Tratados e regimes com reflexos para a Defesa
A política externa representa a manifestação dos interesses de um país perante seus pares no plano internacional, imerso em um sistema anárquico por natureza, onde os atores e instituições governamentais e não governamentais buscam maximizar seus próprios objetivos.
Nesse jogo de poder, as ações de cada governo são delineadas por um debate interno entre as diversas burocracias e organizações que tentam sustentar suas aspirações na formulação e projeção das políticas no cenário mundial por meio da figura do Estado, este condicionado a um conjunto de regras e normas que moldam a dinâmica das relações internacionais.
Desde sua primeira Constituição Republicana, de 1891, o país veda a possibilidade de guerra de conquista. Assim como, desde a brilhante participação de Ruy Barbosa na Conferência de Paz de Haia, em 1907, os brasileiros preconizam a igualdade jurídica entre os Estados, recusando toda sorte de tratados e de acordos discriminatórios.
Nesse cenário, o Brasil busca construir seu protagonismo junto aos fóruns multilaterais, como a Organização da Nações Unidas (ONU), amparado em princípios tais quais a busca da resolução pacífica de controvérsias e participação em acordos e tratados que visam a não proliferação de armas de destruição em massa, atestando, pois, sua tradicional vocação pacífica e o firme compromisso com as normas do Direito Internacional.
Entretanto, o multilateralismo e a distribuição de poder no sistema internacional exigem sinergia entre as políticas externa e de defesa, uma vez que esta oferece àquela o suporte imprescindível para a atuação diplomática em um ambiente de natureza essencialmente assimétrica.
Tem-se, de um lado, a política externa ancorada na cultura e tradições do País, aderindo aos acordos e tratados internacionais que visam à paz entre os povos e limitam o desenvolvimento de armas de destruição em massa. Do outro, a necessidade da procura por novas tecnologias que impulsionem o desenvolvimento brasileiro, da sua indústria, e projete-o, trazendo benefícios de emprego dual (civil e militar) para a sociedade.
Isso porque ao País interessa o conhecimento estratégico que impulsione o desenvolvimento econômico e traga uma maior autonomia relativa e capacidade de projeção externa, consolidando-se como energia cinética de relevância nas engrenagens internacionais.
Nessa esteira, como signatário de Tratados e de Convenções relacionados aos trabalhos desenvolvidos pela Conferência do Desarmamento (CD) da ONU, sediada em Genebra, o Governo brasileiro participa de negociações internacionais a fim de resguardar os nossos interesses em temas sensíveis e que impactam diretamente na Segurança, Defesa e Desenvolvimento da nação.
Com atuação ativa nas negociações de temas como o desarmamento, a não proliferação e o controle de armas, o Brasil aposta nos processos transparentes e multilaterais de verificação de arsenais, propiciando um ambiente de confiança mútua entre os Estados soberanos.
Para isso, trabalha intensamente pelo fortalecimento das atividades ligadas ao desarmamento por meio da Representação Especial do Brasil junto à Conferência do Desarmamento (REBRASDESARM), em um esforço coordenado entre as duas principais burocracias da diplomacia de defesa, com a atuação de representantes do Ministério das Relações Exteriores, assessorados por membros do Ministério da Defesa.
A CD foi reconhecida pela Décima Sessão Especial sobre Desarmamento da Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 1978, como o único fórum multilateral de negociação de desarmamento da comunidade internacional. É composta por 65 membros permanentes e suas regras de procedimento estabelecem o consenso em todas as suas decisões, a fim de garantir apoio integral aos acordos negociados.
Atualmente, o Brasil é signatário da Convenção sobre Proibições ou Restrições ao Emprego de Certas Armas Convencionais (CCAC), da Convenção para a Proibição de Armas Biológicas e Toxínicas e sua Destruição (CPAB), da Convenção para a Proibição de Armas Químicas e sua Destruição (CPAQ), da Convenção sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção e Transferência de Minas Antipessoais e sobre a sua Destruição (Convenção de OTTAWA), do Tratado sobre Comércio de Armas (ATT, do inglês Arms Trade Treaty), do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP), do Tratado de Proibição de Armas Nucleares (TPAN), do Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares (CTBT, do inglês Comprehensive Nuclear-Test-Ban Treaty), do Tratado para a Proscrição de Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (Tlatelolco) e do Tratado sobre os princípios que regem as atividades dos Estados na exploração e uso do espaço sideral, incluindo a lua e outros corpos celestes (Tratado do Espaço Sideral).
Convenção sobre Proibições ou Restrições ao Emprego de Certas Armas Convencionais
A Convenção sobre Proibições ou Restrições ao Emprego de Certas Armas Convencionais que Podem ser Consideradas como Excessivamente Lesivas ou Geradoras de Efeitos Indiscriminados (CCAC), genericamente conhecida como Convenção de Certas Armas Convencionais, foi concluída na ONU, em Genebra, em 10 de outubro 1980, e entrou em vigor em 2 de dezembro de 1983.
Ela suplementa as Convenções de Genebra, de 1949, e é reconhecida como um dos principais instrumentos do Direito Internacional Humanitário (DIH).
A CCAC tem como objetivo limitar o uso de armas que causem sofrimento excessivo ou supérfluo aos combatentes, ou que, por sua natureza, causem danos indiscriminados à população civil ou aos seus bens.
A Convenção foi concebida, desde o início, como uma "Convenção-Quadro", a ser complementada por protocolos, de forma a permitir maior flexibilidade e possibilitar eventuais expansões futuras. No seu texto, possui apenas dispositivos declaratórios, de caráter geral. Os elementos legais substantivos e específicos estão contidos em seus protocolos.
Cada protocolo regulamenta ou proíbe o uso de um determinado tipo de arma convencional. No momento de sua adoção, em 1980, a CCAC dispunha de três Protocolos. A eles se somaram, posteriormente, o Protocolo IV (adotado em 1995) e o Protocolo V (adotado em 2003).
• o Protocolo I (sobre fragmentos não-detectáveis) proíbe o uso de armas cujo efeito primário seja o de produzir ferimentos por meio de fragmentos que, no corpo humano, não possam ser detectados por meio de radiografias.
• O Protocolo II (sobre proibições e restrições ao uso de minas, armadilhas e outros dispositivos) estabelece diversas restrições ao uso de minas terrestres e armadilhas (booby-traps), mas não chega a proibi-las. O Protocolo II foi revisado em 1996, de forma a fortalecer as restrições ao uso de tais armas; entretanto, em 1997, uma Convenção adotada fora do marco das Nações Unidas proibiu completamente o uso, o armazenamento, a produção e a transferência de minas terrestres antipessoal (Convenção de Minas Antipessoais ou Convenção de Ottawa).
• O Protocolo III (sobre armas incendiárias) proíbe o uso de armas incendiárias contra civis e seus bens. O uso de tais armas contra objetivos militares não é proibido, desde que sejam tomadas precauções para evitar danos colaterais à população civil.
• O Protocolo IV (sobre armas cegantes a laser), adotado em 1995, proíbe o uso de armas a laser projetadas para provocar cegueira permanente, total ou parcial.
• O Protocolo V (sobre restos explosivos de guerra), adotado em 2003, dispõe sobre a necessidade de remover munições abandonadas ou falhadas.
O Brasil é um dos 125 países membros da Convenção, tendo assinado seus cinco protocolos.
Convenção para a Proibição de Armas Biológicas e Toxínicas e sua Destruição
A Convenção para a Proibição de Desenvolvimento, Produção e Estoque de Armas Bacteriológicas e Tóxicas, mais conhecida como Convenção de Armas Biológicas (CPAB), estabelecida em 10 de abril de 1972, foi o primeiro tratado multilateral de desarmamento que baniu uma categoria inteira de armas.
Os Estados-Partes se comprometem a, sob nenhuma circunstância, desenvolver, produzir, guardar, adquirir ou reter agentes biológicos ou tóxicos em tipos e em quantidades que não tenham justificativas profiláticas ou outros propósitos pacíficos, nem armas ou equipamentos destinados ao emprego desses agentes com caráter hostil.
Não há negociação em curso na CPAB atualmente (em inglês, BWC - Biological Weapons Convention), mas os Estados-Partes concordam que há a necessidade de se fortalecer a Convenção. Todavia, divergem quanto à forma de fazê-lo. Ao contrário do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP) e da Convenção de Armas Químicas (CPAQ), a CPAB não dispõe de um Secretariado, de uma estrutura institucional consolidada e tampouco de um mecanismo de verificação.
A questão central é a criação de um órgão responsável pelo controle e pela verificação do cumprimento das cláusulas da Convenção, a exemplo do que ocorre com as armas químicas, mas ainda não foi possível atingir consenso internacional sobre esse assunto.
Agentes bacteriológicos são pesquisados e desenvolvidos com vistas à produção de vacinas e ao desenvolvimento de medicamentos, a fim de proporcionar melhores condições de vida ou de ampliar o rendimento na produção agropecuária. Controlar essas pesquisas, além de ser difícil sob o enfoque da implementação de eventuais medidas eficazes, pode prejudicar esse processo de aprimoramento tecnológico, seja por meio da restrição nas pesquisas ou por meio do controle excessivo na aquisição de agentes.
Os países que apoiam a criação de um mecanismo de verificação ressaltam que ele fiscalizaria o cumprimento da Convenção e que contribuiria para o seu fortalecimento. Por outro lado, os Estados-Partes contrários ponderam que o melhor caminho seria melhorar o processo já existente, adotando-se Medidas de Construção da Confiança (CBM - Confidence Building Measures, na sigla em inglês), por meio das quais os países informam suas ações, compartilham as informações relevantes e contribuem assim para a redução da desconfiança mútua.
Atualmente, há 183 Estados-Parte na CPAB.
Convenção para a Proibição de Armas Químicas e sua Destruição
A Convenção para a Proibição do Desenvolvimento, Produção, Estocagem e Uso de Armas Químicas e sobre a Destruição das Armas Químicas Existentes no Mundo, comumente conhecida como Convenção de Armas Químicas, tem por objetivo o banimento completo dessa categoria de armas.
A 1ª Guerra Mundial (1914-1918) marcou a entrada das armas químicas nos conflitos, sendo que, em 1925, a Liga das Nações, precursora da ONU, proibiu, com o Protocolo de Genebra, o uso militar de gases asfixiantes e tóxicos, entre outros. Todavia, tal restrição não contemplou a produção e a estocagem. A discussão sobre a proibição completa das armas químicas foi retomada somente em 1968.
Em 1992, a Conferência do Desarmamento submeteu à Assembleia-Geral das Nações Unidas o texto da Convenção de Armas Químicas, aprovado no mesmo ano. O documento, aberto para assinaturas em 1993, entrou em vigor em 29 de abril de 1997, ampliando a cobertura do Protocolo de Genebra para armas químicas e incluindo extensas medidas de verificação. O acordo possui, também, mecanismos para a inspeção de locais de produção de material químico e de instalações militares, bem como para investigações de alegações de uso e de produção de armas químicas.
A Organização para a Proibição de Armas Químicas (OPAQ) é o organismo independente responsável pela implementação da Convenção, com sede em Haia, nos Países Baixos. Em maio de 2015, a OPAQ celebrou a destruição de 90% do estoque mundial declarado de armas químicas.
O tema está intrinsecamente ligado às pesquisas e ao desenvolvimento da área farmacêutica e da indústria de fertilizantes. Por essa razão, percebe-se a preocupação internacional, especialmente nos países em desenvolvimento, de que os controles vinculados ao desarmamento químico não venham a gerar obstáculos adicionais para o progresso técnico e científico nessas áreas.
Atualmente, há 193 Estados-Parte na CPAQ.
Convenção sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção e Transferência de Minas Antipessoais e sobre a sua Destruição (CONVENÇÃO DE OTAWA)
A Convenção sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção e Transferência de Minas Antipessoal e sobre a sua Destruição, também conhecida como Convenção de Ottawa, proíbe o uso, a produção, a estocagem e a transferência de minas terrestres antipessoais.
Como parte da resposta internacional ao sofrimento generalizado causado pelas minas antipessoal, a Convenção está baseada em regras consuetudinárias do Direito Internacional Humanitário (DIH) aplicáveis a todos os Estados, proibindo o uso de armas que, pela sua natureza, não discriminem civis de combatentes, ou causem sofrimentos desnecessários ou ferimentos supérfluos.
O Protocolo II Emendado da CCAC (minas, armadilhas e outros artefatos), negociado em 1996, não proibiu integralmente as minas antipessoal, o que causou frustração e contribuiu para as negociações fora do âmbito da CCAC.
Decepcionados com o resultado da conferência de revisão da CCAC, os países que buscavam a completa extinção das minas terrestres, em conjunto com a sociedade civil, iniciaram o movimento que resultou na adoção da Convenção de Ottawa, em 1997, que baniu completamente as minas antipessoal.
A Convenção foi aberta para assinaturas em 1997 e entrou em vigor em 1º de março de 1999. Atualmente, suas principais linhas de trabalho são a universalização do acordo, a destruição dos estoques existentes de minas antipessoal, a limpeza dos campos minados remanescentes, a assistência às vítimas e a promoção da cooperação internacional na sua implementação.
Em 2015, 157 países membros informaram que não possuem mais estoques de minas antipessoal. A Convenção conta com 164 Estados Partes.
Tratado sobre Comércio de Armas
As Nações Unidas observaram uma importante lacuna no gerenciamento das negociações de armamentos e munições, passando a incentivar a celebração de um tratado que regulasse o comércio de armas em âmbito mundial.
Assim, uma aspiração antiga da comunidade internacional, com registros de iniciativas desde o final do século XIX, na Conferência de Haia, angariou o apoio da comunidade internacional e culminou na celebração do Tratado sobre Comércio de Armas em 2 de abril de 2013 (ATT – Arms Trade Treaty, na sigla em inglês).
Os objetivos do Tratado são estabelecer padrões internacionais para a regulação do comércio internacional de armas, bem como prevenir e erradicar o comércio ilícito, além de impedir o seu desvio.
Com isso, busca-se contribuir para a paz regional e internacional, reduzindo-se o sofrimento humano e promovendo-se a cooperação, a transparência e a ação responsável dos Estados no que se refere ao comércio de armas.
O tratado tem 130 países signatários e definiu a cidade de Genebra como sede do seu Secretariado. Cada Estado-Parte deve enviar relatórios anuais com o objetivo de tornar mais transparente e facilitar a rastreabilidade do comércio de munições, de carros de combate, de veículos armados, de sistemas de artilharia de grande calibre, de aviões, de navios de guerra, de helicópteros de ataque, de sistemas de mísseis, incluindo-se lançadores, assim como armas e munições.
Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares
Para o Brasil, a segurança, a paz e o desenvolvimento são dimensões indissociáveis da questão da não proliferação de armas de destruição em massa.
O país aderiu ao Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP) em 1998, vinculando sua participação ao entendimento de que serão tomadas medidas efetivas visando à cessação, em data próxima, da corrida armamentista nuclear, com a completa eliminação de todas as armas atômicas.
O TNP é considerado um marco internacional para a prevenção da proliferação de armas e de tecnologias nucleares, para a promoção da cooperação no uso pacífico de energia atômica e para a busca do desarmamento nuclear no contexto geral do desarmamento mundial. Em 1995, os Estados-Partes decidiram estendê-lo indefinidamente.
Com 191 países-membros, incluindo-se os cinco países nuclearmente armados originais (EUA, Rússia, Reino Unido, França e China), o TNP é o acordo com maior número de ratificações no campo do desarmamento. Conferências de revisão são realizadas a cada cinco anos, com a finalidade de avaliar o progresso da implementação do Tratado.
Desde a sua implementação, houve avanços no pilar da não proliferação, mas muito pouco ou quase nada foi feito em relação ao desarmamento nuclear já existente.
O Brasil possui credenciais consolidadas na área de não proliferação. A Constituição Federal veda a utilização da energia nuclear para fins não pacíficos.
O arranjo constituído em torno da Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais Nucleares (ABACC) é sem precedentes e submete o Programa Nuclear Brasileiro a duas organizações internacionais, que desempenham as atividades de controle, de contabilidade e de aplicação de salvaguardas de maneira independente.
Tratado de Proibição de Armas Nucleares
O Tratado de Proibição de Armas Nucleares (TPAN) é o primeiro acordo internacional legalmente vinculante a proibir exaustivamente as armas nucleares, com o objetivo de levar à sua eliminação total.
Aprovado em 7 de julho de 2017, foi o resultado de um processo iniciado em 2013 com as Conferências sobre os Impactos Humanitários das Armas Nucleares, das quais o Brasil participou ativamente desde seu início. Após o depósito do 50º instrumento de ratificação em 24 de outubro de 2020, o Tratado entrou em vigor em 22 de janeiro de 2021.
O TPAN inclui um conjunto abrangente de proibições de participação em quaisquer atividades com armas nucleares. Isso inclui compromissos para não desenvolver, testar, produzir, adquirir, possuir, armazenar, usar ou ameaçar usar armas nucleares. O Tratado também proíbe a implantação de armas nucleares no território nacional e a prestação de assistência a qualquer Estado na realização de atividades proibidas. Os Estados-Partes serão obrigados a prevenir e suprimir qualquer atividade proibida pelo TPAN realizada por pessoas ou em território sob sua jurisdição ou controle. O Tratado também obriga os Estados-Partes a fornecer assistência adequada aos indivíduos afetados pelo uso ou teste de armas nucleares, bem como tomar as medidas necessárias e apropriadas de remediação ambiental em áreas sob sua jurisdição ou controle contaminadas como resultado de atividades relacionadas com o teste ou uso de armas nucleares.
Do ponto de vista jurídico, o TPAN preenche lacuna até então existente no Direito Internacional, pela qual as armas nucleares, sendo as de maior potencial letal e destrutivo entre todas as armas de destruição em massa, eram as únicas que não contavam com um instrumento legal explicitamente proibitivo.
Com o crescimento do número de assinaturas até a implementação total do disposto no Tratado, haverá a possibilidade de um impulso nos esforços em prol do desarmamento nuclear, rompendo paralisia de mais duas décadas depois da adoção, em 1996, do Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (CTBT).
Nesse contexto, o engajamento do Brasil na busca por um mundo livre de armas nucleares traduz, no plano internacional, o compromisso constitucional com o uso pacífico da atividade nuclear e com a prevalência dos direitos humanos e do direito internacional humanitário nas relações internacionais.
Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares
O Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares (CTBT - Comprehensive Nuclear-Test-Ban Treaty, na sigla em inglês) foi aberto para assinaturas em 1996, na sede da ONU, em Nova Iorque, após ter sido negociado na Conferência do Desarmamento (CD). Segundo o seu texto, cada Estado Parte “compromete-se a não realizar nenhuma explosão experimental de armas nucleares ou qualquer outra explosão nuclear e a proibir e impedir qualquer explosão nuclear em qualquer lugar sob sua jurisdição ou controle”.
Os defensores do controle das armas defendiam, desde a década de 50, a adoção de um tratado que banisse todas as explosões nucleares. Em 1963, o Tratado Parcial para a Proibição de Testes Nucleares (PTBT – Partial Nuclear-Test-Ban Treaty, na sigla em inglês) obteve sucesso limitado, ao banir os testes na atmosfera, no meio subaquático e no espaço.
O CTBT é apontado por muitos analistas como um instrumento que não repetiu o viés discriminatório do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP), pois suas proposições são idênticas para todos os países membros. Por essa razão, é reconhecido como um dos pilares fundamentais da estrutura multilateral do desarmamento e da não proliferação nuclear.
Para entrar em vigor, o Tratado exige a ratificação dos 44 países listados que, em 1996, possuíam condições tecnológicas de desenvolver programas nucleares com fins militares. Desses, China, Egito, Estados Unidos, Irã e Israel ainda não o ratificaram. Não há perspectiva de entrada em vigor do CTBT.
Atualmente, possui 185 países signatários. A Índia, o Paquistão e a República Democrática da Coreia do Norte sequer o assinaram.
Tratado para a Proscrição de Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (Tlatelolco)
O Tratado para a Proscrição de Armas Nucleares na América Latina e no Caribe, também conhecido como Tratado de Tlatelolco, foi aberto para assinaturas em 14 de fevereiro de 1967. Reconhecido como modelo para novas iniciativas de Zonas Livres de Armas Nucleares (ZLAN), foi assinado e ratificado por todas as 33 nações da América Latina e do Caribe.
A “Crise dos Mísseis” em Cuba, envolvendo os Estados Unidos e a União Soviética em 1962, motivou os países latino-americanos a analisarem a segurança internacional, em oposição aos conflitos bélicos das grandes potências na região. Além disso, despertou-os para a necessidade de dominar a tecnologia nuclear para fins pacíficos e aplicá-la para fomentar o seu desenvolvimento econômico.
De acordo com o texto, os Estados concordam em proibir e prevenir teste, uso, manufatura, produção ou aquisição por qualquer modo, de quaisquer armas nucleares, além de receber, guardar, instalar, movimentar ou possuir qualquer arma atômica. Os países membros asseguram o uso de instalações e materiais para fins pacíficos.
Há dois protocolos adicionais ao acordo que estabelecem a proteção plena da zona de aplicação do tratado, mediante garantias de segurança negativas. O Protocolo I submete todos os países de fora da América Latina, mas com territórios na região (Estados Unidos, Reino Unido, França e Países Baixos), aos termos do tratado, enquanto o Protocolo II requer que os Estados que declarem possuir armas nucleares não violem o status de região livre de armas nucleares.
Assinado e ratificado por Estados Unidos, Reino Unido, França, China e Rússia, é ainda hoje a única ZLAN reconhecida e ratificada pelos cinco países nucleares originais, embora contenha ressalvas nos seus compromissos. No que tange à não proliferação, é importante ressaltar que a região da América Latina e Caribe foi pioneira em limitar a corrida armamentista nuclear, tendo celebrado o primeiro tratado em região densamente povoada.
O Organismo para a Proscrição das Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (OPANAL), com sede no México, é o órgão intergovernamental regulador do Tratado de Tlatelolco.
Tratado sobre os Princípios que Regem as Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Sideral, Incluindo a Lua e Outros Corpos Celestes (Tratado do Espaço Sideral)
Com o agravamento da Guerra Fria nos anos 60, o espaço exterior passou a receber atenção da comunidade internacional, preocupada em evitar o surgimento de uma nova arena da competição militar.
Havia o crescente emprego de satélites com finalidades militares, tais como comunicações, navegação, inteligência, alerta de ataques de mísseis balísticos, meteorologia e verificação de acordos de controle de armas. A utilidade militar dos satélites os tornou alvos militares e contribuiu para o desenvolvimento de armas antissatelitais.
O Tratado sobre os Princípios que Regem as Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Sideral, Incluindo a Lua e Outros Corpos Celestes, também conhecido como Tratado do Espaço Sideral, é considerado a base da lei espacial internacional e primeiro instrumento ligado ao desarmamento no espaço, tendo sido aberto para assinaturas em janeiro de 1967, com entrada em vigor em 10 de outubro do mesmo ano.
Ele proíbe a colocação em órbita de qualquer arma nuclear ou outras armas de destruição em massa, bem como sua instalação em corpos celestes, e veda, também, o estabelecimento de bases militares, instalações e fortificações, teste de qualquer tipo de arma e condução de manobras militares. No entanto, emprego de pessoal militar para pesquisas científicas ou outro fim pacífico é autorizado.
Após 1967, foram realizadas diversas iniciativas e discussões para que a proibição se estendesse a todos os tipos de armas. No entanto, nenhum documento formal foi apresentado para negociação. Em 1975, foi adotada a Convenção para o Registro de Objetos Lançados no Espaço Exterior, segundo a qual todo objeto lançado na órbita terrestre ou além deveria ser registrado no âmbito nacional. Os dados completos do lançamento deveriam, também, ser informados ao depositário da convenção, o Secretário-Geral da ONU.
Em 1981, a União Soviética trouxe o tema para a Assembleia-Geral da ONU, que o encaminhou para a Conferência do Desarmamento (CD) em duas resoluções: a primeira seria um acordo efetivo e verificável para a proibição de sistemas antissatélites; e a segunda seria a proibição de colocação de qualquer tipo de arma no espaço. Como consequência, o tema PAROS - Prevention of an Arms Race in Outer Space (Prevenção de uma Corrida Armamentista no Espaço Exterior) - foi incluído na agenda da CD a partir de 1982, com o objetivo de promover transparência e previsibilidade nas atividades militares no espaço exterior, como medidas de confiança mútua entre os países.
Em 1985, a CD estabeleceu um comitê Ad Hoc para examinar o assunto e, por intermédio de considerações gerais e substantivas, prevenir uma corrida armamentista no espaço exterior. Durante o período em que o comitê esteve ativo, foram enfatizadas as medidas de construção da confiança.
Em 2000, a China propôs a negociação de um novo instrumento legal no âmbito da CD, tratando da prevenção da militarização do espaço exterior, por considerar que o existente não era suficiente. O acordo visualizado proibiria teste, colocação e uso de armas, sistemas ou componentes no espaço exterior, sem afetar o seu uso para fins pacíficos. A Rússia apoiou a iniciativa chinesa e ambos os países produziram, em 2002, um documento de trabalho para a CD, com elementos para um tratado, incluindo a proibição de colocação em órbita de objetos que carregassem qualquer tipo de arma e a instalação de armas em corpos celestes.
À exceção das iniciativas russo-chinesas, que apresentaram uma versão atualizada da proposta de acordo em 2015, verifica-se reduzida participação de outros países sobre o tema. Os Estados Unidos frequentemente apresentam críticas às propostas existentes, por considerarem que um tratado a respeito desse tema dificilmente poderia ser verificável.
Atualmente, o Tratado do Espaço Sideral conta com 111 Estados Partes.