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Colegiado também condena empresa de auditoria por falhas no planejamento e na execução dos trabalhos
CVM pune conselheiros e controlador por aumento de capital irregular
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) julgou, em 15/12/2015, os seguintes acusados:
1. Clarion S.A. Agroindustrial: Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2011/11073
2. Nardon, Nasi – Auditores Independentes S/S: Processo Administrativo Sancionador CVM nº 2010/3695
CONHEÇA OS CASOS E OS RESULTADOS:
1. O Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2011/11073 foi instaurado pela Superintendência de Relações com Empresas (SEP) para investigar a ocorrência de possíveis irregularidades em quatro eventos relacionados à Clarion S.A. Agroindustrial:
(i) aumento de capital da Companhia realizado em 30/12/2008;
(ii) celebração de contrato de mútuo com sua acionista controladora, Manacá S.A. Armazéns Gerais e Administração em 27/7/2006;
(iii) arrendamento de unidade industrial; e
(iv) aumento de capital da Companhia realizado em 28/6/2010.
FATOS E ACUSAÇÃO
Em relação ao primeiro item (aumento de capital), a SEP apurou que, em reunião de conselho de administração de 30/12/2008, José Roberto Amorielo, José Martins Pereira e Oriel Campos Leite (todos conselheiros da Clarion) deliberaram a compra de ativos da Manacá (controladora da Clarion) e de outra sociedade também controlada pela Manacá.
Os respectivos contratos previam que os preços dos ativos seriam objeto de contrato de mútuo, cujo crédito foi utilizado pela Manacá para, no curso da mesma reunião, integralizar o aumento de capital da Clarion.
Para a SEP, os conselheiros não observaram o procedimento previsto para a integralização de ações em bens, em infração ao art. 170, § 3º, da Lei nº 6.404/76. Os acionistas da Manacá Reno Ferrari e Reno Ferrari Filho, por sua vez, tidos como controladores indiretos da Clarion, foram acusados de descumprimento do art. 116, parágrafo único, da mesma Lei.
Ainda em relação à mesma reunião, a área técnica também verificou que a justificativa conferida pelos administradores para a escolha do critério de precificação das novas ações não foi devidamente pormenorizada. Por isso, acusou os conselheiros de infração ao art. 170, § 7º, da referida Lei.
Quanto ao contrato de mútuo celebrado entre a Clarion e a Manacá em 27/7/2006, a SEP averiguou que a Manacá, sempre que possuísse capital disponível, deveria depositar, diariamente e a seu critério, determinada quantia em conta corrente compartilhada com a Clarion. A Companhia, por sua vez, poderia sacar a conta segundo sua necessidade.
Em contrapartida à disponibilização dos recursos, a Clarion deveria pagar à Manacá 1,8% dos saldos diários da conta corrente. Caso o saldo fosse devedor, caberia à Manacá pagar juros na mesma importância.
Para a acusação, o contrato sujeitou a Companhia ao arbítrio da Manacá, uma vez que esta fazia jus à rentabilidade de 1,8% ao mês sobre o valor que quisesse depositar na conta conjunta. Além disso, a área técnica considerou a referida rentabilidade baixa se comparada com o custo de capital de terceiro indicado em laudo de avaliação referente a compra de imóvel efetuada pela Clarion.
Por essas razões, os diretores da Clarion, Alexandre Bride, José Martins Pereira e Paulo César de Moura Bueno, foram acusados de infração ao disposto no art. 245 da Lei 6.404/76, uma vez que o contrato de mútuo em tela não teria se dado em condições comutativas. Os controladores Reno Ferrari e Reno Ferrari Filho, ao seu turno, foram acusados de violação ao art. 117, § 1º, alínea ‘f’, da mesma Lei.
No que se refere ao terceiro evento apurado pela SEP, a Clarion arrendou unidade industrial (adquirida da Manacá) a uma sociedade limitada (a P.A.C.), mediante remuneração de R$ 300.000,00 por mês. Para a acusação, as condições pelas quais o contrato de arrendamento foi assinado não foram favoráveis à Clarion, razão pela qual imputou aos diretores José Martins Pereira, Alexandre Bride e Paulo César de Moura Bueno infração aos arts. 153 e 154 da Lei 6.404/76.
Por serem parentes de um dos sócios da P.A.C. e beneficiários da operação de aquisição e subsequente arrendamento da unidade industrial, os controladores Reno Ferrari e Reno Ferrari Filho foram acusados de violação ao parágrafo único do art. 116 da Lei.
Em relação ao aumento de capital ocorrido em 28/6/2010, a SEP apurou que os conselheiros José Roberto Amorielo, Reno Ferrari e Regina Martin Ferrari deixaram de justificar pormenorizadamente a escolha dos critérios de precificação das ações então emitidas, em infração ao disposto no art. 170, § 7º, da Lei 6.404/76.
Por fim, Alexandre Bride, na qualidade de diretor de relações com investidores (DRI) da Clarion à época dos fatos, foi acusado por não ter divulgado as informações relativas aos contratos de mútuo celebrados em 27/7/2006 e 30/12/2008 no Formulário de Referência da Companhia de 2011, mais especificamente a versão 3.0 (em infração ao art. 13, combinado com o art. 45, da Instrução CVM 480).
VOTO
Sobre o aumento de capital realizado em 30/12/2008, o Diretor Relator do caso, Pablo Renteria considerou a celebração dos contratos de compra e venda e de mútuo como um artifício para concretizar a realização do aumento com bens, entendendo, dessa forma, que os acusados agiram em fraude à lei.
Segundo o Diretor, o conselho de administração da Companhia, ao deliberar, na mesma reunião, a celebração de contratos aparentemente regulares com a Manacá, e a realização de aumento de capital, também aparentemente regular, visava a atingir finalidade contrária à lei, incorporando ativos de Manacá ao capital social da Companhia sem a observância do procedimento e das salvaguardas estabelecidas no art. 170, § 3º, da Lei 6.404/76.
Diante disso, o Diretor votou pela condenação de José Roberto Amorielo, José Martins Pereira e Oriel Campos Leite ao pagamento de multa individual no valor de R$ 500.000,00. Reno Ferrari Filho, na qualidade de acionista controlador, também foi punido, tendo em vista que foi o principal beneficiário da operação fraudulenta. Dessa forma, o acusado foi condenado ao pagamento de multa no valor de R$ 157.817.125,00, correspondente a 25% do valor da operação irregular.
A respeito de Reno Ferrari, o Diretor Relator entendeu que o acusado não exercia o poder de controle da Clarion, razão pela qual votou por sua absolvição das imputações que lhe foram formuladas na qualidade de acionista controlador.
Em relação à justificativa do critério escolhido para a fixação do preço de emissão das ações, o Diretor Relator entendeu que o texto constante da ata da reunião do conselho de administração não é suficiente para suprir o exigido pelo art. 170, § 7º, da Lei 6.404/76. Segundo o Relator, a leitura do documento não permite depreender por qual motivo os acusados escolheram o critério da cotação das ações em Bolsa em vez dos demais previstos no § 1º do art. 170. Por essa irregularidade, o Diretor votou pela aplicação de pena de advertência aos conselheiros.
Com relação ao contrato de mútuo datado de 27/7/2006, celebrado entre Clarion e Manacá, o Diretor Pablo ressaltou não haver provas que demonstrem que o empréstimo foi firmado em condições não equitativas. Nesse sentido, o Diretor apontou que não se verificou se os recursos disponibilizados pela Manacá foram ou não apropriados pela Companhia ou se a quantia disponibilizada era maior do que a Clarion realmente necessitava.
Assim, para Pablo Renteria, não restou configurada infração ao art. 245 da Lei 6.404/76, motivo pelo qual votou pela absolvição de Alexandre Bride, José Martins Pereira e Paulo César de Moura Bueno. Pelas mesmas razões, Reno Ferrari e Reno Ferrari Filho também foram absolvidos da acusação de infração ao art. 117, § 1º, alínea ‘f’, da mesma Lei.
Quanto ao arrendamento da unidade industrial, o voto esclareceu que, para a SEP, os diretores não agiram com diligência e no interesse da companhia porque:
(i) as condições financeiras da Clarion não eram apropriadas para a aquisição da unidade industrial; e
(ii) o seu posterior arrendamento se deu em condições prejudiciais.
Para Pablo Renteria, deveria prevalecer a business judgment rule, segundo a qual o administrador não deve ser responsabilizado em razão da decisão tomada de forma diligente, de boa-fé e no interesse da companhia. Nesse sentido, o Diretor ponderou que, em casos como esse, a análise do julgador deve se ater ao processo decisório observado pelos administradores, e não ao mérito da decisão tomada.
O Diretor votou, então, pela absolvição dos diretores José Martins Pereira, Alexandre Bride e Paulo César de Moura Bueno da acusação de infração aos arts. 153 e 154 da Lei 6.404/76.
Nesse ponto, Pablo entendeu, ainda, que a participação de Reno Ferrari e Reno Ferrari Filho no ilícito não foi suficientemente demonstrada pela SEP e, por isso, foram absolvidos da imputação de violação ao art. 116, parágrafo único, da mesma Lei.
No que se refere ao aumento de capital deliberado em 28/6/2010, Pablo concluiu que a escolha do critério de precificação das novas ações não foi pormenorizadamente justificada pelos conselheiros presentes à reunião. De acordo com o Diretor Relator, os administradores apenas descreveram o critério escolhido, mas não o justificaram, não havendo como se depreender as razões pelas quais decidiram pelo critério então escolhido. Portanto, o Diretor Relator votou pela condenação de Reno Ferrari e Regina Martin Ferrari à pena de advertência.
Tendo em vista que José Roberto Amorielo também participou da aprovação do aumento de capital de 30/12/2008, em que lhe foi aplicada pena de advertência pela mesma infração, Pablo Renteria concluiu que não faria sentido atribuir-lhe nova advertência. Por isso, votou pela condenação desse acusado ao pagamento de multa no valor de R$ 25.000,00.
Por fim, quanto à acusação de descumprimento do art. 13, combinado com o art. 45 da Instrução CVM 480 por parte de Alexandre Bride, o Diretor constatou que não constava no Formulário de Referência da Clarion qualquer informação a respeito dos contratos de mútuo celebrados com partes relacionadas. Dessa maneira, entendeu configurada violação a referidos dispositivos.
Contudo, para a dosimetria da pena, Pablo levou em consideração o fato de que Alexandre Bride retificou o Formulário de Referência da Clarion, para acrescentar as devidas informações, logo após a SEP ter enviado ofício acerca da irregularidade. Assim, votou pela aplicação de pena de advertência ao acusado.
Diante do exposto acima, o Colegiado da CVM acompanhou, por unanimidade, o voto do Diretor Relator Pablo Renteria.
Os acusados punidos poderão apresentar recurso com efeito suspensivo ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional e a CVM interporá recurso de ofício, ao mesmo conselho, das decisões absolutórias.
2. O Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2010/3695 foi instaurado pela Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria (SNC), em face da Nardon, Nasi – Auditores Independentes S/S e de seu responsável técnico Arthur Nardon Filho, por:
• não terem observado normas do Conselho Federal Contabilidade (CFC) nos trabalhos de auditoria independente realizados na AVIPAL S/A Avicultura e Agropecuária, relativos ao exercício de 2004 (infração ao disposto no art. 20 da Instrução CVM 308); e
• não terem elaborado o relatório circunstanciado sobre os controles internos da companhia auditada (infração ao disposto no art. 25, inciso II, da Instrução CVM 308).
FATOS
Ao analisar as demonstrações financeiras da Avipal de 31/12/2004, a SNC verificou que a administração da Companhia republicou referidas demonstrações com alterações relevantes nos resultados (prejuízo de R$ 163,8 milhões ao invés do lucro de R$ 41,5 milhões anteriormente divulgado).
Não obstante a discrepância significativa, o novo parecer de auditoria emitido pela Nardon Nasi, em 5/8/2005 não continha ressalva, mas apenas parágrafo de ênfase, atribuindo os ajustes realizados à adoção do princípio da prudência e a decisão da administração da Companhia baseada em critérios políticos e administrativos.
Questionada pela SNC, a Nardon Nasi disse ter planejado e executado os trabalhos de auditoria na Avipal observando de forma rigorosa as normas previstas pelo CFC e pela CVM. Afirmou, também, que a republicação espontânea das demonstrações somente poderia ser explicada pela iniciativa da alta direção da Companhia de adotar o princípio da prudência em seu grau máximo.
A SNC solicitou, então, à Superintendência de Fiscalização Externa (SFI) da Autarquia a realização de inspeção na Nardon Nasi, com o fim de examinar os papéis de trabalho produzidos nas auditorias das demonstrações financeiras da Avipal de 2003 e 2004, e nos demais documentos coligidos que suportaram a opinião sem ressalvas dos pareceres emitidos em 24/2/2005 e 5/8/2005.
ACUSAÇÃO
Após receber o relatório da inspeção, a SNC apresentou Termo de Acusação contra a Nardon, Nasi e Arthur Nardon Filho, pelo descumprimento de diversas normas do CFC durante a auditoria realizada nas demonstrações financeiras da Avipal. As irregularidades apontadas pela área técnica diziam respeito à formalização da contratação de serviços, planejamento dos trabalhos, procedimentos de auditoria, emissão de parecer com ressalva, bem como à não elaboração de relatório circunstanciado sobre os controles internos da Companhia.
Dessa forma, a empresa de auditoria e seu responsável técnico foram acusados de infração aos arts. 20 e 25, inciso II, da Instrução CVM 308, em relação aos trabalhos de auditoria realizados na Avipal, relativos aos exercícios de 2003 e 2004.
Em 27/7/2012, ocorreu o falecimento de Arthur Nardon Filho, o que fez com que o processo passasse a correr apenas contra a empresa de auditoria.
VOTO
Primeiramente, analisando a ausência de contrato de prestação de serviços entre a Nardon, Nasi e a Avipal, Pablo Renteria não aceitou a alegação da acusada de que esta formalização não seria exigida à época dos fatos. Segundo o Relator, existia resolução do CFC exigindo detalhamento, em contrato, dos serviços de auditoria a serem prestados.
Em seguida, o Relator concordou com a Acusação com relação às deficiências do planejamento de auditoria, que teria sido até mesmo inexistente em alguns pontos, no tocante a seu detalhamento e à avaliação dos riscos de auditoria e do ambiente de processamento de dados da companhia a auditada. Assim, não aceitou a alegação da defesa de que um planejamento e uma avaliação mais completos teriam sido feitos nos exercícios de 2001 e 2002 e seriam desnecessários posteriormente.
Segundo o Diretor, também ficou devidamente comprovado nos autos que as cartas de Responsabilidade da Administração, em relação às auditorias das demonstrações de 2003 e 2004, ou não foram obtidas pela acusada, ou o foram em datas diferentes dos pareceres, como exige o CFC.
Sobre os procedimentos de auditoria exigidos pelo CFC, por sua vez, Pablo Renteria entendeu que a Acusação somente conseguiu demonstrar o desatendimento pela Nardon Nasi das normas do Conselho a respeito dos procedimentos de circularização de estoques em poder de terceiros. Em relação a outros procedimentos de auditoria, incluindo de revisão analítica e sobre transações e eventos subsequentes, os elementos trazidos pelo termo de acusação não convenceram o Relator de que não teriam sido seguidos pela acusada.
Na sequência, Pablo Renteria acatou a tese acusatória de que as divergências externadas pela acusada junto à administração da Avipal, em relação ao ajuste por esta pretendido nas demonstrações financeiras de 2004, por sua natureza e relevância, deveriam estar refletidas no parecer, através de ressalva, como estabelecem as normas do CFC.
Na visão do Diretor, assim, todas as inobservâncias às normas do CFC acima relatadas configuraram, assim, infração ao art. 20 da Instrução CVM 308.
Por fim, Pablo considerou que a acusação conseguiu comprovar que a Nardon Nasi não elaborou e encaminhou à administração da Avipal o Relatório Circunstanciado sobre as demonstrações financeiras de 31/12/2004, procedimento este obrigatório, segundo o art. 25, inciso II, da Instrução CVM 308. Nesse ponto, Pablo Renteria não aceitou o argumento da defesa de que uma avaliação de controles internos mais completa teria sido feita nos exercícios de 2001 e 2002, tendo a companhia aperfeiçoado seus controles de modo a tornar desnecessária a emissão de um relatório para o exercício de 2004.
Diante do exposto acima, acompanhando o voto do Diretor Relator Pablo Renteria, o Colegiado da CVM decidiu, por unanimidade, aplicar as seguintes penalidades a Nardon, Nasi – Auditores Independentes S/S:
• Multa no valor de R$ 150.000,00: por descumprimento de normas emanadas pelo CFC, nas auditorias das demonstrações financeiras da AVIPAL S/A Avicultura e Agropecuária (infração ao disposto no art. 20 da Instrução CVM 308).
• Multa no valor de R$ 50.000,00: por não ter elaborado e encaminhado à administração da AVIPAL S/A Avicultura e Agropecuária o Relatório Circunstanciado sobre os controles internos, relativo às demonstrações financeiras de 31/12/2004 (infração ao disposto no art. 25, inciso II, da Instrução CVM 308).
A Nardon, Nasi – Auditores Independentes S/S poderá apresentar recurso com efeito suspensivo ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.