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ENTREVISTA
11 de outubro: Dia Mundial de Combate e Prevenção da Obesidade
A obesidade é um sério problema de saúde e uma importante causa de morbidade. Nas crianças, a obesidade pode levar a complicações em diversos órgãos e sistemas. Por isso, a prevenção da obesidade infantil deve começar antes da gestação. Para saber mais sobre o assunto, leia a entrevista com a médica endocrinologista pediátrica do HC-UFG/Ebserh, doutora em Ciências da Saúde e professora do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFG, Renata Machado Pinto.
- O que é a obesidade infantil?
Obesidade é conceituada como excesso de gordura corporal e que traz vários malefícios para a saúde. A forma mais simples de se fazer o diagnóstico de obesidade é através do cálculo do IMC (Índice de Massa Corporal). Deve-se dividir o peso (em kg) pelo quadrado da altura (altura multiplicada por ela mesma, em metros). Por exemplo, para uma pessoa com 1,60m de altura e 55 kg, calcula-se o IMC assim: 55/ 1,6 x 1,6. Ou seja: 55/2,56 = 21,48.
E o que esse resultado significa? Em adultos o resultado segue a seguinte classificação:
< 18,5 = Baixo peso
≥ 18,5 <25 = Peso normal
≥25 < 30 = Sobrepeso
≥ 30 = Obesidade (≥30<35 – Grau I; ≥35 < 40 Grau II; ≥ 40 Grau III)
Para crianças, a interpretação dos valores de IMC é bem diferente. Isso ocorre porque a composição do corpo das crianças é diferente dos adultos e muda em cada fase. Os valores normais do IMC das crianças são bem menores e só se aproximam dos valores dos adultos já no final da adolescência. Na prática, isso significa que crianças saudáveis são aquelas que parecem “bem magrinhas” quando comparadas com os adultos.
Para se interpretar o IMC na infância, foram criadas curvas de IMC por sexo e idade. A divisão em categorias de diagnóstico nutricional depende da idade da criança, sexo e onde ela se encontra na curva de IMC, que pode ser dividida em Percentis ou Z-Score.
Veja (em anexo) as curvas utilizadas pela OMS e como interpretar.
De uma forma geral, a partir dos 2 anos, o IMC normal das crianças tem valores bem abaixo do dos adultos. Apenas na adolescência o IMC se eleva novamente, com maior ganho de gordura e massa muscular. Isso significa que criança de peso normal só pode ter a famosa carinha gorducha de “Bebê Johnson” até, no máximo, os 2 anos. A partir daí, o normal é que as crianças tenham um aspecto “magrinho”. Perder as dobrinhas após os 2 anos não deve assustar os pais, muito pelo contrário, é sinal de que a criança está seguindo com seu crescimento adequado!
- Quais as principais causas e consequências da obesidade infantil?
O ambiente interfere no risco de desenvolvimento de obesidade desde antes da concepção. São fatores de risco para obesidade pediátrica: obesidade materna e paterna pré-gestacional, grande ganho de peso materno durante a gestação, diabetes mellitus gestacional e tabagismo durante a gravidez.
Logo após o nascimento, são fatores de risco para obesidade: prematuridade, baixo peso ou excesso de peso para a idade gestacional, ausência de amamentação nos primeiros 150 dias e alto consumo de proteínas.
Fatores de risco para obesidade em idades posteriores incluem: excesso alimentar, preferência por fast-food, omitir o café da manhã, comer na madrugada, excesso de tempo de tela (televisão, computador e celulares), sedentarismo, redução no tempo de sono e menor variabilidade na temperatura ambiente (pelo uso de ar condicionado e aquecedores), alterações no microbioma (micro-organismos que vivem no corpo humano) e exposição a Desruptores endócrinos (substâncias que alteram os hormônios, presentes em plásticos, derivados de petróleo, cosméticos, defensivos agrícolas e outros).
Longe de ser apenas uma questão estética, a obesidade é importante causa de morbidade. A criança obesa está sujeita a apresentar complicações em diversos órgãos e sistemas: endócrino-metabólicas, cardiovasculares, gastrointestinais, pulmonares, ortopédicas, neurológicas, dermatológicas, renais e psicológicas. Além de comprometer a qualidade de vida, a obesidade se associa a 3,4 milhões de mortes por ano, reduzindo a expectativa de vida não só de adultos, mas também de crianças com obesidade grave.
Essas comorbidades podem se apresentar ainda na infância: em torno de 60% dos escolares obesos apresentam ao menos um fator de risco cardiovascular (hiperinsulinemia, resistência insulínica, pré-diabetes, diabetes, dislipidemia, hipertensão arterial, doença hepática não alcóolica e fatores pró-trombóticos) e entre 20 a 25% delas têm dois ou mais desses fatores. Sobrepeso e obesidade na adolescência são responsáveis por até 20-25% das mortes cardiovasculares nos adultos
- Como deve ocorrer a prevenção da obesidade infantil?
A prevenção da obesidade infantil passa por hábitos saudáveis de toda a sociedade. Se inicia antes mesmo da gestação, com peso saudável dos pais, passa por uma gestação saudável, amamentação e desmame adequado. Um dos pilares para o combate à obesidade é a mudança de hábitos de vida. O foco é ter uma alimentação saudável, beber água, praticar exercícios e ter um sono adequado. Mudanças simples no cotidiano podem mudar a vida de crianças. Veja as orientações:
*Praticar 1 hora de atividade física, de moderada a intensa, todos os dias;
*Consumir, pelo menos, 5 porções de frutas e verduras todos os dias;
*Antes dos dois anos de idade, não exponha a criança a TVs, tabletes ou smartphones. Após os dois anos de idade, o tempo máximo de tela não deve ultrapassar 2 horas/dia;
*A ingestão de alimentos ultraprocessados (salgadinhos de pacote, bolachas recheadas, refrigerantes, etc) deve ser eventual;
*Assegurar as horas necessárias para o sono reparador;
*Beber água à vontade, deixar uma garrafinha ao alcance da criança.
No caso das crianças é fundamental que a família participe da mudança de hábitos de vida. O sucesso da prevenção e do tratamento depende da colaboração de todos. Afinal, “a palavra convence, mas o exemplo arrasta”!
- Há tratamento para a obesidade infantil?
Além da mudança de hábitos de vida, algumas crianças e adolescentes precisarão utilizar medicamentos para tratar condições associadas à obesidade, como diabetes, alteração de triglicérides e colesterol, compulsão alimentar, transtorno de ansiedade, entre outros. O HC-UFG conta com ambulatórios nas áreas de endocrinologia infantil e outras especialidades que compõem a equipe multiprofissional necessária para o tratamento das crianças e adolescentes obesos.
- Trace um breve cenário atual da obesidade infantil no Brasil e no mundo.
Com relação à população brasileira, os dados oficias mais recentes são da Pesquisa Nacional de Saúde executada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em conjunto com o Ministério da Saúde, que avaliou o estado nutricional apenas de adultos. Após visitar 81.767 residências de todo o país, a Pesquisa revelou que 56,9% dos brasileiros adultos estão com sobrepeso e 20,8% já estão obesos. Os últimos dados oficiais do estado nutricional de crianças e adolescentes brasileiros foram obtidos da pesquisa de Orçamentos Familiares publicados em 2010.
Na faixa etária adolescente (10 a 19 anos), o excesso de peso em 1974-75 era de 3,7% e 7,6% em meninos e meninas respectivamente, tendo aumentado para 21,7% e 19% no período de 2008-2009.Para esse mesmo período, a obesidade estava presente em 5,9% dos meninos e 4% das meninas.
Na faixa etária escolar (5 a 9 anos), observou-se um acréscimo ainda maior: nos anos de 1970 o sobrepeso estava presente em 10,9% dos meninos e 8,6% das meninas, e nos anos 2000 os números subiram para 34,8% e 32% em meninos e meninas. A proporção de obesos se elevou em mais 300%, saltando de 4,1% em 1974-1975 para 16,6% em 2008-2009.