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PREVENÇÃO
31 de maio: Dia Mundial sem Tabaco
Criado pelo Estados-membros da Organização Mundial da Saúde (OMS), o dia visa alertar sobre as doenças e mortes evitáveis relacionadas ao tabagismo. Para saber mais sobre o assunto, leia a entrevista com a médica pneumologista do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG), vinculado à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), Flávia Castro Velasco Fernandes.
- O que é o tabagismo e quais os impactos que ele pode causar na vida das pessoas?
Tabagismo é sabidamente uma doença crônica causada pela dependência à nicotina presente nos produtos do tabaco.É considerado um transtorno mental e comportamental pelo uso de substâncias psicoativas.
O tabaco é uma planta (Nicotiana tabacum) e o seu princípio ativo, a nicotina, que causa dependência, está presente em vários produtos: cigarro, charuto, cachimbo, cigarro de palha, fumo de rolo, rapé, tabaco para narguilé e cigarros eletrônicos.
A fumaça do tabaco contém mais de 7 mil substâncias químicas, sendo estas responsáveis pelo desenvolvimento dos cânceres. O alcatrão é uma dessas substâncias composta por mais de 40 produtos cancerígenos e se forma durante a combustão do tabaco.
O tabagismo é considerado a maior causa de morte evitável isolada para adoecimento e morte precoce no mundo. A nível mundial ocorrem cerca de 5 milhões de mortes por ano relacionadas ao tabagismo. No Brasil, a mortalidade devido ao cigarro é cerca de 200 mil por ano. Fazendo uma correlação com o contexto atual, o tabagismo é hoje considerado uma pandemia, de causa não infecciosa.
De todos os casos de câncer, 30 a 40 % estão relacionados ao tabagismo, e o de pulmão, em 85% das vezes. Mortes por Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) - enfisema pulmonar, bronquite crônica – estão, em 75% dos casos, diretamente relacionadas ao tabagismo, assim como as doenças cardiovasculares em 35%.
O combate ao tabagismo é fundamental para salvar vidas e reduzir os gastos na rede pública com doenças relacionadas ao hábito de fumar. O Brasil é uma referência mundial nesse combate, tendo trabalhado com controle de marketing e comercialização do cigarro, restrição da disponibilidade dos produtos, ações educativas em escolas, atendimento na atenção primária à saúde a profissionais de saúde e à população em geral, controle do consumo em locais públicos e de trabalho. Essas ações melhoraram a consciência da população sobre os males do cigarro e as possibilidades de acompanhamento e tratamento, disponibilizando maiores possibilidades para a decisão de cessar o tabagismo e muitas vezes conscientizando os jovens sobre os males de iniciar qualquer tipo de fumo.
Conforme dados do INCA, no Brasil, nos últimos anos, houve importante redução da prevalência do tabagismo, fruto das políticas de controle do tabagismo. O percentual de tabagistas maiores de 18 anos teve uma diminuição progressiva. Em 1989, tínhamos 34,3% de fumantes; em 2003, 22,4%; em 2008 18,5% e 2013 14,7%. Isso representa uma redução de 46% de tabagistas maiores de 18 anos no País e uma estimativa de 420.000 mortes evitadas nesse período. Em 2018 essa prevalência foi de 9,3%. Entre 18 a 24 anos de idade, caiu de 12% em 2016 para 6,7% em 2018, e entre 35 a 45 anos foi de 18,5% em 2016 para 11,1% em 2018.
Esses dados reforçam como as políticas contra o tabagismo têm sido efetivas. Ainda assim, até o final de 2019, houve 31.270 casos novos de cânceres de vias aéreas relacionados ao tabagismo. Por isso, o trabalho não pode cessar. É importante manter as medidas de educação para população contra o tabagismo, pois ainda é um problema de saúde pública que precisa ser constantemente combatido.
- O que é o fumo passivo e quais os seus principais riscos para a população em geral?
Fumo passivo ocorre com a inalação de fumaça derivada de todas as formas de tabaco (cigarro, charuto, cachimbo, cigarro de palha, narguilé, etc.) por pessoas que convivem com fumantes no mesmo ambiente, respirando as mesmas substâncias tóxicas que o fumante inala.
A fumaça que sai do cigarro vai para o ambiente e contém três vezes mais nicotina e três vezes mais monóxido de carbono e até 50 vezes mais substâncias cancerígenas do que a fumaça que o próprio fumante inala.
Isso pode levar a vários problemas de saúde, como alergias (rinite, tosse, conjuntivite, exacerbação da asma), cânceres, problemas cardiovasculares, doenças respiratórias crônicas, como enfisema e bronquite.
Crianças e gestantes têm mais riscos com essa exposição podendo desenvolver doenças respiratórias e até a síndrome da morte súbita infantil, partos prematuros, bebês com baixo peso e malformações congênitas.
Não existe um nível seguro para exposição à fumaça do cigarro. A única maneira de proteção é não se expor de nenhuma forma a qualquer tipo de fumaça.
Com a lei n. 12.546, de 14 de dezembro de 2011, que proíbe o fumo em local fechado em todo país, houve redução importante da poluição tabagística ambiental, o que contribui muito para a redução das doenças relacionadas e a diminuição dos gastos públicos com essas doenças.
- Muitas pessoas acreditam que formas de fumo diferentes do cigarro tradicional - tais como o cigarro eletrônico e o cachimbo - atenuam os efeitos do tabaco. Isso é verdade?
Não é verdade. Todos esses produtos são derivados do tabaco e, quando consumidos, são ingeridas no organismo milhares de substâncias tóxicas, incluindo todas as relacionadas acima, assim como a nicotina. Por isso, fazem mal como o cigarro comum.
O cigarro eletrônico, que hoje é uma moda entre os jovens, possui também nicotina e substâncias cancerígenas. O uso de cigarro eletrônico já foi responsável por casos de explosões com sérios danos a vítimas. Existem casos também de lesões pulmonares relacionadas ao “vaping” - expressão para o ato de inalar o vapor que sai dos vaporizadores - levando a lesões pulmonares graves e difusas com insuficiência respiratória e, em alguns casos, necessitando de ventilação mecânica, podendo evoluir ao óbito. Por isso, fica a mensagem: o cachimbo, o cigarro eletrônico ou qualquer fumaça inalada no pulmão têm efeitos deletérios como qualquer forma de tabaco. Toda fumaça que entra no pulmão terá consequências deletérias ao organismo.
- Fale sobre o tema do Dia Mundial sem Tabaco de 2020, divulgado pela OMS: Protegendo os Jovens da Manipulação da Indústria e Prevenindo o Uso de Nicotina e de Produtos de Tabaco.
Neste momento, estamos vivendo uma pandemia por coronavírus que tem consequências graves no pulmão. Ao mesmo tempo, um aumento do tabagismo entre os jovens. Sabemos que os tabagistas fazem parte do grupo de risco para maiores complicações relacionadas à COVID-19. Por isso, o momento é o ideal para quem quer parar de fumar se conscientizar e procurar ajuda para iniciar esse tratamento e os jovens estarem conscientes para não entrarem nessa “onda”. É preciso estar consciente de que a indústria está tentando minimizar os problemas do tabaco tornando os novos dispositivos como “naturais”, com “sabores agradáveis”, “risco reduzido” e tornando os jovens os grandes susceptíveis a essa ameaça. Sabemos que os riscos são iguais ou até maiores com esses novos dispositivos. Por isso, jovens, não acreditem e não sejam manipulados. Os efeitos existem e são reais. É preciso e urgente esse tema da OMS. Não podemos deixar que todas as conquistas em todos esses anos no combate ao tabagismo tenham um fim agora. Necessário que seja amplamente divulgado, especialmente entre os jovens onde tem se disseminado essa prática como algo não deletério. O que sabemos não ser verdade. Vamos ser conscientes e divulgar os males de qualquer forma de tabagismo, evitando consequências desastrosas no presente e no futuro.
- O que ocorre com o corpo da pessoa, quando ela abandona o hábito de fumar?
Quanto mais cedo parar de fumar menor o risco de adoecer. Mas não existe idade limite para interromper o tabagismo. Sempre existirá benefícios. A qualidade de vida melhora muito ao parar.
Após 20 minutos sem fumar: a pressão e o pulso normalizam;
Após 2 horas sem fumar: não há mais nicotina no sangue;
Após 8 horas sem fumar: o nível de oxigênio no sangue se normaliza;
Após 12 a 24 horas sem fumar: os pulmões funcionam melhor;
Após 2 dias sem fumar: o cheiro e gosto melhoraram;
Após 3 semanas sem fumar: a respiração fica mais leve e a circulação melhora;
Após 1 ano sem fumar: o risco de infarto do miocárdio reduz à metade;
Após 10 anos sem fumar: o risco de infarto será igual das pessoas que nunca fumaram.
- Como é feito o tratamento do tabagismo?
O tratamento do tabagismo é uma decisão do paciente. Não existe um remédio milagroso que a pessoa toma e simplesmente suspenda o cigarro. Todos sabemos que não é assim. Depende de decisão do paciente em querer e se conscientizar dessa necessidade.
No HC-UFG temos um ambulatório de tabagismo onde o paciente passa por uma consulta médica e é abordado sobre seu grau de motivação para parar, grau de dependência, doenças relacionadas e avaliação da necessidade de medicações.
O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza algumas medicações, orais e adesivos de nicotina, cuja prescrição é avaliada pelo médico de acordo com as necessidades do paciente.
Existem várias dicas quando vier a vontade de fumar que podem ser usadas: chupar gelo, comer gengibre, comer cenoura na forma de um cigarro, chupar um canudo, mastigar balas e chicletes (preferência sem açúcar), fazer atividades físicas, etc. São técnicas que podem aliviar a fissura, sintoma de vontade absurda de fumar, mas que passa, normalmente, em 5 minutos. Por isso, a necessidade de tentar se controlar nesse momento. Importante também evitar hábitos que sempre lembram o cigarro como tomar café, bebidas alcoólicas ou todos os hábitos que lembrem o cigarro.
É importante um acompanhamento regular com o profissional de saúde, com avaliação mensal, observando as dificuldades que o paciente tem apresentado e dando soluções para resolver e aliviar o sofrimento nesse momento.
- Considerações finais.
O importante é que a pessoa esteja consciente da necessidade de parar de fumar, estar preparado para enfrentar esse desafio nesse momento. Lembrar que não é difícil somente para ela, mas para todos que têm essa dependência. A persistência, mesmo com recaídas, é o mais importante para o sucesso do tratamento. Não existem pessoas que não conseguem, existem pessoas que desistem. Parar de fumar é ter persistência nesse objetivo. E sempre lembrar que as primeiras semanas e primeiros meses serão os mais difíceis. Se houver persistência, tudo passará. E o cigarro não vencerá. Mas sua vontade de vencer sim.