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Deputado Edson Duarte faz pronunciamento na Câmara sobre 100 anos do DNOCS
Veja a íntegra do pronunciamento:
O SR. EDSON DUARTE (PV-BA. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Inocêncio
Oliveira, grande nordestino nesta Casa, Sras. e Srs. Deputados, neste breve
pronunciamento, quero fazer um registro, já que estamos encerrando as nossas
atividades deste ano.
No dia 21 de outubro de 2009 o Departamento Nacional de Obras contra as Secas —
DNOCS fará 100 anos de fundação. Um século de atuação em todo o semi-árido.
Patrimônio do povo nordestino, o DNOCS tem a sua marca impressa em cada palmo de
chão dessa região. Podemos afirmar que a história do DNOCS se confunde com a
própria história da Região Nordeste, quando conhecemos sua trajetória para
minimizar os efeitos da seca.
Em homenagem ao seu centenário, nós, Deputados nordestinos e de outras regiões
do País, lançamos campanhas que englobam diversas ações a favor da revitalização
e redefinição do papel do DNOCS. Uma das ações é a constituição da Frente
Parlamentar em Defesa da Revitalização do Departamento Nacional de Obras Contra
as Secas — DNOCS, com o objetivo de consolidá-lo como braço executivo do Governo
Federal para o desenvolvimento sustentável do semi-árido brasileiro.
Em função das mudanças climáticas, decorrentes do aquecimento global, estima-se
que a temperatura do semi-árido brasileiro irá aumentar em até 4º C, segundo o
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais — INPE. O aumento da temperatura média
implicará maior incidência de eventos extremos (secas e enchentes) e uma redução
do volume de chuvas e sua maior variabilidade, levando, inevitavelmente, a uma
ampliação da região semi-árida, à expansão do subúmido seco para zonas do
cerrado e ao aparecimento de regiões semidesérticas. Haverá também um
significativo aumento da evaporação, que deve impactar nos níveis dos
reservatórios e dos rios do Nordeste e em mudanças do ciclo agrícola, tornando-o
ainda mais curto.
O semi-árido brasileiro tem uma área total de 1 milhão de quilômetros quadrados,
quase todo ele suscetível ao processo de desertificação. Sua população é de 24
milhões de pessoas; 18 milhões vivem nessas áreas vulneráveis à desertificação.
Ressalte-se que a região do semi-árido é a mais vulnerável ao aquecimento,
sendo, conseqüentemente, a primeira a sentir seus efeitos. Até 2050 a
desertificação e a salinização afetarão 50% das terras agrícolas da América
Latina e do Caribe.
Embora os números sejam assustadores, assim como as perspectivas para um futuro
bastante próximo, muito pouco foi feito no sentido de preparar o País para as
mudanças. Contudo, seria um erro afirmar que a ausência de ações decorre da
falta de estudos e propostas que possam se transformar em políticas públicas
efetivas para o semi-árido.
O Brasil, por exemplo, tem apresentado diversas propostas para o desenvolvimento
sustentável do semi-árido, que têm sido reconhecidas não só internamente, como
também por países que convivem com a mesma problemática. Um dos maiores exemplos
é o Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos
Efeitos da Seca — PAN.
O maior obstáculo é a fragilidade das instituições e das entidades encarregadas
dessas políticas. Os órgãos do Governo Federal que atuam no semi-árido foram
esvaziados e enfraquecidos ao longo dos anos, a exemplo do que aconteceu com a
SUDENE, e os Governos Estaduais não foram suficientemente competentes para
imprimir uma ação governamental que aplicasse políticas públicas para enfrentar
o drama das secas. Por isso que é preciso repensar o DNOCS dentro desse vácuo
institucional, da nova realidade brasileira e mundial, das propostas formuladas
e das experiências acumuladas ao longo da história.
É preciso sair das ações emergenciais contra efeitos das secas ou das enchentes
para ações duradouras, que integrem as diversas áreas de atuação do Poder
Público, diferentes entes políticos e dos vários grupos sociais. Esse esforço se
apóia na percepção estratégica de que o semi-árido brasileiro precisa se
constituir em espaços dinâmicos e de prosperidade produtiva e social.
O DNOCS e a sua história.
O Departamento Nacional de Obras Contra as Secas se constitui, entre os órgãos
regionais, na mais antiga instituição federal com atuação no Nordeste. Criado
sob o nome de Inspetoria de Obras Contra as Secas — IOCS pelo Decreto nº 7.619,
de 21 de outubro de 1909, editado pelo então Presidente Nilo Peçanha, foi o
primeiro órgão a estudar a problemática do semi-árido. Em 1919, passou a
denominar-se Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas — IFOCS, vindo a
assumir sua denominação atual em 1945 e transformado em autarquia federal pela
Lei nº 4.229, de 1º de junho de 1963.
De 1909 até por volta de 1959 foi, praticamente, a única agência governamental
federal executora de obras de engenharia na região. Construiu açudes, estradas,
pontes, portos, ferrovias, hospitais e campos de pouso. Implantou redes de
energia elétrica e telegráficas, usinas hidrelétricas e foi, até a criação da
SUDENE, o responsável único pelo socorro às populações flageladas pelas secas.
Chegou a se constituir na maior "empreiteira" da América Latina na época em que
o Governo Federal construía, no Nordeste, suas obras por administração direta,
tendo marcado com a sua presença, praticamente, todo o solo nordestino. Além de
grandes açudes, como o Orós, o Banabuiú, o Araras — todos localizados no Estado
do Ceará — , o sistema Coremas/Mãe D'Água, maior açude da Paraíba, o Cocorobó,
na Bahia, podemos registrar também a construção da rodovia Rio/Bahia e o início
da construção da barragem de Boa Esperança, no Estado do Piauí.
A criação da antiga Inspetoria de Obras Contra as Secas permitiu que, no âmbito
da estrutura de Estado, fossem realizados estudos para uma região bastante
carente de informações, valendo-se para isso de grandes especialistas nas áreas
de agronomia, botânica, geologia, engenharia e hidrologia. Em seguida, suas
ações foram mais dirigidas para o estabelecimento de uma infra-estrutura de
transporte, capaz de propiciar o socorro urgente e a fuga rápida das populações
atingidas pelas secas.
Paralelamente vieram as obras de atenuação dos efeitos das secas pela retenção
dos escoamentos superficiais ou pelo acesso a mananciais subterrâneos, sempre
necessários devido à escassez das águas e sua má distribuição no tempo.
Finalmente, passou-se a uma etapa em que o DNOCS assumiu a postura de grande
empresa pública de levantamentos, estudos, projetos e obras. O Departamento
tinha um grande parque de máquinas e o número de contratados e funcionários
alcançavam mais de 30 mil pessoas. Por ocasião das secas, com os alistamentos,
esse número chegava a 100 mil pessoas. Esse procedimento de construir por
administração direta foi a tônica dominante, especialmente dos anos 40 aos 60,
com uma forte ênfase no Governo Juscelino, quando foi construída boa parte das
grandes obras hoje existentes.
Posteriormente, modificações institucionais obrigaram a novos procedimentos, com
a execução das obras a cargo de empresas privadas e as ações emergenciais de
atendimento às vítimas do flagelo das secas a serem executadas por outros órgãos
do Governo Federal. A partir deste momento, as ações do DNOCS se voltaram para
obras de distribuição mais extensiva das disponibilidades hídricas, vinculadas a
vários usos, notadamente ao abastecimento humano, à irrigação e à piscicultura.
Com a criação dos órgãos especializados, o acervo de obras construídas pelo
Departamento vinculado a ações "não hídricas", como rodovias, linhas de
transmissão, ferrovias, portos, etc., foram aqueles transferidos. Posteriormente
transferiram-se aos Estados as redes de abastecimento urbano e à SUVALE, hoje
CODEVASF, os projetos públicos de irrigação situados no vale do Rio São
Francisco e hoje, também, no Vale do Parnaíba. A CODEVASF também passou, junto
com Estados e Municípios, a perfurar poços e construir barragens; antes
atribuições quase que exclusivas do DNOCS.
O fato é que a entidade perdeu inúmeras de suas atribuições iniciais e, ao final
do Governo FHC, chegou a ser encaminhada proposta para a sua extinção. Mesmo com
a retomada de suas atividades no Governo Lula, a falta de infra-estrutura e a
defasagem em seu quadro funcional prejudicaram o desempenho da instituição. Há
mais de 20 anos não é realizado concurso público para a seleção de novos
funcionários. Além disso, outras ações governamentais têm prejudicado o DNOCS,
como a tentativa da transferência de atividades de sua competência para a
iniciativa privada e a ingerência das agências reguladoras.
Procuramos, então, fundados nesse contexto de profundas mudanças climáticas e no
histórico de uma instituição que possui um relevante patrimônio, principalmente
no plano do conhecimento acumulado, encetar todos os nossos esforços no sentido
de recuperarmos os preceitos que levaram à sua criação como instituição, com
foco na relação proativa do homem com o meio ambiente e na construção de uma
política de convivência com o semi-árido, pondo em prática os conceitos de
transversalidade, transparência e descentralização, além do estabelecimento de
parcerias construtivas com todos os segmentos da sociedade.
O acervo do DNOCS.
A partir de 1911, foi dado um enfoque científico pioneiro no tratamento da
questão da seca, por levantamentos e estudos abrangendo a geografia, a geologia,
a hidrogeologia, a hidrografia, a meteorologia, a botânica, a fitogeografia e a
cartografia. Esta nova visão, associada a outras ações praticadas pelo DNOCS,
tais como: a utilização na América Latina de perfuratrizes para perfurar poços
profundos; a introdução no Brasil da técnica de construção de barragens de
terra, com tecnologia própria e eficiência atestada por mais de mil obras do
gênero; a implantação do primeiro laboratório de solos da América Latina; a
introdução na piscicultura de técnicas pioneiras; e a produção controlada de
pescado em cativeiro, gerou uma produção técnica e científica de grande
expressividade.
Do acima exposto é fácil se depreender a importância e a magnitude do acervo
histórico e documental existente sob a guarda do DNOCS. Trata-se, sem dúvida
alguma, de material de relevante importância para os estudiosos da problemática
das secas e, o que é mais importante, fundamental para que as novas gerações
tenham conhecimento da história da ocupação do semi-árido e da incessante luta
do sertanejo para conviver com as adversidades climáticas da região.
Qualquer estudo que se pretenda sério sob as questões que afligem o semi-árido,
seja sob o viés geoambiental, tecnológico, histórico, sociológico ou
antropológico, não poderá prescindir das informações contidas no acervo
bibliográfico que o DNOCS dispõe. O que se faz necessário é dar mais
acessibilidade e visibilidade a esse acervo.
Por outro lado, é necessário registrar que o acervo acima referido encontra-se
disperso pelos 9 Estados que integram a área de atuação do DNOCS, no mais das
vezes em condições inadequadas ou praticamente inacessíveis aos estudiosos da
problemática das secas e da comunidade em geral.
Isso faz com que esse acervo e essa memória documental sejam dignos não só de
serem preservadas e colocadas à disposição de pesquisadores e estudiosos do tema
como também irão contribuir para a continuidade do processo de geração de novos
conhecimentos que promovam o desenvolvimento tecnológico e a inserção regional
no desenvolvimento do nosso País.
O que pretendemos com esse breve resumo da história do DNOCS é deixar registrado
o papel relevante desempenhado pela mais antiga agência governamental com
atuação no Nordeste brasileiro e reafirmar que pela sua história de compromisso
com o Nordeste, o DNOCS tem todas as condições de voltar a ser um dos pilares do
desenvolvimento regional.
Propostas.
Diante desse quadro, gostaríamos de sugerir, no ano do centenário do DNOCS, que
sejam apresentadas propostas para a reformulação do seu papel no desenvolvimento
sustentável do semi-árido nordestino.
É importante que essas propostas sejam construídas de forma compartilhada com
outras áreas do Governo Federal, com representantes dos Governos Estaduais e
Municipais, com entidades de pesquisa, universidades, órgãos de cooperação
técnicas e com entidades da sociedade civil organizada.
Sugestões para o novo DNOCS.
Com o intuito de contribuir com os debates, que já vêm ocorrendo no âmbito do
DNOCS e do Ministério da Integração, apresentamos abaixo sugestões para a nova
instituição, com base em documentos produzidos pelo próprio Governo Federal, a
exemplo do Ministério do Meio Ambiente, pela Coordenação de Combate à
Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca, e pelas entidades da sociedade
civil, mobilizadas pela Articulação no Semi-Árido — ASA.
Organizar e disponibilizar à sociedade as informações acerca do conhecimento
produzido em relação à temática regional, não só pelo DNOCS, ao longo dos seus
100 anos de existência, como também pelos diversos segmentos governamentais e
não governamentais, devendo funcionar em rede com outras instituições que atuem
na área da pesquisa e do desenvolvimento científico e tecnológico.
Mobilizar pesquisadores, estudiosos e suas instituições, a exemplo do ISA, da
EMBRAPA, das universidades federais e estaduais, para que possam contribuir com
a geração de novos conhecimentos e tecnologias.
1. Ser o mobilizador e o interlocutor dos Governos Estaduais, Municipais, do
setor privado e da sociedade civil organizada para a construção de parcerias que
ajudem a implementar os programas e as políticas públicas voltadas para o
semi-árido.
2. Formular diretrizes para a concepção, formulação e revisão de políticas e
ações de apoio ao desenvolvimento sustentável das áreas susceptíveis ou afetadas
por processos de desertificação.
3. Aprimorar o conhecimento dos processos de desertificação e de ocorrência de
secas no Brasil, que devem ser atualizados sistematicamente, de modo que se
possa antecipar ações que minimizem os seus efeitos.
4. Implementar ações pactuadas que levem ao desenvolvimento sustentável de áreas
afetadas e sujeitas a processos de desertificação, segundo os princípios e
orientações da Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação e
Mitigação dos Efeitos da Seca — CCD.
5. Criar instrumentos de apoio ao desenvolvimento de atividades produtivas
compatíveis com a preservação, conservação e manejo sustentável dos recursos
naturais.
6. Interagir com os órgãos de assistência técnica e extensão rural, contribuindo
para a capacitação dos técnicos, com o objetivo de atuar em sistemas agrícolas
enfocados na agricultura familiar e nos princípios da agroecologia, no manejo e
conservação de solos, para recuperar os que apresentem problemas de salinização
e preservação ambiental, e nas ações necessárias ao combate à desertificação.
7. Formular e implementar Planos de Desenvolvimento Territorial
Agroextrativistas, voltados para a exploração econômica sustentável da caatinga
e do cerrado, oferecendo alternativas econômicas à população assentada, de forma
a reduzir a pressão sobre os ambientes naturais e combater a desertificação.
8. Ampliar as ações envolvendo a captação e o uso da água de chuva em cisternas,
barragens sucessivas e barragens subterrâneas, entre outras tecnologias, para o
abastecimento doméstico familiar, a exemplo do Programa Um Milhão de Cisternas,
orientado para a dessedentação de animais e para a produção local de alimentos.
9. Buscar a ampliação de oferta de crédito viável para a implantação e melhoria
da infra-estrutura produtiva e de equipamentos (individuais e coletivos) que
facilitem o beneficiamento da produção.
10. Estimular a constituição de agroindústrias artesanais e familiares,
inclusive de pescado, por meio do crédito.
11. Implementar programas voltados para a educação e formação continuada para
capacitação de acampados, assentados, índios, comunidades quilombolas e
agricultores familiares, visando ao desenvolvimento de uma prática agrícola
ambientalmente sustentável em um contexto de economia solidária, com incentivo
ao associativismo, ao cooperativismo, à agricultura orgânica e à gestão de
projetos coletivos.
12. Apoiar o processo de desenvolvimento de produtos agroindustriais com base em
alimentos culturalmente adaptados ao semi-árido e a sua comercialização.
Não dá mais para repetir as antigas políticas que muito consumiram o dinheiro
público e não trouxeram resultados, a região continua muito pobre, e as
diferenças cada vez maiores.
Portanto, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, todos aqueles nordestinos que
estão mobilizados por esta campanha por um novo DNOCS, estamos lançando uma
grande mobilização de Parlamentares. O Deputado Fernando Ferro e muitos outros
desta Casa já se manifestaram favoráveis a essa mobilização para se repensar um
novo papel para o DNOCS, para se repensar o Nordeste e o semi-árido e se
construírem políticas públicas apropriadas e centradas no desenvolvimento local
e sustentável.
A campanha está lançada. Esperamos que o Governo Federal, os Governos Estaduais
e Municipais e, principalmente, a sociedade nordestina se integrem nessa nova
visão e nessa nova campanha pelo novo DNOCS.
Muito obrigado, Presidente.