Notícias
Corpos estranhos no canal auditivo: o que fazer, sintomas e cuidados
Frequentemente, pacientes procuram atendimento médico com incidência de corpos estranhos no ouvido, nariz ou garganta. Apesar da maioria dos casos progredirem com baixas ou sem consequências, existem alguns quadros que podem resultar em graves complicações.
Entre fevereiro de 2017 e novembro de 2019, a Divisão de Otorrinolaringologia da Unidade de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas – UFG/EBSERH, realizou estudos voltados para análise de atendimentos prestados. Entre os 232 pacientes observados durante o período, mais da metade possuíam entre 2 a 4 anos e os principais corpos estranhos identificados foram sementes e objetos de plástico.
Para falar detalhadamente sobre o assunto, convidamos o médico Claudiney Candido Costa, chefe da Unidade de Cabeça e Pescoço do Hospital das Clínicas – UFG/EBSERH, professor associado da Faculdade de Medicina (UFG) e chefe do serviço de otorrinolaringologia do CRER (Centro Estadual de Reabilitação e Readaptação Dr. Henrique Santillo).
O que é um corpo estranho no canal auditivo?
Corpo estranho é tudo aquilo que não faz parte da anatomia fisiológica do corpo. Esse corpo pode estar inserido no nariz, laringe ou ouvido. Muitas coisas são consideradas corpos estranhos e variam de acordo com a idade, como uma criança pequena que coloca o corpo estranho por contra própria por estar em fase de experimentação. Pequenos artefatos de plásticos, pequenas baterias, pérolas, brincos e insetos são muito comuns. No caso de insetos, é mais comum em adultos do que em crianças, por causa da cavidade e porque o adulto, geralmente, não coloca um corpo estranho no ouvido. Aqui, no hospital, já atendemos um paciente que removeu um dente e inseriu no próprio ouvido – neste caso, na boca, o dente não é um corpo estranho, mas se torna um quando inserido no ouvido.
Caso o corpo não seja visível, quais são os principais sintomas que facilitam a identificação (principalmente em crianças pequenas)?
Na maioria das vezes, a criança começa a ter dor, secreção (que pode ser amarelada), sangramento no ouvido ou no nariz – é importante sempre falar dos dois, pois andam paralelos na criança. Esse corpo estranho, lá dentro, gera um processo infeccioso: a mãe, algumas vezes, alega sentir mau cheiro, secreção amarelada, acreditando ser apenas uma infecção simples. No entanto, é identificado que a infecção é secundaria à presença do corpo estranho. É muito comum que a mãe perceba que a própria criança introduziu algo, enquanto estava brincando. Neste momento, acontece um erro no qual um familiar ou um médico – que não seja especialista – tenta retirar o corpo estranho.
Quais são as principais consequências de um corpo estranho introduzido no ouvido?
Em relação ao ouvido, ele é associado à perfuração da membrana do tímpano, podendo levar a infecções crônicas do ouvido e, até mesmo, perda de audição crônica. É necessário lembrar que o ouvido faz parte da base do crânio, portanto é muito próximo do cérebro e da meninge – os quadros mais graves podem levar à complicação central, como a meningite. Na maioria das vezes, quando o corpo estranho é grande, ele fica na parte externa e conseguimos remover sem lesionar a membrana do tímpano. Geralmente, quando acontece uma perfuração pequena, o tratamento consegue melhorar. No caso dessa perfuração ser muito grande, é necessário programar para fazer cirurgia de reconstrução da membrana do tímpano. Desse modo, pode acontecer desde quadros de tontura – já que afeta o labirinto do paciente – até quadros de infecção crônica e perda de audição. Isso pode acontecer, até mesmo, em quem utiliza chave, pente e outras coisas para limpeza do ouvido. Todos eles são casos muito graves e, a maioria, conseguimos resolver em nível ambulatorial.
Neste caso, o que se deve fazer?
Inicialmente, o que se deve fazer é procurar atendimento médico. Esse atendimento, a princípio, pode ser realizado pelo clínico geral ou pelo pediatra, que irá avaliar e encaminhar para o especialista. Orientamos que o pediatra ou o clínico geral não tentem manipular esse corpo estranho, pois observamos que o índice de complicação é maior quando relacionado à manipulação prévia. O ideal é encaminhar para o especialista e não tentar lavar, remover ou puxar, de alguma forma, esse corpo estranho.
Quais as principais formas de prevenção?
Quando criança pequena, não oferecer instrumentos muito pequenos porque ela vai colocar no nariz, na boca ou no ouvido. No adulto, geralmente, entram corpos estranhos vivos (insetos) como barata, besouro, mosquito, mosca e até carrapatos, infeccionando após vários dias. Orientamos não tentar manipular e não usar hastes de algodão para limpeza, pois pode machucar o canal auditivo. E, caso perceba que isso aconteceu, procurar um médico diretamente.
Como funciona o processo de atendimento no Hospital das Clínicas – UFG/EBSERH?
Hoje, o paciente vem referenciado pela Secretaria Municipal e Estadual de Saúde e, então, é encaminhada a solicitação até aqui. Qualquer otorrinolaringologista está habilitado a fazer a remoção, mas quando está com algum sinal de complicação e grau de dificuldade e observamos que é necessário suporte do HC, recebemos esse paciente.
Existem outras unidades públicas no estado de Goiás que também prestam atendimento para estes casos?
Do ponto de vista de pronto-socorro, não temos nenhum funcionando no estado, mas ainda servimos como base para as Secretarias Municipal e Estadual. Esses pacientes, geralmente, são encaminhados para outros serviços que possuem residência médica, como também o CRER e HGG (Hospital Estadual Alberto Rassi).
O HC-UFG/EBSERH recebe com bastante frequência casos de pacientes com corpos estranhos no ouvido?
Muito frequentemente. É importante salientar que, dependendo do tipo de corpo estranho, o atendimento é de extrema urgência. Por exemplo, no caso de baterias que possuem química, o paciente não pode ser atendido dias após o diagnóstico, pois quanto mais rápido for feita a remoção, menor o risco de complicações. Por isso, lutamos pela presença de pronto-socorro que funcione 24 horas, já que alguns casos precisam ser atendidos de forma imediata.
Caso aconteça algum acidente num fim de semana ou feriado, o paciente pode buscar atendimento no HC?
Esse paciente precisa ser avaliado por médico da rede municipal ou estadual e a partir daí é encaminhado para a central de regulação. Dependendo do caso, a central vai entrar em contato com os hospitais como o HC, CRER ou HGG. Se observamos que é um caso relacionado ao HC, tentamos suprir essa necessidade. Infelizmente, não temos esse médico à disposição, porque todas as vezes que recebemos um paciente de urgência, é necessário tirar um médico da atividade eletiva. O ideal seria ter atendimento específico para urgência, para não atrapalhar a fila eletiva.
CLAUDINEY CANDIDO COSTA
É fundador e supervisor do Serviço de Residência de Otorrinolaringologia do CRER-GO; professor associado da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás; diretor de cursos e eventos da Associação Brasileira de Laringologia e Voz/ABLV; chefe da Unidade de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do HC-UFG/EBSERH/(2022).