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MEDICINA FETAL
Cirurgia para correção de fechamento da coluna antes do nascimento é realizada no CH-UFRJ/Ebserh
Rio de Janeiro (RJ) - Desde dezembro de 2017, a Maternidade Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro (ME-UFRJ) tem um convênio com o Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer (IECPN) para realização da cirurgia de correção da mielomeningocele com o feto ainda em gestação, tendo operado 65 pacientes até setembro de 2024. A ME faz parte do Complexo Hospitalar da UFRJ (CH-UFRJ), gerido pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), e é referência no tratamento da doença pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A mielomeningocele é uma malformação caracterizada pelo fechamento incompleto da coluna vertebral enquanto o sistema nervoso ainda está em formação. Também conhecida como espinha bífida, pode causar complicações como déficit motor das pernas e do controle dos esfíncteres (de fezes e urina) além de hidrocefalia (acúmulo excessivo de líquido no cérebro causando aumento do crânio). Após a publicação do estudo Management of Myelomeningocele Study (MOMS) em 2011, a cirurgia intrauterina da mielomeningocele ganhou visibilidade. Até então, a correção era feita após o nascimento do bebê.
A ocorrência da malformação é de um a cada mil nascimentos no Brasil. São três mil casos por ano no país. O estudo MOMS apontou evidências que fazer a operação durante a gestação para correção do fechamento incompleto da coluna vertebral com o feto dentro do útero traz resultados melhores para o bebê do que esperar nascer e corrigir. As chances de minimizar problemas decorrentes da malformação na coluna e melhorar a qualidade de vida da criança são altas.
“A prática tradicional que existe há 80 anos é fazer a cirurgia após o parto. O bebê nasce com a coluninha aberta e o neurocirurgião faz a operação para fechá-la nos primeiros dias, o mais rápido possível”, esclarece Jair Braga, chefe da Divisão Médica da Maternidade Escola e cirurgião do Setor de Medicina Fetal. “No entanto, quando a gente opera dentro do útero, dobram as chances de a criança andar sem qualquer auxílio e reduz à metade a necessidade de implante de dreno na cabeça para retirada do excesso do líquido do cérebro”, completou.
Do desespero ao acolhimento
Iasmina Pereira Antunes e Luís Vitor descobriram que o filho tinha a doença durante o exame de ultrassonografia morfológica numa clínica particular em Nova Iguaçu, onde moram. “Ficamos muito nervosos, não tínhamos informação a respeito e os médicos de lá também não sabiam como tratar o problema”, lembrou Iasmina.
Depois da consulta, o casal saiu em busca de tratamento. “Passamos por vários profissionais e ouvimos coisas muito pesadas. Diziam que nosso filho teria horas de vida, que ele ia ficar em estado vegetativo, que não tinha jeito. Uma vez, uma médica falou que nosso filho seria igual a uma cenoura, enfim, foi horrível. Ficamos desesperados”, relatou.
Pesquisando na Internet, o marido Luís Vitor viu um vídeo da cirurgia intrauterina de mielo. Ele entrou em contato com a pessoa que postou e foi informado da possibilidade de fazer a operação na Maternidade Escola da UFRJ, pelo (SUS). Conseguiram atendimento na maternidade e foram atendidos primeiramente pelo médico Cristos Pritsivelis, responsável pelo setor de Medicina Fetal e chefe do serviço de Ultrassonografia da maternidade. “A abordagem foi outra, nos sentimos acolhidos. Foram duas horas no consultório e ele nos falou que a mielo não tem cura completa, mas que poderia reduzir sequelas com a cirurgia”, recorda Iasmina.
Decidida a fazer a cirurgia, o procedimento aconteceu duas semanas depois da consulta. Tudo correu bem com ela e com o feto. Meses depois, seu filho nasceu na data programada de parto cesárea. Em junho de 2024, Samuel completou dois anos e começou a andar sozinho. A principal sequela dele é a bexiga neurogênica (distúrbio nas funções da bexiga, causado por lesões neurológicas).
As funções cognitivas de Samuel não foram alteradas. Como diz a mãe, “ele interage, brinca, fala e faz teimosia”. Só demorou um pouquinho mais do que uma criança típica e, em 2025, vai entrar na escolinha.
Samuel, hoje em dia, continua sendo assistido pelo Setor de Neuropediatria da maternidade e pelos setores de Pediatria e Urologia do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira (IPPMG), que também compõe o Complexo Hospitalar da UFRJ, gerido pela Ebserh.
A cirurgia intrauterina de Mielo
A cirurgia intrauterina a céu aberto é feita pela equipe de Obstetrícia da ME e pela equipe de Neurocirurgia do IECPN. É um procedimento delicado e impressionante. “O obstetra abre a barriga da paciente como se fosse realizar uma cesariana, retira o útero, posiciona a coluna do neném e faz uma incisão no útero de 3 cm, em média. A lesão na coluna do bebê então fica exposta para que a equipe de neuro possa corrigir a malformação. Depois, o bebê é colocado de volta na barriga da mãe e a gestação continua”, descreve o médico Jair Braga. São duas cirurgias ao mesmo tempo, na mãe e no bebê.
Por conta do convênio com o Instituto Estadual do Cérebro Paulo Niemeyer (IECPN) - que é especializado em Neurocirurgia - pacientes de todo estado do Rio de Janeiro e de vários lugares do Brasil estão sendo encaminhadas pelo sistema de regulação do SUS. A cirurgia geralmente é feita entre 18 e 26 semanas de gravidez.
A mielomeningocele deixa a medula exposta ao líquido amniótico e em atrito com a parede do útero, causando traumas. Da medula é de onde sai a enervação que vai levar o impulso elétrico para viabilizar a movimentação das pernas. O fechamento da mielo ainda no útero possibilita uma melhor qualidade de vida para o bebê, com a redução de danos na coluna e na medula espinhal.
“Tive e continuo tendo um acompanhamento excelente de todos os profissionais, o que foi muito importante na aceitação da mielo. A gente estava num buraco escuro e essa equipe tirou a gente de lá. Acho muito importante que as pessoas saibam desse trabalho para buscar ajuda. Muita gente pode estar precisando”, assinalou Iasmina.
Sobre a Ebserh
A Maternidade Escola faz parte do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), gerido pela Ebserh desde junho de 2024. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Ebserh foi criada em 2011 e, atualmente, administra 41 hospitais universitários federais, apoiando e impulsionando suas atividades por meio de uma gestão de excelência. Como hospitais vinculados a universidades federais, essas unidades têm características específicas: atendem pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) ao mesmo tempo que apoiam a formação de profissionais de saúde e o desenvolvimento de pesquisas e inovação.
Redação: Claudia Holanda, com revisão de Danielle Campos.
Coordenadoria de Comunicação Social da Ebserh