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REDE DE APOIO
Quem cuida dos cuidadores?
Os cuidadores se queixam de invisibilidade social, rede de apoio reduzida, sobrecarga, além de estresse, impacto financeiro e interrupção de suas atividades de trabalho, lazer e de participação social. Imagem ilustrativa: freepik
Rio de Janeiro (RJ) – Cuidar de uma pessoa com demência pode ser muito desafiador. A atenção ao cuidador, muitas vezes negligenciada, afeta também de forma direta ou indireta essa assistência. Criado há mais de 10 anos, o grupo de cuidadores do Serviço de Geriatria do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (HUCFF-UFRJ), é um espaço de troca de vivências entre cuidadores familiares de pessoas idosas com demência como também de aprendizado prático sobre o cuidado desses pacientes.
O grupo, que foi criado pelo Serviço Social, foi temporariamente interrompido durante a pandemia de Covid-19. Em 2023, foi reativado no formato de projeto de extensão com o nome “Cuidar: cuidado e reciprocidade entre cuidadores de pessoas idosas com demência”. A equipe do projeto é composta por médicos geriatras, assistentes sociais e duas docentes do departamento de Terapia Ocupacional, além de estagiários, residentes e estudantes de diversos cursos de graduação. Enfermeiros, psicólogos, nutricionistas, dentistas e fisioterapeutas também participam em atividades pontuais com os cuidadores. Há, em média, 40 cuidadores cadastrados. As reuniões acontecem todas as terceiras quintas-feiras de cada mês, das 14h às 15h30, no segundo andar do HUCFF, unidade que faz parte da rede de hospitais administrados pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh).
Sobrecarga e a necessidade de apoio institucional e financeiro aos cuidadores
Uma das coordenadoras do projeto e professora do departamento de Terapia Ocupacional, Carolina Rebellato, expõe que os cuidadores reclamam da invisibilidade social, rede de apoio reduzida, alto nível de sobrecarga e de estresse, impacto financeiro e da interrupção de suas atividades de trabalho, lazer e de participação social. “Além das queixas, também trazem dúvidas relacionadas ao manejo dos sintomas comportamentais e psicológicos da demência e do cuidado prático da pessoa idosa, como realizar atividades de banho, vestuário, higiene e alimentação com segurança, por exemplo”, relata Carolina.
Os sentimentos são conflitantes. Como explica Carolina, há momentos em que contam sentir tristeza, raiva, solidão, culpa, como também aspectos positivos da experiência de cuidar, como sensação de bem-estar, dever cumprido, crescimento pessoal e de aproximação afetiva. “De qualquer forma, há a necessidade social de valorizar o papel de cuidadores em nosso país, oferecendo suporte financeiro e institucional”, defende.
Janaína Nascimento, também coordenadora do projeto, professora e chefe do Serviço de Terapia Ocupacional, explica que a reabertura do grupo se deu pela percepção por parte da equipe da necessidade de apoiar, de forma interdisciplinar, os cuidadores no processo de compreensão da doença e de seus principais sintomas, além de pensar no cuidado de si mesmo e do paciente. “A troca de experiência entre cuidadores de pessoas idosas em diferentes fases da doença em um mesmo grupo facilita o acolhimento e a construção de estratégias de cuidado que são úteis para o momento atual e para o futuro”, analisa Janaína.
Segundo as coordenadoras da iniciativa, muitos estudos apontam que os cuidadores familiares de pessoas idosas apresentam maiores riscos de apresentarem problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade.
“O grupo é uma terapia pra mim”
A aposentada Mabel da Silva Cardoso Aroeira, 66 anos, vive a dura rotina de cuidar de duas pessoas com Alzheimer. Participando do grupo há cerca de um ano, ela cuida da mãe e do marido. A mãe, de 90 anos, começou a mostrar sinais em 2015. Já o marido, de 80 anos, passou a demonstrar os sintomas depois da Covid-19, em 2020. Ele chegou a ficar internado por 45 dias no HUCFF. “Meu marido teve uma Covid bem séria. Antes, ele só tinha alguns esquecimentos. Mas depois da Covid, ele foi ficando apático. Parece estar num estágio mais grave que minha mãe, que está doente há mais tempo”, descreve Mabel.
A mãe, por sua vez, é bastante agitada. “É muito difícil também porque ela fica atrás de mim o tempo todo. Parece que desenvolveu uma obsessão por mim. A pressão dela sobe, caso eu precise sair. Em casa, é difícil ter paz”, diz Mabel, que se ressente da ausência dos familiares. “Ninguém da família quer morar com eles. Ajudam um pouco pagando uma ajudante, mas sou eu que cuido a todo momento”.
A participação no grupo de apoio e a assistência que recebe do Serviço de Geriatria do HUCFF aliviam um pouco a rotina e proporcionaram que ela aprendesse algumas formas de lidar com a situação. “Algumas vezes, meu marido não me reconhece, me pede coisas sem sentido, mas aprendi a não contestar. O grupo é uma terapia para mim. Gosto de muito de vir. A gente troca muitas experiências. Esse grupo está sendo praticamente a única atividade que faço fora de casa. Mesmo cansada, eu venho”.
Recorte de gênero na atividade de cuidado não remunerado
A Política Nacional de Cuidados traz em suas diretrizes a importância da promoção da corresponsabilização social na provisão de cuidados. Mas na realidade, há um recorte de gênero atrelado ao cuidado. “As mulheres, geralmente, somam responsabilidades. Além de cuidar da pessoa idosa, cuidam também de netos e da casa e, por vezes, trabalham de maneira informal, o que aumenta a sobrecarga”, argumenta Carolina.
No entanto, quando os homens precisam assumir o cuidado de forma prioritária, podem apresentar maiores dificuldades em lidar com questões práticas, visto que não aprenderam sobre isso ao longo da vida. “Temos que oferecer o suporte para ambos”, destaca.
Sobre a Ebserh
O Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) faz parte do Complexo Hospitalar da UFRJ, administrado pela Ebserh desde junho de 2024. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 45 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência. Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) ao mesmo tempo que apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas e inovação.
Por Claudia Holanda, com revisão de Danielle Morais
Coordenadoria de Comunicação Social/Ebserh