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Esclerose Múltipla é mais grave em crianças, alerta neurologista que atua em hospital da Rede Ebserh
A esclerose múltipla não é comum em crianças, sendo que menos de 5% dos casos ocorrem em pessoas com idade inferior aos 18 anos
Goiânia (GO) – Trinta de agosto é o Dia Nacional de Conscientização sobre a Esclerose Múltipla (EM), uma doença neurológica, crônica, progressiva e autoimune. Mesmo não sendo comum em crianças, ela é mais grave nesta fase, com surtos mais intensos e frequentes. Para saber mais sobre o assunto, leia a entrevista com a médica neurologista do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG), hospital vinculado à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh,) e professora auxiliar da UFG, Taysa Ribeiro.
1.O que é esclerose múltipla?
A esclerose múltipla (EM) é uma doença neurológica, crônica, progressiva e autoimune. Isso significa que as células de defesa do nosso corpo atacam nosso próprio sistema nervoso - como se ele não pertencesse ao nosso organismo - e afeta o cérebro, olhos e a medula espinhal. Esse ataque acontece porque o sistema imunológico confunde as células saudáveis da bainha protetora dos nervos como “células invasoras” e começa a atacá-las, corroendo e provocando lesões desmielinizantes, que provocam interferências na comunicação entre nosso cérebro e nosso corpo. Por exemplo, os comandos (estímulos cerebrais) que o cérebro envia à mão, não chegam adequadamente, causando paralisia, dormência ou incoordenação do movimento.
A doença é dividida em três tipos: a forma remitente-recorrente é o tipo mais comum e cerca de 85% dos pacientes apresentam essa forma. Caracteriza-se pela ocorrência de surtos súbitos (surtos são definidos por manifestações neurológicas típicas da esclerose múltipla, que duram no mínimo 24 horas e depois melhoram); a forma primária, quando o paciente não apresenta surtos, mas desenvolve sintomas e sequelas progressivamente; e a esclerose múltipla secundária progressiva, que é definida quando o paciente apresenta inicialmente surtos e remissões e, após algum tempo, a doença se torna progressiva e o paciente piora de forma lenta.
Apesar de não ser mais uma sentença de morte, a doença gera uma incapacidade importante: 50% dos pacientes vão precisar de um apoio para andar, depois de 15 a 20 anos do primeiro sintoma.
2.Crianças também podem ser vítimas da doença?
A esclerose múltipla não é comum em crianças, sendo que menos de 5% dos casos ocorrem em pessoas com idade inferior aos 18 anos. Porém, a doença é mais grave em crianças, com surtos mais intensos e mais frequentes. Antes dos 6 anos de vida, ela acomete igualmente meninos e meninas, mas, com o passar dos anos, torna-se mais comum em meninas. A forma clínica mais comum em crianças é a forma remitente-recorrente.
3. Quais as causas da doença?
As causas da doença ainda não estão esclarecidas. Existe uma predisposição genética associada a fatores ambientais, como a exposição ao sol, níveis de vitamina D, tabagismo, infecções por vírus e obesidade na infância. A obesidade, além de ser um fator de risco, é também um fator de mau prognóstico, pois crianças obesas tendem a evoluir pior. Desta forma, todas as crianças devem ter uma alimentação saudável.
4. Os sintomas apresentados nas crianças costumam ser os mesmos dos adultos?
O diagnóstico não é fácil em crianças, sendo fundamental excluir outras doenças com sintomas semelhantes, como abcessos cerebrais, edema cerebral, encefalopatia aguda disseminada, neurite óptica, mielites, epilepsia e outras doenças genéticas, como a atrofia espinhal ou cerebelar.
Os sintomas mais comuns são: visão dupla ou turva, movimentos involuntários dos olhos, fraqueza para andar, alteração do equilíbrio, tonturas, dificuldade para falar ou engolir, tremor, dormência, formigamento ou sensações estranhas no corpo, incapacidade de controlar a urina, dificuldade escolar, devido a problemas de concentração, atenção e memória.
A doença é mais ativa nas crianças, com mais surtos e muitas vezes mais lesões no cérebro, mas a recuperação normalmente é melhor.
5.O que é necessário para a confirmação do diagnóstico da doença ainda na infância?
É necessário que haja evidência de atividade da EM em duas ou mais partes do sistema nervoso central (cérebro, medula e/ou nervos ópticos), e que essas lesões e/ou sintomas tenham ocorrido em diferentes ocasiões. Se a criança apresentou um único episódio de sintomas, o diagnóstico de EM não pode ser confirmado.
Para realizar o diagnóstico de EM na criança, os médicos precisarão fazer os mesmos exames que fazem nos adultos para o diagnóstico da doença: exame neurológico clínico (perguntas sobre os sintomas, sobre a vida do paciente, seus hábitos, como ele se sente além de alguns testes de reflexos, sensações, movimento, marcha etc.); ressonância magnética (para identificar lesões no sistema nervoso central por meio de imagens); exames de potencial evocado (que medem o tempo que o cérebro leva para receber uma informação visual e/ou motora – depende do exame pedido pelo médico); punção lombar (para retirada de amostra do fluido cerebroespinhal).
6- Como falar com a criança que foi diagnosticada com EM?
Devemos ser honestos com as crianças e fornecer informações sobre o diagnóstico e prognóstico. A criança e a família têm a oportunidade de conversar, fazer perguntas e compartilhar sentimentos e preocupações. A criança passará por uma rotina de exames e idas ao médico, e pode ser importante para ela entender o porquê de tudo isso.
A criança deve ouvir que ela não está morrendo e que ela não morrerá, e que a EM não é culpa dela ou devido a alguma coisa que ela fez. Há boas razões para dizer à criança sobre o diagnóstico, mas essa escolha é individual de cada família.
7. Como é tratamento da doença e quais as principais complicações se a criança não for tratada ou se tratada tardiamente?
A doença tem um curso progressivo e incapacitante. Os medicamentos disponíveis para o tratamento da EM conseguem apenas retardar a incapacidade, mas não curam a doença. A necessidade de um diagnóstico precoce, o tratamento adequado e a boa adesão são cruciais para alterar o curso devastador da doença e para melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Existe um protocolo de tratamento do Ministério da Saúde no qual apenas as diferentes formulações das medicações interferon beta e o glatiramer estão aprovadas para o uso em crianças. Este protocolo está em revisão e, em breve, o fingolimode, outra medicação mais potente será incorporada. São medicações de alto custo, e dispensadas pelo Sistema Único de Saúde.
O HC-UFG/Ebserh conta com uma equipe multidisciplinar, com neurologistas, psicólogo, enfermeira e fisioterapia, oferecendo assistência e tratamento aos portadores da doença, além de treinamentos para profissionais de saúde. Além disso, realiza pesquisas científicas que objetivam o avanço do conhecimento sobre a EM.
8. Quais as recomendações mais relevantes para crianças diagnosticadas com a doença?
Quando se tem o diagnóstico de esclerose múltipla, especialmente em crianças, a primeira sensação é de que uma bomba caiu na sua cabeça. Existe uma sensação de revolta, culpa e incerteza muito grande.
Quando a esclerose múltipla é detectada precocemente e tratada conforme indicação médica, associada a mudanças no estilo de vida (prática regular de atividade física, alimentação equilibrada), o paciente reduz o número de possíveis surtos e evita sequelas.
Apesar dos desconfortos gerados, com a medicação a pessoa consegue levar uma vida ativa e produtiva. Acredito que o esclarecimento dos pais e da criança, com uma boa relação médico-paciente, são fundamentais para o sucesso terapêutico.
9. Quais os principais avanços da medicina relativos ao enfretamento da doença?
É incrível observar a velocidade da tecnologia na medicina. Há 25 anos, não existia nenhum tratamento. Hoje, no Brasil, já existem pelo menos 12 tratamentos aprovados. Devemos lutar para que todos tenham acesso aos medicamentos, e pelo acompanhamento multidisciplinar, deixando para trás os sentimentos de ansiedade, frustração e impotência.
10.Considerações finais se as considerar necessárias.
Aceitar e conviver com uma enfermidade que limita e incapacita o indivíduo para uma série de atividades não é uma tarefa fácil. Pelo contrário, é uma tarefa árdua, sendo necessária muita força de vontade e equilíbrio emocional para aceitar essa nova condição de vida, sem causar danos irremediáveis ao próprio ser. Realmente, nada disso é simples, mas o caminho para a aceitação é a informação.
Sobre a Rede Ebserh
Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) foi criada em 2011 e, atualmente, administra 40 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência.
Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), e, principalmente, apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas.
Devido a essa natureza educacional, os hospitais universitários são campos de formação de profissionais de saúde. Com isso, a Rede Ebserh atua de forma complementar ao SUS, não sendo responsável pela totalidade dos atendimentos de saúde do país.
Com informações do HC-UFG/Ebserh