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INTERCÂMBIO
HC-UFPE vira “segunda casa” para profissionais angolanos em especialização
“O brasileiro é muito acolhedor e empático. Tivemos até festa em nossa chegada”, relata a médica neonatologista angolana Leoneth Patrícia, que compõe o Programa de Formação de Recursos Humanos em Saúde Brasil-Angola, no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC-UFPE), iniciado em abril. Ela é uma entre os oito profissionais (seis de medicina e dois de enfermagem), que participaram da cerimônia de acolhimento no anfiteatro 1, na última quarta-feira (3). O HC é uma unidade vinculada à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh).
“A primeira semana aqui no Brasil foi tranquila, mas a segunda e a terceira foram difíceis porque a saudade bateu”, comenta Leoneth, que disse se surpreender com as diferenças do português falado pelos dois países. “Algumas palavras que utilizamos de forma natural no nosso dia a dia, aqui (no Brasil) são palavrões ou têm uma outra conotação. Isso foi um pouco constrangedor”, relata a neonatologista.
Habitante de Mbanza Kongo, distante 490 km da capital angolana Luanda, o enfermeiro Salakiaku Vanga vê muitas semelhanças entre a sua cidade – que diz todo orgulhoso ser reconhecida como Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco – e o Recife. “A temperatura é bem parecida e a comida também tem semelhanças. Comemos mandioca, que aqui vocês chamam de macaxeira, e a farinha feita dela. Um de nossos pratos é o funge de mandioca (uma espécie de pirão). Também comemos feijoada e carne-seca, que é chamada de charque aqui”, afirma Vanga, que ainda não experimentou o arrumadinho, tão comum no Recife. Mas ficou interessado ao saber dos ingredientes.
O foco dos profissionais angolanos é o trabalho. A maioria deles está no Recife desde meados de abril. Ainda não tiveram tempo de conhecer a cidade. Estão morando num prédio a menos de 1 km do HC. E essa tem sido a rotina deles: da casa para o trabalho, do trabalho para casa. “Conheço só o supermercado aqui perto e o RioMar (shopping), que fomos uma vez”, afirmou Salakiaku, que é pai de três filhos de 14, 12 e 8 anos de idade. “Eles já perguntaram: ‘papa, quando vai nos chamar para o Brasil?’”, lembra, sorrindo.
Atuando na assistência desde 1990, o enfermeiro diz que o objetivo é aprender as boas práticas do SUS e multiplicá-las com os colegas em Angola. “Agradeço a parceria entre os governos do Brasil e de Angola que está possibilitando essa formação. As tecnologias em saúde estão mais avançadas no Brasil. Nossa perspectiva é virarmos preceptores lá em Angola quando voltarmos dessa especialização”, conta o profissional, que vai se especializar em enfermagem cirúrgica.
Moradora da capital Luanda, a médica Judith Benguela vai se especializar em geriatria. Lá, ela trabalha no Hospital Universitário Américo Boavida. “Como é uma capital de país, tem muitos estrangeiros morando em Luanda. É uma cidade aberta”, comenta a médica, que recebeu um importante suporte da sua irmã, que está cuidando da filha de Judith, Ielisa Carina, de um ano e um mês. O que faz a saudade apertar ainda mais.
A exemplo dos compatriotas, Judith também não teve tempo de conhecer o Recife. “Não fomos à praia ainda e já nos falaram do cuidado com os tubarões. Neste fim de semana, estamos nos programando para conhecer o Mercado de São José (no Centro). Falaram que é bem turístico”, explica Judith, que confessou estar fugindo da tradicional doçaria pernambucana para controlar a glicose.
Cooperação técnica
O Programa de Formação de Recursos Humanos em Saúde Brasil-Angola é um acordo de cooperação técnica Sul-Sul, celebrado entre os países em 2023, que possibilita projetos e ações de cooperação capazes de produzir impactos positivos no desenvolvimento do Sistema Nacional de Saúde de Angola com foco na acessibilidade e na qualidade dos serviços de saúde prestados à população. O HC-UFPE foi um dos hospitais da Rede Ebserh que aderiram ao programa.
Em novembro de 2023, o HC foi um dos três hospitais da Rede Ebserh a receber uma comitiva com representantes do Ministério da Saúde de Angola, que veio ao Brasil em missão oficial, com foco no fortalecimento da formação de recursos humanos na área da saúde do país africano.
Para o superintendente do HC, Filipe Carrilho, o projeto de intercâmbio já é exitoso. “Aderimos imediatamente a esse projeto porque entendemos a sua importância na troca de conhecimento, de experiência e de cultura. Sabemos como é difícil estar fora de casa, mas também é gratificante essa troca não como profissionais, mas, sobretudo, como seres humanos”, destaca o gestor.
Como eles estão realizando a especialização na modalidade fellowship, esses profissionais estão vinculados à Gerência de Ensino e Pesquisa (GEP) do HC e farão treinamentos em diferentes especialidades na área médica, como geriatria, infectologia, neonatologia, ginecologia, cirurgia geral, pneumologia, oftalmologia, ecocardiografia e em enfermagem cirúrgica e em saúde da criança. “As portas da GEP estão abertas para qualquer demanda. Estamos muito felizes com essa possibilidade e, no próximo ano, vamos abrir vagas para outras profissões e ampliar essa vivência”, explica a gerente de Ensino e Pesquisa do HC, Claudia Marques.
Dependendo da especialização, os profissionais passarão dois ou três anos atuando no HC, sob a responsabilidade e supervisão dos preceptores dos serviços em que trabalham. “Estamos muito felizes em poder contribuir com o aperfeiçoamento desses profissionais e esperamos que após esse tempo de trocas de experiências e de muito aprendizado possam retornar para Angola instrumentalizados para a oferta de serviços de saúde de qualidade à população”, pontua a chefe da Unidade de Gestão de Pós-Graduação do HC, Isabella Valois.
Sobre a Ebserh
O HC-UFPE faz parte da Rede Ebserh desde 2013. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 45 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência. Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) ao mesmo tempo que apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas e inovação.
Por Moisés de Holanda