos seriam os mesmos que no mecanismo da UE. Tampouco se antecipou se os setores altamente poluentes, como aço, continuariam a receber "free allowances" no contexto do ETS, como ocorre na UE.
O relatório da EAC avalia que os investimentos para descarbonização de setores como o metalúrgico são elevados, com impactos nos custos imediatos. Alega também que empresas localizadas em países que não exigem metas de transição energética tão ambiciosas quantos as do Reino Unido poderão se beneficiar de custos inferiores por empregar tecnologias convencionais que utilizam combustíveis fósseis. Para evitar a chamada “fuga de carbono”, ou “carbon leakage”, o Comitê exorta o governo a alinhar as condições de competitividade por meio da introdução unilateral e imediata de tarifas de importação específicas, com alíquotas que equalizem os custos de produção dos itens importados aos padrões britânicos de descarbonização. A EAC advoga a introdução da tarifa enquanto os arranjos multilaterais, que são, por sua natureza, de maturação mais lenta, não estiverem operacionais. Segundo membros do Comitê, a proposta em questão inspira-se em discussões semelhantes que vêm ocorrendo na União Europeia e nos Estados Unidos.
Ao atender as inquietações setoriais diante da concorrência estrangeira, o próprio EAC reconhece em seu relatório que a introdução de tarifas teria possíveis impactos inflacionários, num momento em que já existem fortes pressões de aumento do custo de vida. No entanto, a comissão crê que os benefícios da eventual imposição de tarifas superam os problemas, uma vez que ajudariam a conformar e viabilizar mercado de “produtos verdes”, possibilitando-lhes economias de escala. Na inexistência de tarifas sobre carbono nos produtos importados, estima-se que a metade da pegada de carbono do Reino Unido seja gerada no exterior e internalizada na forma de bens importados. Embora o governo britânico atualmente não compute o carbono oriundo de produtos importados na sua contabilidade de emissões, existem pressões por parte de movimentos e organizações ambientalistas para que passe a fazê-lo, já que a perspectiva futura é que o país se transforme cada vez mais numa economia de serviços com reduzida base manufatureira.
Representantes de países exportadores de produtos cujo comércio poderia ser dificultado em razão da possível introdução de tarifas “verdes” têm manifestado contrariedade em relação à introdução do novo imposto.
O governo brasileiro está atento às discussões em torno da adoção do CBAM do Reino Unido, bem como a seus potenciais impactos sobre as exportações brasileiras para o mercado britânico.